Wednesday, February 27, 2013


Tumba de luxo de magnatas

Pedro J. Bondaczuk

O Titanic foi não somente o maior navio de transporte de passageiros do seu tempo, com capacidade para transportar 3.500 pessoas – capacidade essa superada, apenas, em 2006, portanto, em pleno século XXI, por outros gigantes dos mares – mas também o mais luxuoso construído até então. Seu naufrágio despertou, desperta e provavelmente ainda irá despertar a atenção de várias gerações, portanto, não apenas pelas 1.523 mortes que causou e pelas falhas (técnicas e humanas) que contribuíram para o desastre, e nas proporções em que se deu.

Há um outro fator que torna o caso tão morbidamente atrativo: o fato de, entre os que morreram, estarem centenas de multimilionários, detentores das maiores fortunas no início do século XX. Eram figuras que freqüentavam, praticamente todos os dias, as páginas de todos os jornais do Ocidente, tanto as de caráter social quanto, e principalmente, as de economia, pela importância dos empreendimentos que comandavam.
É interessante lembrar o luxo do Titanic. Para isso, recorro à enciclopédia eletrônica Wikipédia, que descreve dessa forma suas acomodações, suntuosas até para os padrões atuais:

O Titanic superou todos os seus rivais em termos de luxo e a opulência. A seção da Primeira-classe tinha uma piscina, um ginásio, uma quadra de squash, banhos turcos, banhos elétricos e o Café Verandah. As salas comuns da Primeira-classe foram adornadas com painéis de madeira esculpidos, móveis caros e outras decorações. Além disso, o Café Parisien oferecia culinária aos passageiros da primeira-classe, com uma varanda iluminada pelo Sol. Havia bibliotecas e cabeleireiros tanto na primeira como na segunda classe. A sala geral da terceira-classe tinha painéis de pinheiro e móveis robustos. O Titanic incorporou recursos tecnológicos avançados para a época. Ele tinha três elevadores elétricos, dois na Primeira-classe e um na Segunda-classe. Ele também tinha um subsistema elétrico alimentado por geradores a base de vapor, uma fiação elétrica que cobria todo o navio e dois rádios Marconi, incluindo um de 1.500 W manejado por dois operadores que trabalhavam em turnos, permitindo contato constante e a transmissão de muitas mensagens dos passageiros”.

Como se vê, o poderoso e suntuoso transatlântico tinha tudo o que de melhor o dinheiro poderia (e pode) comprar. Suas caríssimas suítes de Primeira Classe, que não ficavam nada a dever às dos mais refinados hotéis de cinco estrelas da atualidade, eram todas decoradas com móveis de estilo Luiz XV e “holandês moderno”, em voga na ocasião. E tinham que ser assim para agradar as centenas de sofisticadas e exigentes personalidades VIPs (Very Important Persons) de diversas áreas de atividades, notadamente da indústria, dos transportes, da exploração mineral, das finanças e do comércio internacional, entre outros, que transportava.

Não conheço nenhum outro desastre – aéreo, rodoviário ou marítimo – em que tantas personalidades tenham morrido simultaneamente. Fossem as vítimas cidadãos, digamos, “comuns”, e o naufrágio, provavelmente, não teria a mesma repercussão, embora pudesse despertar alguma atenção. Para o leitor ter uma ideia, lembro que estavam a bordo do Titanic, nessa viagem inaugural, que pretendia estabelecer o recorde de travessia interoceânica entre Inglaterra e Estados Unidos, entre outros, o “rei das ferrovias”, Charles Hays; o “rei do cobre”, Benjamin Guddenheim; a bela Condessa de Rhodes; a esfuziante senhora Rotschild e o “rei dos hotéis”, John Jacob Astor. Hoje esses nomes não significam nada para o leitor contemporâneo. Mas, em 1912, constituíam a nata da alta sociedade internacional.

Seria necessário mencionar mais alguém? Afinal, estavam a bordo mais uns duzentos a trezentos magnatas, de fortunas incalculáveis. Transportem o desastre para o dia de hoje e imaginem que estejam a bordo de um outro navio, desses megabarcos de cruzeiro cada vez mais comuns, os maiores magnatas e as personalidades mais famosas da atualidade, e que este, por uma razão qualquer afunde, sem que sejam resgatados. É até inimaginável a repercussão que tal desastre teria, levando em conta, até, a multiplicidade, variedade e instantaneidade dos veículos de comunicação que existem nestes albores do século XXI.

Não foi à toa que o grupo de companhias seguradoras que seguraram o Titanic e, notadamente, seus ilustres passageiros, teve que despender fortunas em indenizações aos herdeiros. Uma única empresa não suportaria arcar com tamanhos ônus e quebraria, com toda a certeza. Algumas integrantes do “pool”, aliás, de fato quebraram.

Outra coisa, atinente ao naufrágio, que merece ligeiro comentário, é o fator que o teria provocado. Ou seja, o iceberg. Embora essas imensas estruturas sólidas, de gelo, sejam comuns, em determinadas épocas do ano, nos oceanos próximos às regiões polares, não são tão frequentes assim (diria, até, que são raras) as colisões de navios com elas. É certo que a tecnologia atual torna essa possibilidade virtualmente nula. Mas... segurança total é algo que não existe, nunca existiu e certamente jamais existirá.

A denominação dessas estruturas naturais provém da fusão de duas palavras, ou seja de “ice” (gelo em inglês) e “berg” (montanha, tanto em sueco quanto em alemão). São enormes blocos, ou imensas massas de gelo que se desprendem de geleiras existentes nas regiões polares. Algumas dessas estruturas, que podem ter tanto formato cônico quanto piramidal (o mais comum)  constituídas, basicamente, de água doce em estado sólido, têm dimensões extraordinárias. Há alguns anos, por exemplo, um iceberg de tamanho comparável ao Estado norte-americano do Texas chegou a ameaçar a navegação em águas próximas à Antártida, até que viesse a se derreter. Felizmente, nenhuma embarcação, de qualquer espécie ou tamanho, se chocou com ele.

O iceberg que vitimou o Titanic tinha, na superfície, altura estimada de trinta metros, equivalente à de um prédio de dez andares. Todavia, sua base teria trezentos metros, já que a parte submersa é, geralmente, dez vezes maior do que a visível acima da linha de água. E sua profundidade, via de regra, é imensa. Uma colisão com essas “gélidas montanhas” tende a ser fatal. Embora constituídas de água em um de seus estados, no caso o sólido, são mais resistentes do que o mais forte dos concretos e do que o ferro e o aço.
Os icebergs singram mares, próximos aos pólos norte e sul, não raro por vários meses, até que se dissolvam por completo nas águas do oceano. Esse período de dissolução varia muito, de acordo com seu tamanho, formato etc. Viram quanta informação esse naufrágio gerou? E o que tratei até agora é um quase nada sobre as circunstâncias e consequências desse já centenário desastre, se comparado com o que já se escreveu a propósito e com o que ainda poderia ser escrito e que provavelmente o será.

Acompanhem-me pelo twitter: @bondaczuk 

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