Tuesday, March 10, 2015

Ciência utilizada para o mal

Pedro J. Bondaczuk

O biólogo, filósofo e historiador francês, Jean Rostand, afirmou, em certa ocasião, que “a ciência fez de nós deuses antes mesmo de merecermos ser homens”. Exagerou, porventura, nessa declaração? Seria mera citação de efeito, simples exercício de retórica? Creio que não. Afinal, seu autor sequer era escritor. Era um cientista alertando para os riscos de acesso ao conhecimento científico (no qual era especializado), de pessoas sem ética e sem juízo. Porquanto o fato de alguém ser especialista neste domínio não quer dizer que, automaticamente, seja, também, um sujeito ponderado e responsável. Nem todos cientistas são.

O que Rostand contestou não foi, portanto, a ciência em si, mas o uso inadequado que se possa fazer ou se faça dela. Determinados conhecimentos, que em mãos corretas tendem a ser providenciais fontes de progresso e bem-estar, nas erradas podem ser causas de males sem limites, de tragédias e de fontes de destruição e morte. Basta atentar, por exemplo, para o que ocorreu (e vem ocorrendo) em relação às pesquisas sobre vírus e bactérias, que começaram há pouco mais de um século e que já trouxeram tantos e tamanhos avanços para a Medicina. As descobertas de abnegados (e ignorados do grande público) pesquisadores praticamente dobraram nossa expectativa de vida. Por que? Porque eles descobriram formas eficientes e rápidas de combater doenças, que hoje são relativamente de fácil cura, mas que há apenas algumas décadas eram incuráveis e letais, por serem desconhecidos os agentes patogênicos que as causavam.

Graças a esses cientistas, hoje é possível prevenir epidemias e, principalmente pandemias, como a de peste negra, por exemplo, que no século XIV por muito pouco não eliminou nossa espécie da face da Terra. Infelizmente, porém, o dramaturgo irlandês George Bernard Shaw, ganhador de um Prêmio Nobel de Literatura, estava coberto de razão ao afirmar que “a ciência nunca resolve um problema sem criar pelo menos outros dez”. E qual o principal que criou ao dotar a humanidade do conhecimento sobre vírus e bactérias? Ocorre que, por razões que nunca entenderei e com as quais jamais concordarei, determinada parcela de cientistas, a serviço de políticos, vem utilizando essas descobertas que já salvaram tantas vidas, para eliminar milhares, milhões, bilhões de outras. Refiro-me aos que desenvolveram, e se empenham em “aperfeiçoar”, as chamadas armas biológicas. Ou seja, em utilizar o que se conhece sobre vírus e bactérias não para erradicar doenças ainda não erradicadas, mas para tornar esses agentes patogênicos indestrutíveis e fazer deles instrumentos de eliminação de adversários (ou inimigos como queiram) políticos.

Como se vê, Jean Rostand não exagerou ao constatar que “a ciência fez de nós deuses antes mesmo de merecermos ser homens”. O que já se fez para o desenvolvimento de armas biológicas é possível, apenas, se especular. Afinal, tudo o que se refira a equipamentos bélicos de qualquer natureza é rigorosamente secreto, a pretexto do que é chamado, eufemisticamente, de “segurança nacional”. Temos que confiar nessas pessoas que se utilizam de um conhecimento potencialmente tão útil à humanidade para algo tão terrível e vil! Mas como?! Não só não confio nessa gente, como temo suas artimanhas. Quem me garante que, digamos, acidentalmente, eles não possam deflagrar alguma pandemia incontrolável que nos elimine a todos ou a boa parte de nós?

Leio o seguinte, na enciclopédia eletrônica Wikipédia, que multiplica por um bilhão meu temor e minha preocupação:  “As pesquisas em curso visam a desenvolver organismos causadores de doenças como peste e varíola, e que sejam resistentes a vacinas e antibióticos atualmente conhecidos. Não é fácil, porém, lidar com organismos vivos, mormente se deverão, ao serem dispersos, resistir aos efeitos combinados do vento, chuva e radiação solar. Quando esses problemas técnicos estiverem solucionados – o que será bastante provável, com as intensas pesquisas em realização – a ameaça de guerra bacteriológica se tornará bem real, tanto mais que a fabricação poderá ser feita por equipes pequenas de microbiologistas e engenheiros, ao alcance até dos países mais pobres”.

Já imaginaram se essas armas biológicas caírem em mãos de terroristas, de lunáticos ensandecidos,  de fanáticos que não dão o mínimo valor à própria vida, quanto mais às dos outros?! E não digam que se trata de paranóia, de algo improvável ou impossível de acontecer, pois não é. Até porque, como observou o cientista e escritor Isaac Asimov, “o aspecto mais triste da vida de hoje é que a ciência ganha em conhecimento mais rapidamente que a sociedade em sabedoria”.

A Bíblia, numa das mais maravilhosas alegorias (que muitos interpretam ao pé da letra), trata dessa questão. Diz: “Tinha também o senhor Deus feito nascer da terra  todas as castas de árvores agradáveis à vista, cujo fruto era gostoso ao paladar; e a árvore da vida no meio do Paraíso...” O primeiro casal tinha acesso a todas essas guloseimas, nutritivas e energizantes. Apenas não podia comer uma (uma única entre milhões de espécies) dessas dádivas divinas. Era algo que tornaria nossos primitivos ancestrais e toda sua descendência (nós, inclusive) sábios, é verdade, todavia... infelizes. Tratava-se do fruto da árvore da ciência do bem e do mal. No entanto... o homem e a mulher primitivos... comeram o único fruto que lhes fora proibido. Deu no que deu!


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