Wednesday, February 20, 2013


Coincidências ou premonições?

Pedro J. Bondaczuk

A premonição, ou seja, a previsão antecipada de algum fato que nunca aconteceu e que não tem nenhuma indicação de que possa acontecer, mas que acaba acontecendo, é possível ou não passa de lenda, dessas que começam não se sabe como e ganham, de tanto repetidas (e modificadas) foro de verdade? Confesso que sou cético a propósito. A despeito do meu ceticismo, todavia, admito não poder explicar determinadas ocorrências nesse sentido. Cito, como exemplo característico e concreto, o livro “Futilidade ou o naufrágio do Titan” (cujo título em inglês é “Futility or the wrack of the Titan”).

Seu autor, Morgan Robertson, descreve, e em detalhes, desastre envolvendo moderníssimo transatlântico, ocorrido exatamente em sua viagem inaugural, após colisão com um iceberg, em uma tranqüila noite de abril, quando se dirigia para Nova York. “Bem”, dirá o leitor, “não há novidade nenhuma nesse relato. É mais um dos tantos livros tratando do naufrágio do Titanic”. Certo? Errado! Não é nada disso! O livro de Robertson foi escrito (e publicado) exatos 14 anos antes da tão conhecida e divulgada tragédia no mar, que inspirou dezenas de escritores e vários produtores de cinema que rodaram pelo menos dez filmes e seriados de televisão a propósito.

Quando li, na enciclopédia eletrônica Wikipédia, pela primeira vez, referências a essa obra, pouco conhecida, pensei, cá com os meus botões: “Foi uma baita coincidência!”. Minha convicção, porém, começou a ficar abalada face aos detalhes do naufrágio da ficção. O imaginado e o real apresentam similaridade em praticamente todos os detalhes. Por exemplo, o nome do transatlântico fictício é quase o mesmo da embarcação real (o imaginado por Robertson é Titan, e o navio que de fato afundou é Titanic). E mais, a causa do desastre é a mesmíssima: colisão com um iceberg. E mais maluco ainda: tanto a nave da ficção, quanto a real foram a pique em uma noite de abril, ambas faziam viagem inaugural e tinham como destino a cidade de Nova York.Aí, eu pirei de vez. “Como pode?!”, pergunto, mas em tom de exclamação, toda a vez que essa “coincidência”, ou sabe-se lá o que, me vem à mente.

E as semelhanças entre a ficção e a realidade não param por aí. O número de mortos, no naufrágio imaginário e no verdadeiro, é exatamente igual, sem tirar e nem pôr: 1523 pessoas. E, nos dois casos, o número de vítimas dos dois transatlânticos foi tão elevado porque faltaram botes salva-vidas para todos passageiros e tripulantes. O cúmulo da coincidência foi o fato dos capitães, tanto do Titan, quanto do Titanic, terem o mesmíssimo sobrenome: Smith. Tudo foi igual nos dois casos, inclusive o peso, o comprimento, a capacidade de passageiros e o fato de ambos os transatlânticos serem caracterizados pelo extremo luxo.

Afinal, quem foi esse Morgan Robertson, que vislumbrou, com catorze anos de antecedência, esse que foi (e ainda é, passado um século) um dos maiores desastres marítimos de todos os tempos? Era algum místico? Era, acaso, um desses tantos supostos profetas, que volta e meia conquistam seus quinze minutos de fama na imprensa e depois desaparecem e caem no completo esquecimento? Não foi nada disso.

Morgan Robertson (que nasceu em 30 de setembro de 1861) foi oficial da Marinha Mercante dos Estados Unidos, que descobriu, à certa altura da vida, que tinha talento para as letras e virou escritor. Muitos atribuem-lhe a invenção do periscópio, de tamanha utilidade nos submarinos. E, por um triz, ele não emplaca mais uma e assombrosa “coincidência”: morreu, aos 53 anos de idade, em 24 de março de 1915, exatas três semanas antes de se completar um ano do naufrágio do Titanic. Aí, já seria demais, o cúmulo dos cúmulos, não é mesmo?!

Sua morte nunca foi devidamente explicada. As autoridades policiais, que encontraram seu corpo num dos quartos do Hotel Almanac, em Atlantic City, suspeitaram que se tratou de suicídio. A causa oficial, porém, foi a de envenenamento por mercúrio. Só não se sabe se foi acidental ou deliberado. Em vida, Robertson nunca gozou de sucesso literário. Seus livros tiveram reduzidas tiragens e circulação apenas local.          

“Futilidades”, diga-se de passagem, não foi o único livro “profético” que escreveu, mesmo jamais tendo reivindicado, em momento algum, a condição de “profeta”. A novela “Além do espectro”, sua derradeira obra literária, escrita pouco menos de um ano antes da morte, aborda uma futura guerra entre os Estados Unidos e o Japão, causada por um ataque japonês de surpresa a uma base naval norte-americana. Ou seja, “descreveu” Pearl Harbor 27 anos antes que esse acontecesse.

Como explicar a “façanha” (na verdade “façanhas”) de Morgan Robertson? Suas previsões, tão exatas, não passaram de meras coincidências? Foram frutos de premonição? Quem o sabe? Como explicar o inexplicável? No caso, cabe, a caráter, a célebre declaração de William Shakespeare, em Hamlet, colocada na boca desse célebre personagem, que teria visto o “fantasma” de seu pai, que morrera não fazia muito e sentenciou: “Há mais coisas entre o céu e a terra do que supõe nossa vã filosofia”. Isso cabe a caráter no caso de Morgan Robertson.

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