Tumba de luxo de
magnatas
Pedro
J. Bondaczuk
O Titanic foi não
somente o maior navio de transporte de passageiros do seu tempo, com capacidade
para transportar 3.500 pessoas – capacidade essa superada, apenas, em 2006,
portanto, em pleno século XXI, por outros gigantes dos mares – mas também o
mais luxuoso construído até então. Seu naufrágio despertou, desperta e
provavelmente ainda irá despertar a atenção de várias gerações, portanto, não
apenas pelas 1.523 mortes que causou e pelas falhas (técnicas e humanas) que
contribuíram para o desastre, e nas proporções em que se deu.
Há um outro fator que
torna o caso tão morbidamente atrativo: o fato de, entre os que morreram,
estarem centenas de multimilionários, detentores das maiores fortunas no início
do século XX. Eram figuras que freqüentavam, praticamente todos os dias, as
páginas de todos os jornais do Ocidente, tanto as de caráter social quanto, e
principalmente, as de economia, pela importância dos empreendimentos que
comandavam.
É interessante lembrar
o luxo do Titanic. Para isso, recorro à enciclopédia eletrônica Wikipédia, que
descreve dessa forma suas acomodações, suntuosas até para os padrões atuais:
“O Titanic
superou todos os seus rivais em termos de luxo e a opulência. A seção da
Primeira-classe tinha uma piscina, um ginásio, uma quadra de squash, banhos
turcos, banhos elétricos
e o Café Verandah. As salas comuns da Primeira-classe foram adornadas com
painéis de madeira esculpidos, móveis caros e outras decorações. Além disso, o Café Parisien oferecia culinária aos
passageiros da primeira-classe, com uma varanda iluminada pelo Sol. Havia
bibliotecas e cabeleireiros tanto na primeira como na segunda classe. A sala
geral da terceira-classe tinha painéis de pinheiro e móveis robustos. O Titanic incorporou recursos
tecnológicos avançados para a época. Ele tinha três elevadores elétricos, dois
na Primeira-classe e um na Segunda-classe. Ele também tinha um subsistema
elétrico alimentado por geradores a base de vapor, uma fiação elétrica que
cobria todo o navio e dois rádios Marconi, incluindo um de 1.500 W manejado por
dois operadores que trabalhavam em turnos, permitindo contato constante e a
transmissão de muitas mensagens dos passageiros”.
Como se vê, o poderoso e suntuoso transatlântico tinha tudo o que de melhor
o dinheiro poderia (e pode) comprar. Suas caríssimas suítes de Primeira Classe,
que não ficavam nada a dever às dos mais refinados hotéis de cinco estrelas da
atualidade, eram todas decoradas com móveis de estilo Luiz XV e “holandês
moderno”, em voga na ocasião. E tinham que ser assim para agradar as centenas
de sofisticadas e exigentes personalidades VIPs (Very Important Persons) de
diversas áreas de atividades, notadamente da indústria, dos transportes, da
exploração mineral, das finanças e do comércio internacional, entre outros, que
transportava.
Não conheço nenhum outro desastre – aéreo, rodoviário ou marítimo – em que
tantas personalidades tenham morrido simultaneamente. Fossem as vítimas
cidadãos, digamos, “comuns”, e o naufrágio, provavelmente, não teria a mesma
repercussão, embora pudesse despertar alguma atenção. Para o leitor ter uma
ideia, lembro que estavam a bordo do Titanic, nessa viagem inaugural, que
pretendia estabelecer o recorde de travessia interoceânica entre Inglaterra e
Estados Unidos, entre outros, o “rei das ferrovias”, Charles Hays; o “rei do
cobre”, Benjamin Guddenheim; a bela Condessa de Rhodes; a esfuziante senhora
Rotschild e o “rei dos hotéis”, John Jacob Astor. Hoje esses nomes não
significam nada para o leitor contemporâneo. Mas, em 1912, constituíam a nata
da alta sociedade internacional.
Seria necessário mencionar mais alguém? Afinal, estavam a bordo mais uns
duzentos a trezentos magnatas, de fortunas incalculáveis. Transportem o
desastre para o dia de hoje e imaginem que estejam a bordo de um outro navio,
desses megabarcos de cruzeiro cada vez mais comuns, os maiores magnatas e as personalidades
mais famosas da atualidade, e que este, por uma razão qualquer afunde, sem que
sejam resgatados. É até inimaginável a repercussão que tal desastre teria,
levando em conta, até, a multiplicidade, variedade e instantaneidade dos
veículos de comunicação que existem nestes albores do século XXI.
Não foi à toa que o grupo de companhias seguradoras que seguraram o Titanic
e, notadamente, seus ilustres passageiros, teve que despender fortunas em
indenizações aos herdeiros. Uma única empresa não suportaria arcar com tamanhos
ônus e quebraria, com toda a certeza. Algumas integrantes do “pool”, aliás, de
fato quebraram.
Outra coisa, atinente ao naufrágio, que merece ligeiro comentário, é o
fator que o teria provocado. Ou seja, o iceberg. Embora essas imensas
estruturas sólidas, de gelo, sejam comuns, em determinadas épocas do ano, nos
oceanos próximos às regiões polares, não são tão frequentes assim (diria, até,
que são raras) as colisões de navios com elas. É certo que a tecnologia atual
torna essa possibilidade virtualmente nula. Mas... segurança total é algo que
não existe, nunca existiu e certamente jamais existirá.
A denominação dessas estruturas naturais provém da fusão de duas palavras,
ou seja de “ice” (gelo em inglês) e “berg” (montanha, tanto em sueco quanto em
alemão). São enormes blocos, ou imensas massas de gelo que se desprendem de
geleiras existentes nas regiões polares. Algumas dessas estruturas, que podem
ter tanto formato cônico quanto piramidal (o mais comum) constituídas, basicamente, de água doce em
estado sólido, têm dimensões extraordinárias. Há alguns anos, por exemplo, um
iceberg de tamanho comparável ao Estado norte-americano do Texas chegou a
ameaçar a navegação em águas próximas à Antártida, até que viesse a se
derreter. Felizmente, nenhuma embarcação, de qualquer espécie ou tamanho, se
chocou com ele.
O iceberg que vitimou o Titanic tinha, na superfície, altura estimada de
trinta metros, equivalente à de um prédio de dez andares. Todavia, sua base
teria trezentos metros, já que a parte submersa é, geralmente, dez vezes maior
do que a visível acima da linha de água. E sua profundidade, via de regra, é
imensa. Uma colisão com essas “gélidas montanhas” tende a ser fatal. Embora
constituídas de água em um de seus estados, no caso o sólido, são mais
resistentes do que o mais forte dos concretos e do que o ferro e o aço.
Os icebergs singram mares, próximos aos pólos norte e sul, não raro por
vários meses, até que se dissolvam por completo nas águas do oceano. Esse
período de dissolução varia muito, de acordo com seu tamanho, formato etc.
Viram quanta informação esse naufrágio gerou? E o que tratei até agora é um
quase nada sobre as circunstâncias e consequências desse já centenário
desastre, se comparado com o que já se escreveu a propósito e com o que ainda
poderia ser escrito e que provavelmente o será.
Acompanhem-me pelo twitter: @bondaczuk
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