Tuesday, March 17, 2015

Guerra beneficia coalizão



Pedro J. Bondaczuk


A aventura de Saddam Hussein, de invadir e anexar o Kuwait, além de trazer saldos políticos para a maioria dos líderes da coalizão militar liderada pelos Estados Unidos, favoreceu sobremaneira a vários países do Oriente Médio e principalmente do Golfo Pérsico.

Israel, por exemplo, teve premiada a sua postura exemplar, ao não revidar aos ataques sucessivos do Iraque com mísseis Scud B a seu território, com uma ajuda sem precedentes, tanto dos Estados Unidos, quanto da Europa Ocidental. Além disso, conquistou as simpatias até de notórios adversários, pela sua elogiável moderação. 

O presidente iraquiano, ao atacar o Estado judeu, contava com uma pronta e decisiva reação. Aliás, este era o ponto fundamental de sua estratégia de distorcer os objetivos da guerra, buscando atrair para o seu lado seus irmãos árabes, que pegaram em armas contra Bagdá.

Ao pretender transformar a invasão do Kuwait num trunfo que lhe permitisse barganhar os territórios ocupados, Saddam mais prejudicou, do que eventualmente beneficiou, a causa palestina. Os saldos políticos que ele pretendeu colher acabaram ficando todos para Israel.

Outro Estado que obteve vantagens com a crise foi o Egito, que acabou tendo uma asfixiante dívida externa, de US$ 8 bilhões, virtualmente perdoada. Não bastasse isso, que já se constituiu num lucro extraordinário, obteve ajuda financeira de várias partes do mundo, a pretexto de haver sido um dos países mais prejudicados pela guerra, principalmente com o retorno de milhares de egípcios que prestavam serviços no Kuwait e que tiveram que voltar para casa. Além disso, o presidente Hosni Mubarak assumiu a virtual liderança do mundo árabe, tornando-se o “interlocutor confiável” que tanto o Ocidente buscava na região.

A Síria, por seu turno, só obteve vantagens e nenhum ônus com a crise. De repente, livrou-se do incômodo rótulo que lhe tinha sido colocado pelos integrantes do Grupo dos Sete, em 1988, de Estado promotor do terrorismo. Viu suas relações diplomáticas serem reatadas com os principais países da Europa Ocidental e teve uma aproximação inédita com os Estados Unidos.

Hoje, qualquer solução para o conflito que envolve há mais de quatro décadas o Oriente Médio passa, necessariamente, por Damasco, pela aprovação ou não do presidente Hafez Assad. Para completar tudo, a facção do Partido Socialista Árabe Baath, que governa esse país, saiu fortalecida diante do fiasco da sua rival do Iraque.

A Arábia Saudita, por seu turno, ganhou credibilidade na região. Perdeu a incômoda imagem de oportunista que possuía entre os seus pares, a de lucrar com todos os conflitos regionais sem se envolver diretamente neles. Não somente cedeu seu território à coalizão, para que montasse ali toda a base da operação militar Tempestade do Deserto, como participou diretamente da luta, com resultados expressivos.

Os demais emirados do Golfo tiveram seu batismo de fogo nos campos de batalha, perdendo, de vez, o medo de envolvimento num confronto direto com o poderoso e temível vizinho, depois de uma participação algumas vezes até brilhante na reconquista do Kuwait.       

(Artigo publicado na página 16, Internacional, do Correio Popular, em 3 de maio de 1991)


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