Friday, November 17, 2017

À procura dos justos



Pedro J. Bondaczuk


O escritor Jorge Luís Borges escreveu, em “O Aleph”, que “não há geração sem quatro homens retos, que secretamente sustentam o Universo e o justificam diante do Senhor. Um desses varões teria sido o juiz mais idôneo. Mas, onde encontrá-los, se andam perdidos e anônimos pelo mundo, e não se reconhecem quando se veem, e nem eles mesmos sabem do alto ministério que cumprem?”

Embora se trate de uma provocação intelectual do grande mestre, evidentemente é um exagero dizer que há tão poucos justos. Mas nunca se sabe...A julgar pelo noticiário do dia a dia, até essa cifra torna-se questionável.

Escândalos e acusações de suborno, de exploração da boa-fé alheia, de aberrações sexuais e de perversidade de toda a sorte desfilam nas manchetes, ante o nosso olhar aturdido e revoltado. É a operação Mãos Limpas na Itália, com novas e surpreendentes revelações acerca das bandalheiras de homens aparentemente insuspeitos: são os casos de pagamento de propinas e outros atos de corrupção no Japão, que pipocam nas manchetes num,a sucessão que não tem mais fim; é o novo episódio envolvendo poderoso senador norte-americano, acusado de transformar sua casa num bordel e são tantas outras histórias escabrosas e nada edificantes, que ficamos pasmos. E chegamos a cometer a injustiça de achar que ninguém presta.

Isto, para não citar perversidades maiores, cometidas, por exemplo, na Bósnia, na Somália, no Haiti, em Burundi, e em tantos e tantos lugares governados por truculentos ditadores ou por presidentes corruptos ou, onde pessoas se matam, em sangrentas guerras civis, ou nas ruas das cidades, sem que sequer se odeiem ou se conheçam.

E o que falar dos escândalos que atormentam, há 171 anos, ou até mais (provavelmente desde seu descobrimento, em 1500), esta dadivosa Terra de Santa Cruz? O que dizer dos ladrões da Previdência, por exemplo? Ou dos envolvidos (e ainda impunes) no esquema PC? E dos fraudadores do Orçamento da União?

Onde estão os quatro justos desta geração? Estão por toda a parte. Só o nosso pessimismo e o hábito das generalizações não permitem que os vejamos. E não são apenas quatro. Talvez sejam 400. Ou, quem sabe, 4 mil, 400 mil, 4 milhões, 400 milhões?!

(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 31 de outubro de 1993)



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