Coincidências ou
premonições?
Pedro
J. Bondaczuk
A premonição, ou seja,
a previsão antecipada de algum fato que nunca aconteceu e que não tem nenhuma
indicação de que possa acontecer, mas que acaba acontecendo, é possível ou não
passa de lenda, dessas que começam não se sabe como e ganham, de tanto repetidas
(e modificadas) foro de verdade? Confesso que sou cético a propósito. A
despeito do meu ceticismo, todavia, admito não poder explicar determinadas
ocorrências nesse sentido. Cito, como exemplo característico e concreto, o
livro “Futilidade ou o naufrágio do Titan” (cujo título em inglês é “Futility
or the wrack of the Titan”).
Seu autor, Morgan
Robertson, descreve, e em detalhes, desastre envolvendo moderníssimo
transatlântico, ocorrido exatamente em sua viagem inaugural, após colisão com
um iceberg, em uma tranqüila noite de abril, quando se dirigia para Nova York.
“Bem”, dirá o leitor, “não há novidade nenhuma nesse relato. É mais um dos
tantos livros tratando do naufrágio do Titanic”. Certo? Errado! Não é nada
disso! O livro de Robertson foi escrito (e publicado) exatos 14 anos antes da
tão conhecida e divulgada tragédia no mar, que inspirou dezenas de escritores e
vários produtores de cinema que rodaram pelo menos dez filmes e seriados de
televisão a propósito.
Quando li, na
enciclopédia eletrônica Wikipédia, pela primeira vez, referências a essa obra,
pouco conhecida, pensei, cá com os meus botões: “Foi uma baita coincidência!”.
Minha convicção, porém, começou a ficar abalada face aos detalhes do naufrágio
da ficção. O imaginado e o real apresentam similaridade em praticamente todos
os detalhes. Por exemplo, o nome do transatlântico fictício é quase o mesmo da
embarcação real (o imaginado por Robertson é Titan, e o navio que de fato
afundou é Titanic). E mais, a causa do desastre é a mesmíssima: colisão com um
iceberg. E mais maluco ainda: tanto a nave da ficção, quanto a real foram a
pique em uma noite de abril, ambas faziam viagem inaugural e tinham como
destino a cidade de Nova York.Aí, eu pirei de vez. “Como pode?!”, pergunto, mas
em tom de exclamação, toda a vez que essa “coincidência”, ou sabe-se lá o que,
me vem à mente.
E as semelhanças entre
a ficção e a realidade não param por aí. O número de mortos, no naufrágio
imaginário e no verdadeiro, é exatamente igual, sem tirar e nem pôr: 1523
pessoas. E, nos dois casos, o número de vítimas dos dois transatlânticos foi
tão elevado porque faltaram botes salva-vidas para todos passageiros e
tripulantes. O cúmulo da coincidência foi o fato dos capitães, tanto do Titan,
quanto do Titanic, terem o mesmíssimo sobrenome: Smith. Tudo foi igual nos dois
casos, inclusive o peso, o comprimento, a capacidade de passageiros e o fato de
ambos os transatlânticos serem caracterizados pelo extremo luxo.
Afinal, quem foi esse
Morgan Robertson, que vislumbrou, com catorze anos de antecedência, esse que
foi (e ainda é, passado um século) um dos maiores desastres marítimos de todos
os tempos? Era algum místico? Era, acaso, um desses tantos supostos profetas,
que volta e meia conquistam seus quinze minutos de fama na imprensa e depois
desaparecem e caem no completo esquecimento? Não foi nada disso.
Morgan Robertson (que
nasceu em 30 de setembro de 1861) foi oficial da Marinha Mercante dos Estados
Unidos, que descobriu, à certa altura da vida, que tinha talento para as letras
e virou escritor. Muitos atribuem-lhe a invenção do periscópio, de tamanha
utilidade nos submarinos. E, por um triz, ele não emplaca mais uma e assombrosa
“coincidência”: morreu, aos 53 anos de idade, em 24 de março de 1915, exatas
três semanas antes de se completar um ano do naufrágio do Titanic. Aí, já seria
demais, o cúmulo dos cúmulos, não é mesmo?!
Sua morte nunca foi
devidamente explicada. As autoridades policiais, que encontraram seu corpo num
dos quartos do Hotel Almanac, em Atlantic City, suspeitaram que se tratou de
suicídio. A causa oficial, porém, foi a de envenenamento por mercúrio. Só não
se sabe se foi acidental ou deliberado. Em vida, Robertson nunca gozou de
sucesso literário. Seus livros tiveram reduzidas tiragens e circulação apenas
local.
“Futilidades”, diga-se
de passagem, não foi o único livro “profético” que escreveu, mesmo jamais tendo
reivindicado, em momento algum, a condição de “profeta”. A novela “Além do
espectro”, sua derradeira obra literária, escrita pouco menos de um ano antes
da morte, aborda uma futura guerra entre os Estados Unidos e o Japão, causada
por um ataque japonês de surpresa a uma base naval norte-americana. Ou seja,
“descreveu” Pearl Harbor 27 anos antes que esse acontecesse.
Como explicar a
“façanha” (na verdade “façanhas”) de Morgan Robertson? Suas previsões, tão
exatas, não passaram de meras coincidências? Foram frutos de premonição? Quem o
sabe? Como explicar o inexplicável? No caso, cabe, a caráter, a célebre
declaração de William Shakespeare, em Hamlet, colocada na boca desse célebre
personagem, que teria visto o “fantasma” de seu pai, que morrera não fazia
muito e sentenciou: “Há mais coisas entre o céu e a terra do que supõe nossa vã
filosofia”. Isso cabe a caráter no caso de Morgan Robertson.
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