Avisos ignorados de uma
tragédia anunciada
Pedro
J. Bondaczuk
A viagem inaugural do
Titanic – que acabou se constituindo, simultaneamente, na sua primeira, última
e única – foi precedida por uma série de incidentes. Caso os responsáveis por
essa “histórica” travessia (histórica, infelizmente, não pelas razões pretendidas)
fossem mais prudentes e menos confiantes, ou arrogantes, em relação à
invulnerabilidade do gigantesco transatlântico, é possível que este não
naufragasse. É provável que navegasse por muitos e muitos anos, a exemplo do
seu “gêmeo”, o Olympic, ligeiramente menor, mas com as principais
características do navio sinistrado, que esteve a serviço da companhia
proprietária – e por algum tempo, do governo britânico - até 1935, escapando incólume de vários
ataques durante a Primeira Guerra Mundial.
Houve, primeiro, a
explosão de uma das 30 caldeiras do Titanic, o que justificava, por si só, uma
revisão técnica na embarcação. Todavia, sequer se cogitou da adoção dessa
prudente medida. Ao zarpar do porto de Southampton com destino a Nova York, o
gigante dos mares por pouco colidiu com outro barco, colisão que só foi evitada
dada a perícia dos respectivos pilotos. Caso os responsáveis pela badalada
viagem inaugural fossem um tantinho supersticiosos, encarariam isso como um
“aviso” e adiariam a partida por dois ou três dias ou, quem sabe, por uma
semana. Não fizeram nada disso.
Se tomassem essa
providência era certeza de que o naufrágio não aconteceria? Vá se saber! Pode
ser que sim, pode ser que não. Mas era uma possibilidade. Os problemas a bordo,
porém, não pararam por aí. Houve um incêndio em um dos porões em que estavam
estocadas toneladas de carvão para alimentar as caldeiras do transatlântico.
Não foi desses gigantescos e rápidos, é mister frisar. Mas não fora apagado
provavelmente até o fatídico momento da colisão com o iceberg. Isso teve algo a
ver com o desastre? Provavelmente não. Mas foi mais um dos tantos erros e
imprudências que cercaram aquela viagem inaugural (e terminal). Havia obsessão
para se estabelecer o recorde de velocidade no trajeto entre a Inglaterra e os
Estados Unidos.
Houve, porém, um
incidente, entre os que já mencionei, que ele, sim, pode ter sido determinante
para o naufrágio. Tratou-se de uma omissão por parte de um tripulante, cujo
motivo ninguém, jamais, conseguiu explicar. No início da noite do desastre, um
domingo, o navio norte-americano “Californiam” passou um telegrama para o
Titanic alertando sobre a existência de icebergs na rota que ele seguia.
Todavia, essa mensagem jamais chegou ao conhecimento do capitão Edward Smith.
O telegrafista, Harold
Bride (que sobreviveu) não comunicou a ninguém a recepção do aviso, conforme
confessou tempos depois. Por que? Ele nunca conseguiu explicar de forma
convincente. Aliás, sempre que o assunto vinha à baila, ele desconversava e
morreu, anos depois, sem dar as devidas explicações. Caso tivesse comunicado a
mensagem à ponte de comando, o comandante teria condições de alterar a rota
para um trajeto seguro. Faria isso? Como saber?!
O mais provável é que
Bride, como toda a tripulação, estivesse rigorosamente convicto da
invulnerabilidade do transatlântico. Essa convicção era tamanha, que o Titanic
zarpou de Southampton com botes salva-vidas insuficientes para todos a bordo.
Não passava pela cabeça de ninguém que eles seriam necessários. Mas deveria passar,
óbvio. Ademais, todos os tripulantes estavam comprometidos em estabelecer o tal
recorde de travessia, custasse o que custasse. Porém, essa informação omitida,
mesmo que eventualmente retardasse a viagem, era vital. Reitero: não se pode
saber se, de posse dela, o comandante alteraria ou não a rota seguida. Mas
teria a possibilidade de fazê-lo, sem dúvida.
Outro incidente, digno
de nota, foi o fato de os dois rádios Marconi, a bordo, terem pifado ao mesmo
tempo, conforme Harold Bride relatou em Nova York. Por uma dessas coincidências
inexplicáveis, mas providenciais, esse relapso telegrafista e seu colega de
sobrenome Phillips, conseguiram consertar o equipamento, e apenas uma hora, se
tanto, antes da fatídica colisão com a montanha de gelo flutuante. Diversos
navios que navegavam na área, dessa forma, puderam captar o pedido de socorro
do Titanic: “Batemos num iceberg. Gravemente avariados. Precisamos de ajuda
depressa”. Graças a esse SOS, por volta das quatro horas da madrugada, quando o
dia estava prestes a raiar, o primeiro navio de socorro chegou à área do
naufrágio para recolher os sobreviventes.
Se o rádio não fosse
consertado, os apavorados náufragos, certamente, morreriam todos,
principalmente de frio, naquela região tão gélida e de baixíssimo tráfego.
Bride considerou um milagre ter conseguido reparar o equipamento e enviar a tal
mensagem de socorro. Tudo o que os tripulantes sobreviventes disseram, todavia,
sempre foi encarado com suspeição. É possível que estivessem tentando salvar a
própria pele perante as autoridades e a opinião pública. Afinal, se
sobreviveram, foi porque ocuparam o lugar que não lhes cabia, nos escassos
botes salva-vidas, insuficientes para salvar sequer metade dos passageiros. Seu
dever de honra, por mais cruel que fosse, seria o de afundar com o navio.
Muitos, conforme testemunhos, deram cabo da vida antes do Titanic ir a pique.
Um deles foi o capitão Edward Smith, que se matou com um tiro de pistola na
têmpora. Pagou com a vida pelos seus erros e sua arrogância.
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