Thursday, February 14, 2013


A mais grave das três dívidas

 Pedro J. Bondaczuk
  
O Brasil, conforme consenso existente entre os políticos (que se lembram do fato em épocas de campanha e depois se esquecem, no momento de tomar alguma providência), tem três grandes dívidas: a externa, a interna e a social.

A primeira, embora esteja num virtual impasse diante das dificuldades do País em saldá-la, pode parecer, embora não seja, o mais difícil desses problemas. Afinal, não se trata de um débito isolado. Contamos com muitas e ilustres companhias, inclusive das duas superpotências mundiais. Sua renegociação, ou “rolagem”, como se diz na gíria dos economistas, é virtualmente permanente. Desde o presidente Campos Salles, no início do século, raros foram os governos brasileiros que não procuraram a reestruturação do perfil desse endividamento.

A dívida interna, por seu turno, numa simples penada, viu-se reduzida, da noite para o dia, com o confisco determinado pela equipe econômica do presidente Fernando Collor de Mello, tão logo assumiu, com a edição do chamado Plano Brasil Novo, de 15 de março passado.

Todavia, a mais grave delas, a que afeta a maioria esmagadora da população e se reflete por todas as atividades, a social, tem sido sempre protelada em sua solução, embora as diversas administrações tenham anunciado belas intenções a esse respeito.

O economista Carlos Lessa acaba de divulgar um projeto, até bastante meticuloso, a respeito, que objetiva, sobretudo, pôr fim à pobreza e à miséria absoluta no País. O estudo está muito bem fundamentado, mas esbarra num problema imenso.

Para que um programa social consistente possa ser levado adiante, sem paternalismos inconseqüentes, soluções de continuidade e sem que se tente apenas tampar o sol com a peneira, é necessário um investimento anual de 10% do Produto Interno Bruto, o que equivale à nada desprezível quantia de US$ 28 bilhões. Ou seja, uma cifra correspondente à metade de uma das maiores dívidas externas do Terceiro Mundo, a da Argentina.

A estratégia proposta por Lessa é simples e até óbvia, mas depende de um fator que nunca existiu para solucionar a questão: vontade política. O plano do ex-diretor do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, BNDES, propõe a criação de condições de vida decentes para cerca de 34 milhões de pequenos produtores rurais, para que eles não se sintam tentados a migrar. Ou seja, tirar de suas cabeças, mediante providências práticas, e consistentes, a miragem de que a cidade grande é o Eldorado que eles devem buscar. O estudo deve merecer análise mais profunda e, principalmente, uma séria atenção do governo, se é que ele pretenda, de fato, saldar a caríssima dívida social brasileira.

(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 31 de julho de 1990).

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