Saturday, October 19, 2013

Primor de inoportunidade


Pedro J. Bondaczuk


As explosões, verificadas anteontem à noite, na parte velha da cidade de Jerusalém, junto ao célebre Muro das Lamentações, onde se realizava uma cerimônia envolvendo novos recrutas israelenses, representa um recrudescimento da violência no Oriente Médio. Significa um retorno à tática palestina de atuação mediante o terrorismo, num momento em que se discute muito acerca de uma conferência internacional visando encontrar uma solução de compromisso que leve, finalmente, um pouco de paz para essa turbulenta região.

É uma resposta dos radicais às tentativas da Jordânia de entregar a representação do povo da Palestina a políticos moderados, que aceitam negociar com o Estado judeu e não descartam a tese da criação de uma comunidade nacional semi-independente, ligada a Israel.

Atos extremistas, é evidente, são sempre inoportunos, na medida que atingem, em geral, pessoas inocentes, que nada têm a ver com as questões que motivam essa forma estúpida de protesto. Mas o de anteontem, excedeu a tudo o que se podia esperar em inoportunidade, e por inúmeras razões.

A primeira delas é que o novo primeiro-ministro israelense, Yitzhak Shamir, ao contrário do seu antecessor, Shimon Peres, não morre de amores por essa idéia de negociação com a comunidade árabe. Principalmente se ela envolver países que não têm interesses diretos na região, como é o caso da União Soviética, que vem tentando, de todas as formas, ser admitida como interlocutora numa eventual conferência sobre a questão palestina.

Ele acredita que qualquer transação a esse respeito poderia vir a enfraquecer Israel, que conta com poderio militar suficiente para garantir a manutenção do status quo sem maiores sobressaltos. Ações como a praticada anteontem podem dar razão às teses de Bloco Likud, da necessidade de uma presença permanente e mais vigorosa do exército israelense no Sul do Líbano, para garantir a proteção da fronteira norte judia.

Todos sabem, de sobejo, qual a tática de Tel Aviv para combater o terrorismo. Ela equivale a uma espécie de “Pena de Talião”, a do “olho por olho e dente por dente”. Ou seja, a de devolver na mesma moeda as agressões sofridas, buscando punir os autores de atentados onde quer que eles se escondam.

Foi assim que Israel agiu, por exemplo, em outubro do ano passado, após três cidadãos judeus terem sido assassinados por pale4stinos no porto de Larnaca, no Chipre. Os caças israelenses atravessaram metade da África, por ar, numa distância tão grande que seus aviões precisaram de reabastecimento em pleno vôo. E retaliaram com dureza a OLP, arrasando seus escritórios na distante Tunis, na Tunísia, bem no norte do continente africano.   

O revide pelo atentado de anteontem também não se fez esperar. Acampamentos palestinos nos arredores de Saída foram severamente bombardeados ontem e ficou implícito que a punição não deverá parar por aí. O difícil vai ser saber qual organização palestina foi, de fato, a responsável pelas explosões no Muro das Lamentações.

Três grupos diferentes, inclusive adversários entre si, assumiram a autoria do atentado. Aliás, esta parece ser a nova tática terrorista na atual temporada. Todos os casos verificados desde agosto, como o seqüestro do Boeing da Pan Am, em Karachi; o massacre na sinagoga Neve Shalom, em Istambul e a onda extremista que sacudiu, recentemente, Paris tiveram esse tipo de estratégia. Todos foram auto-atribuídos a duas ou mais organizações.

As explosões no Muro das Lamentações poderão, portanto, anular todos os ingentes esforços diplomáticos desenvolvidos por Shimon Peres, especialmente no corrente ano, visando uma solução negociada e ampla para o Oriente Médio.

Uma ofensiva terrorista, neste momento sumamente complicado, tenderá, somente, a prolongar uma agonia que já dura quase quatro décadas e que, pela marcha dos acontecimentos, deverá manter a região ainda por muito tempo como o principal foco de tensões neste sumamente tenso e perigoso quarto final de milênio.
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(Artigo publicado na página 9, Internacional, do Correio Popular, em 17 de outubro de 1986).


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