Saturday, March 07, 2015

Encontro das Américas



Pedro J. Bondaczuk


As três Américas, representadas por 19 de seus presidentes (que por seu turno governam cerca de 700 milhões de pessoas), realizam, hoje e amanhã, uma rara reunião de cúpula, em San José, na Costa Rica, para debater alguns de seus mais angustiantes problemas, embora o pretexto para o encontro não seja este.

O motivo oficial é a comemoração do centenário da democracia no país anfitrião. Isso não quer dizer que no correr de um século inteiro, de forma contínua, essa sociedade nacional centro-americana não conheceu ditaduras. Pelo contrário, teve até mesmo uma dura guerra civil, na década de 1930.

Seu povo soube, contudo, promover a pacificação nacional e em 1949 tomou uma decisão no mínimo audaciosa: dissolveu suas Forças Armadas. Desde então, a Costa Rica entrou, de fato, num período ininterrupto de democracia.

Os temas que serão debatidos em San José são óbvios. Ou, pelo menos, três deles, por sinal os mais angustiantes, o são: o narcotráfico, que ameaça não apenas as três Américas, como virtualmente o mundo inteiro na atualidade; a dívida externa e a restauração democrática em muitos dos países da região.

Com a realização de eleições presidenciais no Chile, em 14 de dezembro próximo, e na Nicarágua, em fevereiro de 1990, poucos países vão permanecer sob regimes tirânicos no hemisfério. Na América do Sul, por exemplo, não haverá mais nenhum presidente que não tenha sido eleito diretamente, o que não deixa de ser um fato raro, numa zona mundial caracterizada por caudilhos e caudilhismos.

Na América Central, restará apenas o Panamá, que não consegue se livrar, de forma alguma, do seu homem forte, o general Manuel Antonio Noriega, sob estado de exceção. Quanto ao Caribe, há o eternamente problemático Haiti, cujo ditador de plantão, general Prosper Avril, no entanto, assegurou que ainda no próximo ano irá devolver o poder aos civis. Além de Cuba, naturalmente, onde Fidel Castro nem admite que sequer se cogite em falar de sua substituição.

Alguns encontros interessantes serão possíveis, nesta oportunidade. Como o dos presidentes George Bush e Daniel Ortega, por exemplo. O chefe da Casa Branca disse, ontem, que o seu relacionamento com o dirigente sandinista é “tenso”. E nem precisava dizer isto. Mas é melhor do que o do seu antecessor, Ronald Reagan, que preferia ver o demônio, do que cruzar com o presidente nicaragüense.

Um diálogo, mesmo que revestido de tensões, sempre é válido, melhor do que nenhum, e pode operar milagres. Quem sabe possa perder sua característica meramente festiva e originar soluções criativas para os gravíssimos problemas hemisféricos. Uma só que surja, por menor que seja, não deixará de ser um enorme lucro.

(Artigo publicado na página 15, Internacional, do Correio Popular, em 27 de outubro de 1989).


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