Problemas
têm ficado pendentes
Pedro J. Bondaczuk
O século XX, entre outras características que
apresentou até aqui, tem uma que vem sendo causa dos sucessivos conflitos
existentes no mundo, que o tornaram o mais violento e dramático da história: o
das soluções pela metade.
Adiar um problema, diz a lógica mais reles, ou
resolvê-lo parcialmente, não é chegar à sua resolução. É só "quase".
E nenhuma questão realmente importante se resolve por si só. Requer, sobretudo,
ação.
Para citar apenas os grandes momentos do nosso
tempo, em que se pecou pela incompetência, se pode mencionar o Tratado de
Versalhes, que acabou com a Primeira Guerra Mundial, humilhando a Alemanha, mas
não impedindo o surgimento de um Adolf Hitler; a criação de impérios
artificiais mediante negociatas secretas e acordos espúrios, sem que fosse
respeitada a vontade dos povos envolvidos e a manutenção de Saddam Hussein na
presidência do Iraque ao término da fulminante guerra do Golfo Pérsico.
Poderiam ser apontados talvez milhares de outros
episódios caracterizados pela ausência de imaginação e falta de bom senso. Os
citados, todavia, são suficientes para explicar muito do que está acontecendo.
Como, por exemplo, o ressurgimento das tensões na zona que é a "jugular do
petróleo" do Ocidente.
O presidente norte-americano, George Bush, nas
últimas semanas renovou as ameaças de nova intervenção militar de seu país
contra o povo iraquiano, que em última análise será quem de fato acabará
afetado, para concluir uma tarefa deixada pela metade durante a Operação
Tempestade do Deserto, iniciada em 17 de janeiro e subitamente paralisada em 28
de fevereiro passado.
Restaram poucos passos para a obtenção total do
objetivo, que era conter e eliminar um perigoso foco de tensão e
desestabilização no Golfo Pérsico: Saddam Hussein. Eles, porém, não foram
dados.
Outra conseqüência de um serviço incompleto são os
movimentos nacionalistas que estilhaçam a Iugoslávia, a União Soviética e que
ameaçam outras federações artificiais, criadas como se, para formar uma nação,
bastasse somente que um punhado de burocratas traçasse algumas linhas
apressadas num mapa.
O ensaísta francês Alain Minc abordou os resultados
desse tipo de atitude, constatando: "Assistimos hoje à conjunção de dois
fenômenos. Em primeiro lugar, o fim do equilíbrio do terror, que era nossa
melhor arma 'antinacional'. Até então, o mundo estava congelado pela dissuasão
nuclear em dois grandes blocos: Leste e Oeste. Vivemos assim por 45 anos: a
história estava, por assim dizer, petrificada".
Mais adiante, Minc acentua: "E depois, com o
fim de Yalta, a queda do muro de Berlim, eis que ela (a história) sai
bruscamente do congelador. As nações retomam seu lugar e acham-se no estado em
que estavam antes da longa noite comunista, atordoadas pelas injustiças dos
tratados e dos cortes das duas guerras, frustradas por meio século de opressão,
com seus reflexos étnicos, mesmo tribais, suas separações religiosas. E temos
hoje o direito de perguntar o que pode acontecer entre húngaros, romenos,
búlgaros e gregos, sérvios e croatas".
O ensaísta conclui seu raciocínio advertindo que
"riscos inimagináveis há um ano estão prestes a ressurgir". Isto, sem
contar os previsíveis, que não são poucos.
O norte-americano Edward Bellamy, num arroubo
futurista, previu, em 1891, no seu livro "Daqui a cem anos":
"Com uma lágrima para o passado sombrio, voltemo-nos para o ofuscante
futuro e, velando nossos olhos, sigamos em frente. O longo e extenuante inverno
da raça terminou. Começou seu verão. A humanidade rompeu a crisálida. Os céus
estão diante dela".
Todavia, a realidade contemporânea é bem diferente.
O jornalista Antonio Torres, numa crônica publicada no suplemento
"Idéias" do "Jornal do Brasil", retratou-a assim: "Nós
vivemos num século que foi muito rico, produziu grandes mudanças. Mas a gente
está chegando ao fim dele como numa espécie de balão que subiu, subiu, e
esvaziou. É um século que se despolarizou, encolheu, chegando ao fim meio aquém
de tudo que proporcionou". Ou seja, nada do que se começou foi levado até
o fim.
(Artigo publicado na página 15, Internacional, do
Correio Popular, em 25 de setembro de 1991).
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