Desafio da modernidade
Pedro J. Bondaczuk
Tão logo ocorreram as vertiginosas mudanças no Leste
europeu, nas duas décadas finais di século passado, prenunciando o colapso
mundial do comunismo – pelo menos desse “capitalismo de Estado” praticado por
sete décadas – foram feitas inúmeras análises por parte de cientistas
políticos, sociólogos, jornalistas etc., em livros, artigos, ensaios,
entrevistas e vai por aí afora, Algumas foram sumamente disparatadas, pelo
menos naquele primeiro momento em que a
“poeira” ainda não havia baixado. Afinal, o mapa da Europa teve que ser
praticamente redesenhado, com os sucessivos colapsos, primeiro da União
Soviética, e, posteriormente, da Iugoslávia e Checoslováquia. Os ex-iugoslavos,
notadamente os sérvios, recorreram à luta armada para impedir a desagregação.
Em vão. Milhares de pessoas morreram inutilmente Já a separação de checos e
eslovacos se deu de maneira pacífica e consensual.
Na mesma ocasião, e também na Europa, ocorreu um movimento
oposto, ou seja, o de reunificação de dois povos da mesma etnia, origem, língua
e tradições, divididos em conseqüência da derrota do regime nazista na Segunda
Guerra Mundial. Refiro-me (e o leitor já percebeu) à unificação das duas
Alemanhas, dando origem a uma nova (em termos recentes, do pós-guerra, claro)
potência européia e global. As análises da época podem ser divididas em duas
vertentes, ambas carentes de equilíbrio e de realismo, conforme concluo relendo
tais opiniões. O tempo se encarregou de provar que as duas estavam equivocadas.
De um lado estavam os otimistas,
que acreditavam que o mundo estava no âmago de uma revolução universal, sem
armas e sem barricadas, que iria nos conduzir à construção de uma sociedade
muito melhor, mais justa, equânime e equilibrada do que a que então existia.
Entre tais analistas, incluiu-se o falecido papa João Paulo II, que acreditava
que a suposta derrocada do marxismo, aliada ao desencanto provocado pelo
consumismo ocidental caracterizada pelo “capitalismo selvagem”, levariam a
humanidade ao limiar de um renascimento da fé. Claro que não aconteceu nada
disso, Ouso dizer que o mundo está, até, mais perigoso e instável do que esteve
no auge da Guerra Fria.
No outro extremo, estavam os
pessimistas, que não viam, com a ausência deixada pela ideologia esquerdista
após seu fracasso, nenhuma perspectiva para os injustiçados, os despossuídos,
os segregados, as multidões de miseráveis e famintos da Terra. Estes apostavam
numa reversão, na vitória mundial da “ditadura do proletariado”, sonhando com
um igualitarismo que contraria a própria natureza. Afinal, nenhum ser humano é
igual ao outro. Mas este fato não pressupõe, também, nenhum domínio de um homem
sobre o outro, nenhuma exploração, por qualquer motivo ou razão. Obviamente,
também estavam errados.
Ser diferente não significa ser inferior. É isso que muita
gente não entende, ou por oportunismo (principalmente), ou por fanatismo ou,
simplesmente, por burrice mesmo. O fracasso de dois sistemas, surgidos nos
últimos 200 anos – comunismo e capitalismo – deixou, na verdade, um enorme
vazio ideológico, que poderia ser preenchido com algo novo, que corrigisse as
distorções de um e de outro, e aproveitasse as virtudes de ambos. Os
pessimistas, porém, não crêem nessa possibilidade. Nem eu. E prevêem o caos, o que
também me parece exagerado. O capitalismo ainda está aí, mas impotente para
solucionar suas próprias contradições. Creio que não tenha futuro. Não, pelo
menos, com as premissas atuais.
No meio desses dois grandes
grupos de analistas estavam os moderados, entre os quais me incluí na
oportunidade e ainda me incluo. Eram (e são) os que não costumam tirar os pés
do chão, mas que nem por isso se entregam a um frio e omisso desencanto. São os
que acreditam na potencialidade humana, mas sabem que o processo renovador tem
que começar com alguém e em algum lugar. São os que nunca perdem a “esperança”,
mas definem esse conceito de forma correta, como faz Erich Fromm, em seu livro
“Ter ou Ser?”, quando diz que ela “não é nem uma espera passiva nem um forçar
irreal de circunstâncias que não podem ocorrer. É como o tigre agachado que só
saltará quando chegar o momento de saltar”.
O que está aí, (e todos
concordam, embora muitos não admitam), precisa ser mudado, e com urgência, para
não agravar ainda mais o que já é muito grave.. Nunca funcionou, não funciona e
jamais funcionará. Mas o que construir no seu lugar? Como? Quando? Está aí
excelente desafio para homens de idéias, para pessoas que raciocinam e que não
se prendem a dogmas e nem se deixam fanatizar por ideologias nitidamente
inexeqüíveis, como, por exemplo, para escritores (por que não?)_ Que tal
arregaçar as mangas e pôr o cérebro para funcionar? Este é o grande desafio da
verdadeira modernidade!
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