Vestibular inadequado
Pedro J. Bondaczuk
A palavra em maior uso, nos
últimos anos, no nosso quotidiano (ou uma das mais usadas) tem sido “fraude”. A
corrupção parece Ter se instalado entre nós em praticamente todos os setores de
atividade. Frauda-se nos impostos, na política, nos esportes e até mesmo na
religião.
Agora
esse processo nefasto passou a aparecer com maior freqüência no acesso de
estudantes às universidades. Vários vestibulares, em pelo menos cinco Estados –
São Paulo, Rio de Janeiro, Paraná, Pará e Goiás – foram fraudados, de alguma
forma ou de outra, atrapalhando a vida de dezenas de milhares de bons
estudantes, que não mediram sacrifícios para a realização de um sonho e que
agora se vêem frustrados e assustados diante desses acontecimentos.
A
fraude nas escolas, aliás, nem é coisa nova. Raro foi o aluno, por exemplo, que
nunca em sua vida escolar não “colou” ao menos uma vez. Quem agiu assim hoje
entende que não fraudou, como chegou a pensar, o estabelecimento escolar, os
professores ou o sistema. Cometeu burla contra si mesmo, já que aquilo que
deixou de aprender (logicamente), não está incorporado ao “patrimônio” dos seus
conhecimentos.
Ou
se está, essa pessoa teve que gastar duas vezes (ou mais) para adquirir ciência
de algo que poderia ter conseguido com um pouco mais de esforço e honestidade
na primeira oportunidade. Quanto a casos fraudulentos em vestibulares, também
não são novos. Outros devem ter ocorrido, em anos passados, que ficaram sem ser
descobertos. E mesmo neste, sabe-se lá!
Diante
dessa ocorrência, o ministro de Educação, Hugo Napoleão, chegou a aventar,
anteontem, em entrevista coletiva, a possibilidade de modificação do sistema de
ingresso nas universidades. Esta autêntica “loteria”, que em todos os anos de
existência jamais revelou ser eficiente, seria extinta.
Mas
para que isso aconteça, será indispensável que ocorra uma mudança em
profundidade no ensino, especialmente no de segundo grau, que atualmente (não é
novidade para ninguém) deixa muito a desejar. Bom seria se fosse possível
estabelecer algo parecido com o que há nos Estados Unidos, por exemplo. Que a
seleção fosse feita no correr de todo o curso colegial. Estabelecer, digamos,
uma média altíssima, algo em torno de oito, para a aprovação do aluno na última
série do segundo grau.
Evidentemente,
poucos seriam os que conseguiriam esse “score”. Mas quem conseguisse, teria
méritos e condições para lá de suficientes para enfrentar um curso
universitário sem temores de fiasco. O despreparo com que a maioria enfrenta hoje
um vestibular é algo contundente.
A
grande maioria dos postulantes à universidade, mesmo tendo feito um ano ou mais
de “cursinho”, revela um total desconhecimento das matérias dos exames. Um
exemplo disso foi o que aconteceu com a seleção do Cesgranrio em 1986.
Ao
planejar a prova de Física desse ano, os organizadores, receando o mau
desempenho dos candidatos, formularam cinco questões (entre 35), banais, que
tinham a certeza que seriam respondidas por todos os concorrentes. Acertando
todas elas e respondendo as outras no “chute”, qualquer aluno poderia, na
sorte, chegar à média 3,3.
Esta,
no entanto, ficou em apenas 2,3 no geral. Num desabafo, o reitor da UFRJ chegou
a dizer na ocasião: “Um macaco treinado para marcar um cartão teria conseguido
uma média muito maior”. E teria mesmo. O pior é que mediante a fraude, o
engodo, o engano (nem sempre descobertos), muitos desses “estudantes” conseguem
vagas nas universidades, tirando o lugar de quem realmente tem méritos. Por
isso, esse sistema de seleção precisa mudar, até pelo bem do País.
(Artigo
publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 22 de janeiro de 1988).
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