Renovação em alto nível
Pedro
J. Bondaczuk
A Literatura, a exemplo
das demais atividades, das mais variadas naturezas, está em constante
renovação, embora nem sempre isso nos pareça evidente, por uma série de razões.
Escritores novos surgem a todo o momento, em profusão, com produção intensa e
variada, apesar de apenas pequeníssima quantidade do que é produzido chegar às
nossas mãos em forma de livro. E por que isso acontece? Reitero, por uma série
de razões.
Porque, por exemplo,
ora o que esses “marinheiros de primeira viagem” escrevem não tem a qualidade e
a originalidade desejáveis, que eles acham que tem e que se espera deles, mas
cuja literatura se caracteriza pela mesmice e redundância, e que, por isso,
suas obras permanecem inéditas. Ora, em contrapartida, sua produção é muito
boa, mas por um conjunto de motivos, as editoras não se dispõem a bancá-los,
por entenderem que se trata de mera aposta de alto risco. Ora conseguem
publicar, mas pecam no quesito divulgação e seus livros encalham nas prateleiras
das livrarias e nunca chegam às nossas mãos, porque sequer sabemos que existem.
E as causas, de nos parecer que a Literatura brasileira está estagnada e não se
renova, são dezenas ou até centenas de outras, diferentes das citadas.
Por isso, quando encontro
(e por puro acaso) um romance como “June” (publicado pela Paco Editorial),
atualíssimo, com todos os ingredientes que espero de um bom livro – que
reproduzem com fidelidade nosso tormentoso cotidiano, e escrito por uma jovem
e, ainda por cima, idealista – mas não daquele idealismo meramente retórico,
mas o ativo, traduzido em ações eficazes para modificar uma realidade violenta,
perversa e má, me sinto na obrigação não apenas de registrar sua existência, de
fazer um ou outro comentário à margem, mas, sobretudo, de cuidar para que seja
divulgado e chegue ao maior número possível de leitores.
Sua autora, Gisele
Aparecida Pereira da Silva, completou, por estes dias, 33 anos de idade (é
nascida em 12 de outubro de 1979 em Catanduva, próspera cidade do rico e
progressista interior paulista). A despeito da nossa diferença de idade –
quando nasceu, para que vocês tenham uma idéia, eu já tinha 36 anos, era
casado, dois dos meus quatro filhos eram nascidos e minha carreira de
comunicador já contava com um bom par de anos, sendo que na ocasião eu era
editor do Diário do Povo de Campinas – ela fala (ou melhor, escreve) a “minha
linguagem”. Embora não pareça, isso é raro em escritores jovens, cuja maioria se utiliza, e não raro nem se
apercebe, de jargões característicos da juventude, incompreensíveis para quem
não seja do seu clã, da sua “tribo”, da sua faixa etária.
Não farei sinopse do
livro – nunca faço de nenhum, até para não estragar o fator surpresa do leitor
– mas adianto que se trata de um relato atualíssimo, abrangendo a realidade,
nua e crua, nacional e internacional, do nosso tempo. Seus personagens são
reais, verossímeis, de carne e osso, sem estereótipos e nem exageros.
Recomendo, pois, sem susto e sem receio de equívoco, esse romance, muito bem
escrito, que li de um só fôlego e me entusiasmei com sua atualidade e com a
alta qualidade literária.
Confesso que não
conheço a autora, a não ser por uma ou outra referência que consegui colher,
aqui e ali. Mas por tudo o que sei dela, gostei de imediato dessa companheira
mais jovem da atividade que tanto amo, quer como escritora de primeira linha
que revela ser, quer, e principalmente, como ser humano. Gisele (como eu) tem
formação jurídica, mas, ao contrário de mim, é advogada militante. E mais, é
comprometida diretamente com a causa da defesa dos direitos humanos, tão
alardeados, porém tão violados e vilipendiados mundo afora. É, pois, como
registrei, idealista ativa, fazendo sua parte para a construção de uma
civilização que realmente mereça esse nome e não se limitando, como tantos, a
criticar a realidade (o que não é difícil)
e a manifestar desencanto com ela (que é contraproducente), pretextos
para justificar omissão.
A personagem central do
romance, June, que dá título ao livro, é fascinante. Alguém pode ser levado a
pensar que não existam jovens assim, com essas características: bem informados
e sensíveis, comprometidos em mudar o mundo e suas desigualdades, preconceitos,
violência, egoísmo, injustiças e um perdulário e estúpido consumismo. Quem
pensa assim, todavia, está enganado. Deixa-se levar pela burrice das
generalizações.
Há, sim, muitas “Junes”
por aí (e conheço várias), lutando para mudar a mentalidade vigente
caracterizada por feroz e insensível competição, para a racional (e ainda
possível e desejável), a da solidariedade e da cooperação. Ouso dizer que
Gisele é uma delas.
Para não dizerem que não dei
nenhuma idéia mais concreta e objetiva do romance, reproduzo um parágrafo de
uma das críticas feitas a propósito (infelizmente não anotei quem a fez) e com
a qual (óbvio) concordo: “Muito embora a autora
ainda não seja conhecida no cenário brasileiro, é importante destacar sua
criatividade e perspicácia ao abordar temas polêmicos que vão desde bullyng,
desajustes familiares e conflitos religiosos, até problemas mundiais como
regimes ditatoriais, a invasão americana no Iraque e as inconstâncias política
na América Central e Latina”.
Como
não gostar e não recomendar um livro assim?! Se não o fizesse, estaria sendo
incoerente e infiel com os princípios que tanto apregôo. Como se vê, embora em
um ritmo mais lento do que o desejável (e do que eu gostaria que fosse), a
Literatura brasileira está, sim, se renovando. E não somente nos temas,
linguagem e estilos, mas, sobretudo, está revelando e projetando novos
talentos, que lhe dão vida e transcendência: os jovens escritores, como Gisele
Aparecida Pereira da Silva.
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
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