Thursday, February 21, 2013


Quando o trabalho não é fator de progresso

 Pedro J. Bondaczuk
  
O trabalho deve ser uma fonte de progresso para quem o exerce e todos os que queiram produzir algo têm o direito de colocar o seu talento a serviço da sociedade em que estão inseridos e ter retorno justo daquilo que produzem. Isto é absolutamente óbvio.

No entanto, por paradoxal que pareça, não é o que vem acontecendo na América Latina, especialmente nesta terrível década de 80. A pobreza está crescendo a níveis assustadores na região e já alcança a 165 milhões de indivíduos, condenados, eles próprios, a um tormento pior do que o descrito pelo poeta Dante Alighieri, em sua “Divina Comédia”, e a verem, ainda por cima, seus filhos reduzidos a idêntica, se não a pior, situação. Onde tudo isto pode parar?

Quando temas desta natureza são levantados em âmbito público, sempre alguém, cinicamente, aponta o dedo acusador para quem ousa fazer isso, dizendo que ele está a serviço da ideologia “x” ou “y”. Não se consegue entender que a sobrevivência não é, em absoluto, uma questão ideológica, mas até instintiva. E nós, na América Latina, estamos nos limites dela. Pelo menos, a maioria. E não é o comentarista que diz isso.

São os números frios e secos de insuspeitas entidades internacionais que mostram essa realidade, que determinados grupos preferiam que permanecesse escondida. Como se isso ainda fosse possível! Como se a maioria dos latino-americanos não sentisse isso na própria carne!

Sobre o absurdo dessa dívida externa, que nas condições em que foi tomada se transformou em “eterna”, já tivemos inúmeras oportunidades de comentar. Não se pode levar a sério um tipo de negócio desses, em que o credor estipula, ao seu bel prazer, a taxa de juros que pretende cobrar.

Econômica, moral e logicamente isso soa como heresia. Mas há, ainda, muito bobo alegre, posando de moralista às avessas, pregando que as coisas fiquem como estão. Tais pessoas argumentam: “Quem mandou emprestar? Querem que nos chamem de caloteiros?” e outras bobagens do tipo.

Como se o cidadão que ganha salário mínimo (isto quando tem emprego para tanto), que por sinal fica cada vez mais achatado, tivesse feito tais empréstimos no Exterior. E em condições tão tolas, deixando para o credor estabelecer quanto quer cobrar de juros.

Não é o comentarista que está afirmando que estamos empobrecendo aceleradamente, a cada dia que passa. São os números divulgados pela Cepal, pelo Banco Mundial e pelo Fundo Monetário Internacional. Quando este processo perverso, que transforma o trabalho apenas em servidão, em tormento, em fonte mínima de sobrevivência e não em fator de progresso e felicidade para aquele que produz, vai ser detido? Quando?

(Artigo publicado na página 10, Internacional, do Correio Popular, em 31 de março de 1989).

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