Sunday, November 26, 2017

Proliferação de siglas



Pedro J. Bondaczuk



A permissão para que novos partidos políticos, em fase de formação, participem das eleições de novembro próximo para as prefeituras das capitais brasileiras e cidades consideradas áreas de segurança nacional, deflagrou uma proliferação de siglas, cujo número pode chegar, até mesmo, a trinta.

Até quarta-feira, 22 novas agremiações haviam obtido registro na Justiça Eleitoral e mais quatro pedidos estavam na fila, aguardando vez. Com essa pulverização partidária, retorna, à nossa vida política, o saudável hábito das coligações, praticado, frise-se, num curto período da República, mas que abre o leque de opções ao eleitor na hora de votar.

E com essa prática, alianças surpreendentes, algumas até estranhas, estão sendo feitas, aqui e ali, ganhando as manchetes dos noticiários. Como o apoio dado pelo Partido da Frente Liberal em São Paulo ao candidato do PTB à Prefeitura paulistana, o ex-presidente Jânio Quadros, por exemplo, causando alguns arranhões na frágil Aliança Democrática.

Outras coligações que nos vêm à memória são as do PDT, do governador do Rio de Janeiro, Leonel Brizola, em Salvador, onde empresta solidariedade ao postulante do PMDB, Mário Kertz, ao Executivo da capital baiana. Em Cuiabá, todavia, esse mesmo partido aliou-se ao mais ferrenho adversário de ontem, o PDS de Paulo Maluf, para impedir que o peemedebista Dante de Oliveira, o mesmo autor do célebre projeto de emenda constitucional instituindo as eleições diretas para a sucessão do ex-presidente João Figueiredo, acabe se elegendo prefeito.

Na cidade de São Paulo, o recém criado Partido Socialista Brasileiro dá um passo mais do que lógico e coliga-se com o PT, com quem se identifica ideologicamente, respaldando a candidatura do deputado Eduardo Suplicy ao Ibirapuera, tendo Rogê Ferreira por vice.

As agremiações mais antigas, especialmente o PMDB, que abrigavam sob as suas asas protetoras várias correntes ideológicas, de matizes os mais diversos e antagônicos; indo da extrema-direita à extrema-esquerda, têm a chance de uma saudável renovação. De uma consolidação dos princípios básicos que sempre as nortearam.

No caso do antigo MDB, isso significa a fixação de postulados defendidos desde os heroicos tempos de resistência, imediatamente após o movimento de 1964. Diversos descontentes estão mudando de lado, acomodando-se sob siglas compatíveis com seu pensamento político. Outros esperam para ver o resultado desta ciranda partidária, antes de tomarem uma providencial e coerente decisão.

Muita gente está assustada com tantos partidos. Uns acham que o processo tende a causar pulverização da aliança que, em nível nacional, dá sustentação ao presidente José Sarney. Outros argumentam que o eleitor, na hora de votar, vai ficar com a cabeça tão embaralhada com tantas siglas, nomes e números, que acabará por anular o seu voto. Balela.

O cidadão brasileiro sempre votou em nomes, não em partidos. Mas essa abertura, não se pode negar, é saudável. Reflete exatamente o estado atual de nossa sociedade, dividida em centenas de pequenos grupos de interesse. E é indispensável que todas essas correntes tenham a chance de expressar claramente o que pensam, de apontar soluções para os graves problemas que nos atormentam e que o maior número possível delas se faça representar na Assembleia Nacional Constituinte.

Para que a próxima Constituição seja mais compatível com as necessidades e aspirações de todos os brasileiros, ou pelo menos da grande maioria deles, do que foram as anteriores. No final das contas, quando a poeira baixar, restarão apenas dois ou três partidos com real representatividade. O velho e forte PMDB, possivelmente remoçado com a “transfusão” de muito sangue novo; a nova Frente Liberal, que terá em novembro o seu batismo de fogo e o PDS, se lograr conciliar suas diversas correntes e se livrar de alguns estigmas de seu passado. Os demais serão “peneirados” pelas próprias urnas e terão que aceitar a “vox populi”, que no final das contas é a “vox Dei”.

(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 21 de julho de 1985).



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