Tuesday, August 06, 2013

Desafio da modernidade

Pedro J. Bondaczuk

Tão logo ocorreram as vertiginosas mudanças no Leste europeu, nas duas décadas finais di século passado, prenunciando o colapso mundial do comunismo – pelo menos desse “capitalismo de Estado” praticado por sete décadas – foram feitas inúmeras análises por parte de cientistas políticos, sociólogos, jornalistas etc., em livros, artigos, ensaios, entrevistas e vai por aí afora, Algumas foram sumamente disparatadas, pelo menos  naquele primeiro momento em que a “poeira” ainda não havia baixado. Afinal, o mapa da Europa teve que ser praticamente redesenhado, com os sucessivos colapsos, primeiro da União Soviética, e, posteriormente, da Iugoslávia e Checoslováquia. Os ex-iugoslavos, notadamente os sérvios, recorreram à luta armada para impedir a desagregação. Em vão. Milhares de pessoas morreram inutilmente Já a separação de checos e eslovacos se deu de maneira pacífica e consensual.

Na mesma ocasião, e também na Europa, ocorreu um movimento oposto, ou seja, o de reunificação de dois povos da mesma etnia, origem, língua e tradições, divididos em conseqüência da derrota do regime nazista na Segunda Guerra Mundial. Refiro-me (e o leitor já percebeu) à unificação das duas Alemanhas, dando origem a uma nova (em termos recentes, do pós-guerra, claro) potência européia e global. As análises da época podem ser divididas em duas vertentes, ambas carentes de equilíbrio e de realismo, conforme concluo relendo tais opiniões. O tempo se encarregou de provar que as duas estavam equivocadas.

De um lado estavam os otimistas, que acreditavam que o mundo estava no âmago de uma revolução universal, sem armas e sem barricadas, que iria nos conduzir à construção de uma sociedade muito melhor, mais justa, equânime e equilibrada do que a que então existia. Entre tais analistas, incluiu-se o falecido papa João Paulo II, que acreditava que a suposta derrocada do marxismo, aliada ao desencanto provocado pelo consumismo ocidental caracterizada pelo “capitalismo selvagem”, levariam a humanidade ao limiar de um renascimento da fé. Claro que não aconteceu nada disso, Ouso dizer que o mundo está, até, mais perigoso e instável do que esteve no auge da Guerra Fria.

No outro extremo, estavam os pessimistas, que não viam, com a ausência deixada pela ideologia esquerdista após seu fracasso, nenhuma perspectiva para os injustiçados, os despossuídos, os segregados, as multidões de miseráveis e famintos da Terra. Estes apostavam numa reversão, na vitória mundial da “ditadura do proletariado”, sonhando com um igualitarismo que contraria a própria natureza. Afinal, nenhum ser humano é igual ao outro. Mas este fato não pressupõe, também, nenhum domínio de um homem sobre o outro, nenhuma exploração, por qualquer motivo ou razão. Obviamente, também estavam errados.

Ser diferente não significa ser inferior. É isso que muita gente não entende, ou por oportunismo (principalmente), ou por fanatismo ou, simplesmente, por burrice mesmo. O fracasso de dois sistemas, surgidos nos últimos 200 anos – comunismo e capitalismo – deixou, na verdade, um enorme vazio ideológico, que poderia ser preenchido com algo novo, que corrigisse as distorções de um e de outro, e aproveitasse as virtudes de ambos. Os pessimistas, porém, não crêem nessa possibilidade. Nem eu. E prevêem o caos, o que também me parece exagerado. O capitalismo ainda está aí, mas impotente para solucionar suas próprias contradições. Creio que não tenha futuro. Não, pelo menos, com as premissas atuais.

No meio desses dois grandes grupos de analistas estavam os moderados, entre os quais me incluí na oportunidade e ainda me incluo. Eram (e são) os que não costumam tirar os pés do chão, mas que nem por isso se entregam a um frio e omisso desencanto. São os que acreditam na potencialidade humana, mas sabem que o processo renovador tem que começar com alguém e em algum lugar. São os que nunca perdem a “esperança”, mas definem esse conceito de forma correta, como faz Erich Fromm, em seu livro “Ter ou Ser?”, quando diz que ela “não é nem uma espera passiva nem um forçar irreal de circunstâncias que não podem ocorrer. É como o tigre agachado que só saltará quando chegar o momento de saltar”.

O que está aí, (e todos concordam, embora muitos não admitam), precisa ser mudado, e com urgência, para não agravar ainda mais o que já é muito grave.. Nunca funcionou, não funciona e jamais funcionará. Mas o que construir no seu lugar? Como? Quando? Está aí excelente desafio para homens de idéias, para pessoas que raciocinam e que não se prendem a dogmas e nem se deixam fanatizar por ideologias nitidamente inexeqüíveis, como, por exemplo, para escritores (por que não?)_ Que tal arregaçar as mangas e pôr o cérebro para funcionar? Este é o grande desafio da verdadeira modernidade!


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