Apenas meros fios
Pedro J. Bondaczuk
As questões são múltiplas, infinitas, complexas e nebulosas
enquanto que as respostas são vagas, imprecisas, truncadas e
parciais, que em verdade nada respondem, mas se limitam a especular.
Ainda assim, com base em dados tão precários, contestáveis e
vagos, o homem se atreve a tirar conclusões de tudo e de todos. Não
se apercebe que não tem como se livrar do estigma da pequenez,
efemeridade e ínfima importância que carrega do nascimento à
morte.
O que hoje soa como absoluta verdade, dogma incontestável e
consensual, amanhã pode não passar de risível sofisma, do qual
todos venham a escarnecer. E não é o que acontece? Não ocorreu,
por exemplo, em relação ao formato da Terra?
Ainda no século XV, os “doutos” entendidos de geografia e
ciências afirmavam que o Planeta era plano e que ao cabo dos oceanos
então conhecidos havia um abismo, habitado por gigantescos monstros,
que destruiriam quem se aventurasse a chegar lá. Hoje, no entanto,
nem o mais maluco dos malucos afirma uma sandice dessas, no auge de
alguma crise aguda de delírio.
Querem mais? Não faz muito, há cinco séculos, se tanto (que em
termos históricos, não passa de recentíssimo “ontem”), era
público e notório que a Terra era o centro do universo. Que a lua,
o sol, os planetas, as estrelas e galáxias giravam ao seu redor.
E ai de quem ousasse contradizer esse dogma. Era chamado às falas
(na verdade, não bem isso, mas... deixa pra lá) e, caso não
admitisse seu “erro” e não o abjurasse, solene e contritamente,
poderia virar churrasquinho numa fogueira, para satisfazer a sanha e
a sede de sangue da turba fanática e ignorante.
E hoje? Há algum imbecil, desses portadores de dois únicos
neurônios e, assim mesmo, com um deles pifado, capaz de dizer
tamanha sandice? Todavia, não faz muito, isso era tido e havido como
o suprassumo da verdade.
Era, óbvio, fruto de conclusões prematuras, com base apenas em
toscas aparências que, como todos sabem, costumam enganar (e como
enganam) tanto os incautos quanto os pseudodoutos quando abrem mão
da desejável cautela.
É lícita, válida, útil e necessária esta nossa insaciável sede
pelo saber. Somos (e devemos ser cada vez mais) seres sumamente
curiosos, em busca de soluções para o que se nos afigura como
insondáveis mistérios e de explicações para o que pareça, ou de
fato seja, inexplicável.
Não são as especulações, teorias e hipóteses, pois, que se
tornam condenáveis e que devemos evitar. São as conclusões, quase
sempre prematuras, precipitadas e baseadas, apenas, nas aparências,
principalmente quando estas aparentem ser lógicas e plausíveis.
O verdadeiro espírito científico é o que tem como premissa
permanente estado de dúvida. É descartar qualquer “certeza”
liminar que na verdade nunca temos, mesmo que estejamos convictos de
ter. Crer, baseado exclusivamente nas aparências ou em fragílimas
evidências, não é fé, é mera credulidade. Fuja dos donos da
verdade, dos falsos gurus e dos que se arrogam a ter “a chave do
conhecimento”.
Gustave Flaubert também se mostrou pasmo com a arrogância de
alguns, e com a estupidez de milhões de outros tantos. Os primeiros
por, sem nenhuma base sólida e nem dados concretos e indesmentíveis,
saírem por aí ditando cátedra e espalhando dogmas que só têm
como conseqüência o atraso na evolução mental e espiritual do
homem. E os segundos, por acreditarem em tudo o que lhes dizem, sem
colocar ínfima pontinha de dúvida. Declarou, a propósito:
“Estupidez consiste em querer chegar a conclusões. Nós somos um
fio e queremos conhecer o pano todo”.
Deveríamos, desde crianças, ser educados nos princípios defendidos
por René Descartes, ou seja, os do “dubito, ergo cogito, ergo sum”
(duvido, logo penso, logo existo). No mais, tudo é questionável. A
única conclusão segura a que poderemos chegar é a de que
existimos, pois se temos a capacidade de duvidar, temos a de pensar.
E se contamos com essa habilidade, “existimos”.
Utilizando o método do ceticismo, mas com a mente e o espírito
abertos, sem assumir atitude cética (mantendo predisposição de
aceitar a verdade quando ou se chegarmos a ela), chegaremos, talvez,
a uma raríssima conclusão válida, com chances de ser verdadeira:
“só sei que nada sei”. E sei lá alguma coisa?!!
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