Thursday, February 20, 2014

Opção pelo Solidariedade


Pedro J. Bondaczuk

A Polônia, embora pela sua própria situação geográfica na Europa tenha sido sempre vítima, através da história (pelo menos dos últimos sete séculos), da rapina das nações mais fortes, tem uma longa tradição de altivez. Seu povo jamais se conformou com as seguidas agressões vindas de fora. Nunca se curvou à força das armas, embora com isso tenha pago dolorosos tributos em vidas valorosas suprimidas estupidamente. Os poloneses, extremamente religiosos que são (95% são católicos), crêem, na sua maioria, que todos os homens são irmãos e que compete a eles o exercício permanente da solidariedade. Da ajuda mútua. Da união da vontade e esforços para a construção de uma sociedade mais justa e permanente.

Foram exatamente esses ideais que moveram os criadores do único sindicato independente do partido oficial (o Comunista) do Leste Europeu. Tanto é que a organização foi batizada com essa palavrinha mágica que reflete o desejo da maioria dos poloneses: "Solidarnosc", que quer dizer, em nossa língua, "solidariedade".

É desnecessário lembrar todos os incidentes que levaram os trabalhadores da Polônia a se rebelarem contra o sindicato oficial, que não passa de mero apêndice da única agremiação existente no país, que por sua vez é dirigida do Exterior. Ou seja, está voltada à implantação de algo, chamado eufemisticamente de "ditadura do proletariado",  em âmbito mundial, mas que na verdade a implanta "sobre" este, nos países que optaram por esse sistema. Não é necessário, até porque ainda está muito fresco na memória de todos, lembrar as vítimas dessa postura de altivez e de coragem dos adeptos do Solidariedade, das quais a mais recente é o sacerdote operário Jerzy Popieluzsko, cujo assassinato permanece ainda bastante nebuloso.

O que deve ser ressaltado é que com toda a repressão determinada pelo Cremlin e executada pelo regime polonês, consubstanciada nas prisões arbitrárias realizadas especialmente a partir de 13 de dezembro de 1981, quando o primeiro-ministro, general Woijciej Jaruzelski, decretou a lei marcial (num autêntico golpe de Estado na Polônia), quase dez milhões de trabalhadores mantêm intacta a vontade de que o sindicato Solidariedade sobreviva. Enquanto isso, o oficial, comunista, comandado por preguiçosos burocratas, alheios aos problemas e necessidades da classe operária, tem inscritos menos da metade dessa quantidade, ou seja,  4,5 milhões de sindicalizados.

Vale ressaltar que a mão de obra ativa na Polônia é composta de 17 milhões de trabalhadores, dos quais 2,5 milhões nâo têm nem simpatia pelo Solidarnosc e muito menos estão ligados ao sindicato que conta com as bênçãos do regime. Depreende-se que a legalização do Solidariedade, com todo o temor que essa medida possa despertar no Cremlin, é uma simples questão de tempo. É impossível impor perpetuamente a uma maioria determinada e que sabe o que quer, idéias e programas que ela repudia. E os poloneses, desde agosto de 1980, fizeram a sua opção. Clara, decidida e permanente. Seus trabalhadores querem gerir seus próprios destinos, através da mútua e construtiva solidariedade. E fatalmente, um dia, o farão.

(Artigo publicado na página 9, Internacional, do Correio Popular, em 14 de dezembro de 1984)


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