Apenas especulações
Pedro
J. Bondaczik
Gosto de especular
sobre tudo o que me cerca, notadamente sobre origens. Acho fascinante
colocar-me no lugar do homem primitivo, quando começou a tomar consciência de
que existia, podia pensar e queria entender onde estava e para o que cada coisa
que tinha ao redor servia. Esse indivíduo, remotíssimo ancestral, antes de
aprender o que era essencial para sobreviver, certamente especulou, e muito,
sobre tudo o que o rodeava.
Nem sou tão ambicioso
em minhas especulações, porquanto evito especular, por exemplo, sobre o
universo, sobre o que é e sobre qual sua finalidade, sua origem (se é que teve
alguma), seu fim (se tiver algum) e outras tantas coisas do gênero. Tudo isso é
muito para minha ínfima mente (embora não para minha insaciável curiosidade)
que, no entanto, se engrandece e se expande com o poderoso recurso da
imaginação. Especulo sobre as origens, sim, mas da minha espécie, a humana e,
por consequência, das suas descobertas, dos costumes que estabeleceu, dos
hábitos que cultivou e das contradições de sua conduta. E, claro, de suas
criações.
Quando surgiu a nossa
espécie? Como se deu esse surgimento? São perguntas que ninguém pode responder.
Só é possível se especular a respeito. Podemos acreditar, sem vacilações, nas
versões apresentadas pelas várias religiões a propósito dessa origem (e bilhões
de pessoas, mundo afora, acreditam). Afinal, a fé é o ato de crer no incrível e
no improvável sem abrir brecha para o mínimo de dúvida. Podemos especular,
criando múltiplas teorias, calcadas em hipóteses e mais hipóteses, já que é
impossível de se delimitar o alcance da imaginação. Mas saber, saber mesmo, com
base em provas tão sólidas que tornem impossível nutrir qualquer laivo dúvida,
ninguém nunca soube, não sabe e, provavelmente, jamais saberá.
Isso que conhecemos
como sendo “História” da espécie, por exemplo, pode ser tudo, menos a lídima
expressão da realidade. É parcialíssima e não passa de um conjunto de versões,
de maneiras de interpretar determinados fatos sob visão particular de quem os
relatou. Ademais, boa parte dos registros originais foi feita em idiomas que há
muito desapareceram. E se não ocorreu esse desaparecimento, muitas palavras
ganharam, com o correr do tempo, outros significados, possivelmente opostos aos
que compreendemos na versão que chegou até nós, já que os idiomas são dinâmicos
e se modificam ao lonfo de gerações.
É mister que não se
esqueça que os episódios narrados foram “traduzidos” para diversas outras
línguas (só Deus sabe quantas), diferentes da primitiva em que foram relatados,
com prováveis acréscimos e/ou supressões, que os mutilaram, corromperam ou
descaracterizaram. Além disso, como diz o povo, “quem conta um conto,
acrescenta um ponto”. E tudo isso sem levar em conta que a História sempre é
contada do ponto de vista de quem a conta e, no caso de guerras, na versão do
vencedor.
Os registros mais
antigos, ditos “históricos”, remontam a por volta do ano 10.000 antes de
Cristo. Ou seja, a um período muitíssimo anterior à invenção das primeiras
linguagens escritas. Quem os relatou, portanto, não os testemunhou e nem foi
contemporâneo de nenhuma das testemunhas. Ouviu o relato de alguém, que o ouviu
de um outro mais velho, que por sua vez tomou conhecimento dele de um
ascendente, e assim por diante. Sabe-se lá quantas gerações transmitiram essa
história aos descendentes, até que chegasse aos ouvidos de quem, finalmente, a
redigiu. É possível, por mais crédulo e
ingênuo que se seja, confiar nessas narrativas e achar que tenham algum fundo
de verdade e. Portanto, mereçam credibilidade? Quem conta um conto...
Outra dificuldade
(insuperável) a considerar refere-se à contagem de tempo. Sabe-se que o homem
já teve muitos e muitos calendários diferentes. Boa parte baseava-se em ciclos
lunares. Os anos tinham 280 dias, e não os 365 atuais, com dez meses, de vinte
e oito dias cada. E isso sem contar os possíveis erros nas contagens de tempo.
Onde quero chegar com minha argumentação? Creio que é óbvio: à conclusão que a
maior parte do nosso conhecimento a propósito do passado da espécie (se não a
totalidade) é fruto de pura especulação,
baseada exclusivamente na imaginação. Daí não dar muito crédito de que isso que
chamamos pomposamente de História seja a lídima e veraz expressão do que de
fato aconteceu.
Ouso afirmar (pelas
razões expostas e por outras tantas que omiti) que não passa, quase toda, de
ficção, com ligeiro verniz de realidade. Ainda assim, recomendo seu estudo (e
dedico-me, com afinco, a ele), pois de todo e qualquer relato (se tivermos
acuidade mental suficiente para isso), podemos extrair algo de útil e de
proveitoso, quer para imitar, quer para jamais repetir. Voltarei oportunamente
a esse polêmico assunto.
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