Primor
de inoportunidade
Pedro J. Bondaczuk
As explosões, verificadas anteontem à noite, na parte
velha da cidade de Jerusalém, junto ao célebre Muro das Lamentações, onde se
realizava uma cerimônia envolvendo novos recrutas israelenses, representa um recrudescimento
da violência no Oriente Médio. Significa um retorno à tática palestina de
atuação mediante o terrorismo, num momento em que se discute muito acerca de
uma conferência internacional visando encontrar uma solução de compromisso que
leve, finalmente, um pouco de paz para essa turbulenta região.
É uma resposta dos radicais às tentativas da Jordânia de
entregar a representação do povo da Palestina a políticos moderados, que
aceitam negociar com o Estado judeu e não descartam a tese da criação de uma
comunidade nacional semi-independente, ligada a Israel.
Atos extremistas, é evidente, são sempre inoportunos, na
medida que atingem, em geral, pessoas inocentes, que nada têm a ver com as
questões que motivam essa forma estúpida de protesto. Mas o de anteontem,
excedeu a tudo o que se podia esperar em inoportunidade, e por inúmeras razões.
A primeira delas é que o novo primeiro-ministro
israelense, Yitzhak Shamir, ao contrário do seu antecessor, Shimon Peres, não
morre de amores por essa idéia de negociação com a comunidade árabe.
Principalmente se ela envolver países que não têm interesses diretos na região,
como é o caso da União Soviética, que vem tentando, de todas as formas, ser
admitida como interlocutora numa eventual conferência sobre a questão palestina.
Ele acredita que qualquer transação a esse respeito
poderia vir a enfraquecer Israel, que conta com poderio militar suficiente para
garantir a manutenção do status quo sem maiores sobressaltos. Ações como a
praticada anteontem podem dar razão às teses de Bloco Likud, da necessidade de
uma presença permanente e mais vigorosa do exército israelense no Sul do
Líbano, para garantir a proteção da fronteira norte judia.
Todos sabem, de sobejo, qual a tática de Tel Aviv
para combater o terrorismo. Ela equivale a uma espécie de “Pena de Talião”, a
do “olho por olho e dente por dente”. Ou seja, a de devolver na mesma moeda as
agressões sofridas, buscando punir os autores de atentados onde quer que eles
se escondam.
Foi assim que Israel agiu, por exemplo, em outubro
do ano passado, após três cidadãos judeus terem sido assassinados por
pale4stinos no porto de Larnaca, no Chipre. Os caças israelenses atravessaram
metade da África, por ar, numa distância tão grande que seus aviões precisaram
de reabastecimento em pleno vôo. E retaliaram com dureza a OLP, arrasando seus
escritórios na distante Tunis, na Tunísia, bem no norte do continente africano.
O revide pelo atentado de anteontem também não se
fez esperar. Acampamentos palestinos nos arredores de Saída foram severamente
bombardeados ontem e ficou implícito que a punição não deverá parar por aí. O
difícil vai ser saber qual organização palestina foi, de fato, a responsável
pelas explosões no Muro das Lamentações.
Três grupos diferentes, inclusive adversários entre
si, assumiram a autoria do atentado. Aliás, esta parece ser a nova tática
terrorista na atual temporada. Todos os casos verificados desde agosto, como o
seqüestro do Boeing da Pan Am, em Karachi; o massacre na sinagoga Neve Shalom,
em Istambul e a onda extremista que sacudiu, recentemente, Paris tiveram esse
tipo de estratégia. Todos foram auto-atribuídos a duas ou mais organizações.
As explosões no Muro das Lamentações poderão,
portanto, anular todos os ingentes esforços diplomáticos desenvolvidos por
Shimon Peres, especialmente no corrente ano, visando uma solução negociada e
ampla para o Oriente Médio.
Uma ofensiva terrorista, neste momento sumamente
complicado, tenderá, somente, a prolongar uma agonia que já dura quase quatro
décadas e que, pela marcha dos acontecimentos, deverá manter a região ainda por
muito tempo como o principal foco de tensões neste sumamente tenso e perigoso
quarto final de milênio.
.
(Artigo publicado na
página 9, Internacional, do Correio Popular, em 17 de outubro de 1986).
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