Friday, February 07, 2014

Jornalista por vocação e escritor por opção

Pedro J. Bondaczuk

O nono integrante (pela ordem de publicação) da antologia de contos “Histórias da Bahia”, que tomei como referência para esta série de estudos sobre alguns dos principais ficcionistas baianos, talvez seja mais conhecido nacionalmente como jornalista do que como escritor. Pudera, Hélio Pólvora de Almeida trabalhou, por décadas, em alguns dos mais importantes veículos de imprensa, principalmente do Rio de Janeiro, mas também de São Paulo, de Brasília e do seu Estado natal, como “Jornal do Brasil”, “Correio da Manhã”, “Diário de Notícias”, “Diário Carioca”, “Correio Braziliense”, Revista “Veja”, “A Tarde”, de Salvador, e vai por aí afora. É mais uma das tantas contribuições do jornalismo para a Literatura nacional. E que contribuição!

A despeito de “talvez”, pelo menos nacionalmente, ser mais conhecido como jornalista, é um dos mais refinados e criativos escritores, não somente da Bahia – integrante do grupo dos grapiunas, como são chamados os ficcionistas nascidos na zona cacaueira do Estado e que têm por tema personagens, cenários e dramas dessa região – mas do País. Isso pode ser atestado pelos inúmeros prêmios literários que recebeu, e pelas diversas academias que integra, como as de Ilhéus e Itabuna, a Baiana e a Braziliense. Só estranho como ainda não foi guindado à mais célebre delas, a Brasileira de Letras. Há muito que seus méritos de escritor mais do que o credenciam a uma cadeira na casa de Machado de Assis, a ABL.

Notem que, ao levantar a possibilidade de Hélio Pólvora ser mais conhecido como jornalista enfatizei a palavra “talvez”. Não tenho nenhuma certeza de que isso seja real, apenas presumo. Porquanto, ele conta com uma obra vasta, eclética e consolidada. Tem mais de 25 livros publicados, de contos, de crônicas (que parece ser sua especialidade, assim como é, modestamente, a minha), romances e vai por aí afora. Leonardo Campos – graduado em Letras Vernáculas pela Universidade Federal da Bahia, pesquisador na área de cinema, literatura e cultura e membro do grupo de pesquisas “Da invenção à Reinvenção do Nordeste” – escreve o seguinte sobre seu ilustre conterrâneo: “Hélio Pólvora (1928) costuma identificar-se como ‘um pobre homem de Itabuna’, parodiando Eça. Diz, também, que saiu “do ventre dos cacauais”. Itabuna é cidade do sul da Bahia, centro comercial da região cacaueira”.

Não dá para estranhar a propensão do nosso personagem para o jornalismo, quando se sabe que aprendeu a ler – bem antes de entrar na escola – com a mãe, decifrando manchetes de jornais. Essa informação, também, credito a Leonardo Campos, em cujo blog colhi vários e preciosos dados sobre Hélio Pólvora. Como se vê, antes mesmo de começar o curso primário, em sua cidade natal, que iniciou com vantagem sobre os demais colegas de escola, por já estar alfabetizado, desde tenra idade, praticamente logo depois que aprendeu a falar, tomou contato, de uma forma ou de outra, com o jornalismo. Não estranho que tenha se apaixonado pela profissão. Minha paixão pelas letras de forma impressas nasceu, mais ou menos, da mesma maneira. Mas... isso não vem ao caso.

A rigor, a formação universitária de Hélio Pólvora não foi no Jornalismo, já que no seu tempo, não havia curso superior dessa atividade. Formou-se, na verdade, em Direito, no Rio de Janeiro, para onde se mudou em 16 janeiro de 1953, antes de retornar em definitivo à Bahia, 32 anos depois. Sua chegada à então ainda capital federal se deu cinco dias antes da morte de Graciliano Ramos, com quem pretendia se encontrar. Nunca se encontrou. Não sei se chegou a advogar. Não me consta que tenha chegado. O que sei é que, no Rio, exerceu a dupla função de jornalista e de escritor. A primeira, por vocação. A segunda, por opção, por livre escolha. E, tempos depois, acrescentou a elas a atividade de tradutor.

Minha intenção inicial, ao começar esta série de estudos, era dedicar apenas um texto a cada um dos vinte e três integrantes da antologia “Histórias da Bahia”. Contudo, a vida e a carreira desses escritores é tão fascinante, que essa idéia minha já foi para o espaço. Escreverei o tanto de textos que julgar necessário, não importa a quanto possam ascender. Afinal, estou me divertindo com isso, sendo forçado a estudar, e a partilhar minhas conclusões, como fiz poucas vezes em minha vida. Creio estar contribuindo, inclusive, com muitos estudantes de Letras, com estas minhas pesquisas, além de, de uma certa forma, estar fazendo justiça com muitos injustiçados.

Encerro estas reflexões de hoje com a opinião de Hélio Pólvora sobre a atual situação dos escritores. Em uma entrevista dada a Leonardo Campos, respondeu assim à pergunta do entrevistador se ainda há espaço para a Literatura nestes tempos de globalização e de revolução tecnológica: “Creio que ainda há espaço, neste nosso mundo globalizado, alienado, hedonista. Mas os escritores de tutano, outrora apontados nas ruas como celebridades, outrora competidores de atrizes e divas na mídia, vivem hoje em catacumbas, sem rádio de pilha e muito menos telefones móveis. Encontram-se ao redor de fogueiras e, acocorados, lêem entre si o que escreveram na pedra. Mais do que nunca a literatura é doença, é fatalidade”. É exatamente o que penso a propósito. Ainda assim, recuso-me a tratar desse “vírus” renitente...


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