Saturday, February 15, 2014

Corrupção atrapalha repressão


Pedro J. Bondaczuk


O aumento da produção, e conseqüentemente do tráfico de drogas, em 1984, foi qualquer coisa de espantoso, principalmente se for levada em conta a intensificação de uma campanha internacional para diminuir esse nefasto comércio.

Há duas semanas, o Departamento de Estado dos EUA divulgou o seu relatório anual sobre o assunto. E os dados nele constantes revelam a impotência dos organismos repressores no combate aos produtores, principalmente de maconha, ópio e cocaína.

Os norte-americanos mantêm relações diplomáticas com dez, dos treze maiores plantadores da “cannabis”, da papoula e da Erythroxylum (coca), plantas de onde se extraem as drogas mais consumidas no país. E em sete deles, as colheitas aumentaram em níveis alarmantes, a despeito das promessas dos respectivos governos de destruírem essas lavouras.

Belize, Bolívia, Birmânia, Colômbia, Equador, Jamaica, México, Peru, Paquistão e Tailândia produziram, apenas em 1984 (pasmem!), 18.880 toneladas de maconha, 130.880 toneladas de folhas de coca (não incluindo o epadu, que tem menor rendimento) e 763 toneladas de ópio. Droga suficiente, como se vê, para enlouquecer toda a população norte-americana e ainda sobrar resto para corromper a juventude da Europa.

Todas as campanhas movidas pelas autoridades esbarram, invariavelmente, num problema gravíssimo, e hoje até generalizado, que é a corrupção. Para que o leitor tenha uma idéia, o comércio de coca movimenta mais dinheiro do que todas as exportações bolivianas reunidas.

Sessenta mil hectares de terras da Bolívia são ocupados com a cultura, que propicia três colheitas anuais. É impossível sequer de se estimar o volume real de divisas movimentado por esse comércio, tão elevadas são as suas proporções e tal é o sigilo que cerca essa atividade criminosa.

O relatório do Departamento de Estado dos EUA, embora o melhor elaborado e mais preciso estudo sobre o problema divulgado até o momento, não pode ser tomado como um dado definitivo sobre a produção real das drogas que analisa.

Por exemplo, o documento constata que a Bolívia produziu 49.200 toneladas de folhas de coca em 1984, situando-se abaixo do Peru na safra, quando próprias fontes bolivianas admitem que a produção foi cerca de 300% maior, superando as 120 mil toneladas.

Com as cotações atingindo importâncias altíssimas por grama e levando-se em conta que as quantidades assinaladas no relatório norte-americano são de droga pura (a comercializada tem uma mistura de um por três de outros aditivos), dá para se Ter uma idéia de quanto são monumentais o volume vendido e o dinheiro arrecadado.

Quanto dessa quantia não deve estar sendo usada para subornar pessoas em posição chave na repressão ao tráfico? Cifras mirabolantes, com certeza, capazes de virar a cabeça de qualquer mortal, principalmente nestes tempos de “vacas magras”, desmoralizando todas as tentativas bem intencionadas de reduzir (já que parece impossível extinguir) esse nefasto comércio.

A dolorosa conclusão a que se chega é que as pessoas, tão incompetentes para encontrar soluções adequadas para os problemas econômicos pessoais e de suas comunidades, por meios lícitos, mostram diabólica competência para gerir empreendimentos criminosos, profundamente nocivos e sob todos os aspectos que se olhe condenáveis, como o grande “negócio” do vício.

(Artigo publicado na página 11, Internacional, do Correio Popular, em 27 de fevereiro de 1985).


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