Thursday, February 28, 2013


Avisos ignorados de uma tragédia anunciada

Pedro J. Bondaczuk

A viagem inaugural do Titanic – que acabou se constituindo, simultaneamente, na sua primeira, última e única – foi precedida por uma série de incidentes. Caso os responsáveis por essa “histórica” travessia (histórica, infelizmente, não pelas razões pretendidas) fossem mais prudentes e menos confiantes, ou arrogantes, em relação à invulnerabilidade do gigantesco transatlântico, é possível que este não naufragasse. É provável que navegasse por muitos e muitos anos, a exemplo do seu “gêmeo”, o Olympic, ligeiramente menor, mas com as principais características do navio sinistrado, que esteve a serviço da companhia proprietária – e por algum tempo, do governo britânico -  até 1935, escapando incólume de vários ataques durante a Primeira Guerra Mundial.

Houve, primeiro, a explosão de uma das 30 caldeiras do Titanic, o que justificava, por si só, uma revisão técnica na embarcação. Todavia, sequer se cogitou da adoção dessa prudente medida. Ao zarpar do porto de Southampton com destino a Nova York, o gigante dos mares por pouco colidiu com outro barco, colisão que só foi evitada dada a perícia dos respectivos pilotos. Caso os responsáveis pela badalada viagem inaugural fossem um tantinho supersticiosos, encarariam isso como um “aviso” e adiariam a partida por dois ou três dias ou, quem sabe, por uma semana. Não fizeram nada disso.

Se tomassem essa providência era certeza de que o naufrágio não aconteceria? Vá se saber! Pode ser que sim, pode ser que não. Mas era uma possibilidade. Os problemas a bordo, porém, não pararam por aí. Houve um incêndio em um dos porões em que estavam estocadas toneladas de carvão para alimentar as caldeiras do transatlântico. Não foi desses gigantescos e rápidos, é mister frisar. Mas não fora apagado provavelmente até o fatídico momento da colisão com o iceberg. Isso teve algo a ver com o desastre? Provavelmente não. Mas foi mais um dos tantos erros e imprudências que cercaram aquela viagem inaugural (e terminal). Havia obsessão para se estabelecer o recorde de velocidade no trajeto entre a Inglaterra e os Estados Unidos.

Houve, porém, um incidente, entre os que já mencionei, que ele, sim, pode ter sido determinante para o naufrágio. Tratou-se de uma omissão por parte de um tripulante, cujo motivo ninguém, jamais, conseguiu explicar. No início da noite do desastre, um domingo, o navio norte-americano “Californiam” passou um telegrama para o Titanic alertando sobre a existência de icebergs na rota que ele seguia. Todavia, essa mensagem jamais chegou ao conhecimento do capitão Edward Smith.

O telegrafista, Harold Bride (que sobreviveu) não comunicou a ninguém a recepção do aviso, conforme confessou tempos depois. Por que? Ele nunca conseguiu explicar de forma convincente. Aliás, sempre que o assunto vinha à baila, ele desconversava e morreu, anos depois, sem dar as devidas explicações. Caso tivesse comunicado a mensagem à ponte de comando, o comandante teria condições de alterar a rota para um trajeto seguro. Faria isso? Como saber?!

O mais provável é que Bride, como toda a tripulação, estivesse rigorosamente convicto da invulnerabilidade do transatlântico. Essa convicção era tamanha, que o Titanic zarpou de Southampton com botes salva-vidas insuficientes para todos a bordo. Não passava pela cabeça de ninguém que eles seriam necessários. Mas deveria passar, óbvio. Ademais, todos os tripulantes estavam comprometidos em estabelecer o tal recorde de travessia, custasse o que custasse. Porém, essa informação omitida, mesmo que eventualmente retardasse a viagem, era vital. Reitero: não se pode saber se, de posse dela, o comandante alteraria ou não a rota seguida. Mas teria a possibilidade de fazê-lo, sem dúvida.

Outro incidente, digno de nota, foi o fato de os dois rádios Marconi, a bordo, terem pifado ao mesmo tempo, conforme Harold Bride relatou em Nova York. Por uma dessas coincidências inexplicáveis, mas providenciais, esse relapso telegrafista e seu colega de sobrenome Phillips, conseguiram consertar o equipamento, e apenas uma hora, se tanto, antes da fatídica colisão com a montanha de gelo flutuante. Diversos navios que navegavam na área, dessa forma, puderam captar o pedido de socorro do Titanic: “Batemos num iceberg. Gravemente avariados. Precisamos de ajuda depressa”. Graças a esse SOS, por volta das quatro horas da madrugada, quando o dia estava prestes a raiar, o primeiro navio de socorro chegou à área do naufrágio para recolher os sobreviventes.

Se o rádio não fosse consertado, os apavorados náufragos, certamente, morreriam todos, principalmente de frio, naquela região tão gélida e de baixíssimo tráfego. Bride considerou um milagre ter conseguido reparar o equipamento e enviar a tal mensagem de socorro. Tudo o que os tripulantes sobreviventes disseram, todavia, sempre foi encarado com suspeição. É possível que estivessem tentando salvar a própria pele perante as autoridades e a opinião pública. Afinal, se sobreviveram, foi porque ocuparam o lugar que não lhes cabia, nos escassos botes salva-vidas, insuficientes para salvar sequer metade dos passageiros. Seu dever de honra, por mais cruel que fosse, seria o de afundar com o navio. Muitos, conforme testemunhos, deram cabo da vida antes do Titanic ir a pique. Um deles foi o capitão Edward Smith, que se matou com um tiro de pistola na têmpora. Pagou com a vida pelos seus erros e sua arrogância.

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