Sunday, August 04, 2013

Pacto social básico

Pedro J. Bondaczuk

O novo governo que possivelmente vai emergir, nesta semana, em decorrência do provável afastamento do presidente Fernando Collor, após a autorização da Câmara dos Deputados para que o Senado instaure o processo de impeachment, tida e havida como certa, além da responsabilidade de restauração da ética na política, terá outra tarefa urgente e de extrema relevância.

O País precisa ser recolocado, ainda este ano, na trilha do desenvolvimento, com justiça social, se não quiser perder outra década, como o fez com a de 1980. Providências inadiáveis para restaurar o emprego, incentivar investimentos, recompor salários, sem realimentar a inflação, precisam ser tomadas.

Como isto seria feito é problema para técnicos e economistas. A retomada do desenvolvimento, porém, é tarefa absolutamente inadiável neste momento.

É mister, sobretudo, que se restabeleça o pacto social básico, implícito na própria definição de sociedade. Não é mais concebível que apenas uma irrisória minoria lucre desmesuradamente com o esforço coletivo de milhões de cidadãos que têm, por paga, a marginalização, a inacessibilidade à educação, à saúde, ao lazer e à própria dignidade enquanto homens. Um país não é um mero aglomerado de pessoas, agindo cada qual segundo seus próprios interesses, sem que nada as comprometa umas com as outras.

O professor e economista da Fundação Getúlio Vargas, Antonio Maria da Silveira, num artigo que publicou na "Folha de S. Paulo" de 10 de dezembro de 1991, definiu com clareza os riscos do descumprimento desse acordo tácito que é a base de qualquer comunidade humana.

Assinalou: "Existe um pacto social básico, cujo descumprimento é fator degenerativo de qualquer sociedade. A relação de troca, onde o cidadão contribui em trabalho e a sociedade retribui em salário, envolve duas necessidades existenciais básicas. A necessidade de sentir-se útil à sociedade, de dar uma contribuição social, por modesta que seja, e a necessidade de uma renda que satisfaça um padrão de vida mínimo, algo socialmente visto como aceitável, por modesto que seja".

Não existe nada de mais perverso do que um indivíduo desejar arrancar com seu talento e esforço o sustento para a família e não ter onde, por lhe faltar ocupação. Desemprego, num país jovem como o Brasil, onde quase tudo está por fazer, é um suicídio nacional.

Recessão prolongada, purgativa ou não, didática ou seja a que pretexto for, numa sociedade que precisa gerar, no mínimo, 2,5 milhões de colocações profissionais anuais, é o absurdo dos absurdos. Algo está muito, muitíssimo errado no modelo econômico que aí está posto.

Nem é preciso recorrer a nenhuma estatística para fundamentar o que salta à vista do mais leigo dos leigos em economia. Onde ficaram os ideais nacionais, tão apregoados durante a fase do "milagre econômico"? O que foi feito do "país do futuro", a cuja população está sendo suprimido o presente e que pouca coisa parece ter aprendido com o passado?

Quem souber que responda a estas questões e a outra, formulada por Antonio Maria da Silveira, no mencionado artigo: "Até quando pode um cidadão suportar a pobreza sem degenerar na mendicância ou na criminalidade?"

(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 27 de setembro de 1992).


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