É
preciso respeitar as leis
Pedro J. Bondaczuk
A
história da Coréia tem sido das mais acidentadas desde o seu início, em 1200
AC, quando o nobre chinês, Ki-tze, fundou uma colônia em Pyongyang (atual
capital norte-coreana), aglutinando tribos dispersas da Península, num esboço
de sociedade nacional. Modernamente, porém, ela começou apenas há 39 anos, com
o fim da Segunda Guerra Mundial e com a realidade de um país dividido por uma
questão meramente ideológica.
A
parte do Sul, que escapou de cair sob o domínio marxista, graças à intervenção
norte-americana, não se diferenciou muito da sua co-irmã, em termos
institucionais. A rigor, seu povo nunca teve a oportunidade real de escolher
seus governantes livremente, sem fraudes e nem golpes de toda a espécie, tanto
os disfarçados (chamados eufemisticamente de "brancos"), quanto os
ostensivos, clássicos e tradicionais no Terceiro Mundo.
Hoje,
os sul-coreanos têm a oportunidade de começar a reverter esse processo. Uma
nova Constituição, a terceira de quase quatro décadas, está sendo submetida à
população, em plebiscito nacional, fruto de um acordo entre os parlamentares
(governistas e de oposição), que vai permitir, caso aprovada, a realização de
eleições presidenciais diretas em 20 de dezembro próximo.
O
problema da Coréia do Sul nunca foi a inexistência de uma Carta Magna, mas sim
a facilidade com que as anteriores foram modificadas, ao sabor das
conveniências dos ditadores de plantão. O texto constitucional que está em
vigor, por exemplo, é de 1980. Durou, pois, irrisórios sete anos, o suficiente
para dar um toque de legalidade às pretensões caudilhescas do general Choo-Doo
Hwan, o atual presidente.
A
anterior, quando foi abolida, estava em frangalhos. Havia se transformado numa
caricata "colcha de retalhos", tamanhas e tantas foram as emendas que
comportou. E as modificações ocorreram pelos motivos mais fúteis possíveis. Em
1969, por exemplo, emendou-se a Carta Magna para permitir que um mesmo
governante pudesse postular três mandatos consecutivos de cinco anos.
Três
lustros de poder são mais do que suficientes (ainda mais quando tais períodos
de governo são obtidos fraudulentamente) para que o caudilho que os obtém dessa
forma considere a coisa pública (este é o significado da palavra latina
"res publica") como algo seu, pessoal.
O
problema no mundo, e em especial em sociedades sem grande tradição de
legalidade, não é a inexistência de leis. É o não cumprimento das que existem.
Esse exemplo parte, em geral, das altas esferas e contamina, como uma infecção,
todo o organismo nacional, que fica podre, corrupto, intoxicado e muito
"doente".
Que
os políticos sul-coreanos, portanto, respeitem o veredito do povo e deixem,
doravante, de legislar em causa própria. Só assim a democracia irá brotar
saudável, forte, resistente e com caráter de permanência nesse país e
conseguirá sobreviver à praga dos golpismos (ostensivos ou disfarçados).
(Artigo
publicado na página 14, Internacional, do Correio Popular, em 27 de outubro de
1987).
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