Tuesday, August 06, 2013

País dá exemplo de prática democrática


Pedro J. Bondaczuk


A maior democracia do mundo --- que tem de eleitores um número equivalente ao dobro da população brasileira --- a Índia, vai às urnas, dentro de 90 dias, para resolver, pela única via admissível nesse país uma crise política: a do voto.

As eleições antecipadas em três anos, destinam-se a pôr fim a um período de instabilidade de governos frágeis, de minoria, estabelecidos como conseqüência da derrota do Partido do Congresso, a maior das agremiações indianas, no pleito de novembro de 1989, que levou Rajiv Gandhi para a oposição.

Nos últimos 16 meses a Índia teve dois gabinetes, absolutamente instáveis e com baixíssimo respaldo parlamentar: o de Ramasinghe Pratap Singh e o de Chandra Shekhar, que renunciou há uma semana. O primeiro conduziu, de maneira sumamente desastrada, um dos tantos conflitos religiosos que assolam o país, que foi a tentativa de radicais hinduístas de destruírem uma mesquita muçulmana, sob o pretexto de que no lugar em que ela está construída existiu, há três séculos, um templo de sua religião.

Eles argumentavam que naquele lugar exato, o deus Rama havia nascido e que, portanto, a construção de qualquer santuário de outra denominação religiosa ali era um sacrilégio. A imprensa noticiou, na oportunidade, no final do ano passado, o banho de sangue causado pela controvérsia, em cuja atuação Pratap Singh se conduziu com uma imperícia contundente. Shekhar, por outro lado, se pouco errou foi porque pouco fez.

A antecipação das eleições vai beneficiar, sem dúvida alguma, a Rajiv Gandhi, agora mais experiente nas questões de Estado e tendo por trás de si o carisma do nome de sua mãe, Indira Gandhi, e de seu ilustre avô, um dos pais da independência indiana, Jawaharlal Nehru.

Parece que somente essa família entende bem o seu complexo povo, de 850 milhões de habitantes, a segunda maior população do Planeta e certamente a comunidade humana mais variada que existe vivendo num único território, composta por mais de mil etnias, com línguas, costumes e tradições diferentes.

Trata-se de um verdadeiro milagre o fato de um país de tamanha complexidade, com a soma de problemas políticos, econômicos, étnicos, sociais e religiosos que tem, conservar-se íntegro já por 44 anos, sem que nesse período todo jamais tivesse ocorrido um único golpe de Estado, um só arranhão em suas instituições.

A Índia é a maior prova de que a democracia sempre é possível. E não foi por falta de violência, que aliás é uma das características indianas. Seu grande líder, que tornou concreto o sonho de independência, Mohandas Karamanchand Gandhi, o "Mahatma" --- termo que significa "grande alma" --- morreu assassinado nas mãos do jornalista Nathuran Godse, em janeiro de 1948, na culminância trágica de um complô de traficantes de armas.

Indira Gandhi caiu abatida, em 31 de outubro de 1984, por obra de seus guarda-costas "sikhs", que vingaram, dessa maneira, o massacre perpetrado contra sua seita no Templo Dourado de Amritsar, o maior santuário da religião. Mas nenhum desses atos de insânia foi suficiente para ameaçar a democracia. Está aí um exemplo para ser imitado.

(Artigo publicado na página 15, Internacional, do Correio Popular, em 14 de março de 1991).


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