Criação de feras
Pedro J. Bondaczuk
O
terrorismo é uma rara arma de ação política dos desesperados e, de acordo com
um estudo divulgado nesta semana, feito por psicólogos e sociólogos, apresenta
duas grandes vertentes. A primeira é a dos anarquistas, que se opõem a qualquer
tipo de sociedade organizada e desejam destruir as estruturas sociais
existentes.
Esse
grupo teve grande atuação no passado, notadamente da parte dos niilistas
espanhóis e seus congêneres russos, do período czarista. O assassinato do czar
Alexandre II, em 1º de março de 1881, cometido por Ignaty Grinevitsky que,
portando uma bomba, cometeu um atentado-suicida, segurando o artefato explosivo
nas mãos, para que não explodisse em lugar errado, é um desses inúmeros
exemplos.
Outro
é o da morte do presidente norte-americano William McKinley, atingido, a bala,
pelo terrorista Leon Czolgosz, em 6 de setembro de 1901 e que veio a falecer,
em conseqüência dos ferimentos recebidos, oito dias depois.
Como
se vê, o terrorismo está longe de ser um fenômeno recente. Podem ser
classificadas na categoria dos anarquistas as mortes de Mahatma Gandhi, na Índia,
e do arquiduque da Áustria, Francisco Ferdinando, na Bósnia. Seus respectivos
matadores, Nathuram Godse e Gavrilo Princip eram notórios niilistas.
A
segunda categoria dos terroristas é a dos que lutam por uma pátria. São os
casos de grupos como a OLP, o IRA, o ETA e outros menos conhecidos. Estes,
geralmente, atacam, apenas, objetivos dos países que desejam atingir
diretamente, embora, não raro, atinjam, também, pessoas inocentes, que nada têm
a ver com política.
A
ser verdadeira (e não há motivos para duvidar da veracidade) a reportagem
publicada, ontem, pelo jornal norte-americano “Los Angeles Times”, foi com esse
tipo de terroristas que os governos da França e da Itália teriam estabelecido
um “pacto de não-agressão” na década de 70.
Negociar
acordos dessa espécie, entretanto, é o mesmo que confiar numa serpente
venenosa, que tenhamos criado em casa, com o máximo de desvelo e de carinho.
Nem por isso podemos (ou devemos) esperar qualquer espécie de lealdade do
ofídio. Mesmo que inicialmente não nos ataque, não podemos, jamais, confiar que
nunca nos atacará. Um dia, até por questão de instinto natural, acabaremos
picados e envenenados pela cobra de estimação. O ataque faz parte da sua
natureza.
É
mais ou menos isso que vem ocorrendo com franceses e italianos em relação a
líbios e palestinos. Se o pacto (que teria sido selado na década de 70)
realmente existiu, foi para o espaço, com o seqüestro do transatlântico
italiano Achile Lauro, em outubro do ano passado. Teve o atestado de óbito
assinado com o julgamento, condenação e prisão dos autores dessa ação
terrorista. E foi solenemente sepultado, principalmente, com o ataque ao
Aeroporto Leonardo da Vinci, em 27 de dezembro de 1985, feito, simultaneamente,
a um outro, em Schwehart, na Áustria. Isso, em relação à Itália.
Quanto
à França, muitas das várias explosões registradas nos últimos dias, em Paris,
foram atribuídas aos palestinos. E esses ataques mostram que o instinto do
terrorista sobrepuja algum eventual sentimento de honra no cumprimento da
palavra empenhada. É a cobra de estimação atacando o criador.
É
claro que denúncias dessa espécie são virtualmente impossíveis de se comprovar,
principalmente passados tantos anos da suposta ocorrência. Mas se os acordos
realmente existiram, constituíram-se na mais grosseira e estúpida
irresponsabilidade de quem os firmou.
A
impunidade e a vista grossa aos atos criminosos alimentaram de sangue as feras.
Permitiram que os monstros ficassem ainda mais perigosos e letais e
desenvolvessem diversas cabeças, como a mitológica Hidra de Lerna. E
determinaram, por conseqüência, que as monstruosas criaturas se voltassem,
finalmente, contra os protetores.
(Artigo
publicado na página 9, Internacional, do Correio Popular, em 5 de abril de
1986)
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