Como e quando opinar?
Pedro
J. Bondaczuk
Os seis primeiros meses
deste ano de 2013 têm se revelado tensos, incertos, inseguros, com uma série de
acontecimentos que podem, ou não, ter conseqüências futuras e até determinar
novos rumos para alguns povos, se não para a humanidade. Assunto para ser
comentado é que não falta. O que falta, isto sim, é tempo para a sua análise,
para que se possa emitir opiniões sensatas, equilibradas e, sobretudo,
responsáveis, que se baseiem exclusivamente em fatos e não em meras evidências,
em aparências, em boatos, em fofocas, em diz-que-diz-ques e em situações
ambíguas e obscuras que nos levem a conclusões equivocadas.
A tarefa do escritor é
bem diversa da do jornalista. Sua visão dos acontecimentos e as conclusões que
elas suscitam tendem a durar, não raro muito além da sua morte. Caso sejam
corretas, consagradas pelas conseqüências que previu, pode ser considerado,
até, como “gênio” pelas gerações futuras. Notem que afirmei que “pode” e não
que “vai ser”. Por que? Porque corremos o risco de sermos completamente
esquecidos e da nossa obra literária se perder por completo, sepultando, de
vez, nossa memória, como se nunca tivéssemos existido e jamais produzido coisa
alguma, quer no terreno concreto, quer (e principalmente) no instável e
inseguro terreno das idéias.
Já as opiniões do
jornalista podem (ou não podem) gerar efeitos imediatos. Todavia, uma semana
depois (ou, quem sabe na tarde do mesmo dia em que seu texto foi estampado no
jornal ou na revista) tende a ser esquecido até pelo mais atento dos seus
leitores. Ele opina no calor dos acontecimentos, pois o veículo de que se
utiliza prima por novidades, e sua probabilidade de equívoco é muitíssimo
maior. Isso não quer dizer que o escritor, com todo o tempo do mundo para
analisar ponto por ponto dos fatos antes de opinar não esteja sujeito a erro.
Sempre estará.
Dependerá, para ter
possibilidades mais amplas de acerto, do volume e exatidão de informações que
conseguir colher, do seu preparo intelectual, da capacidade de observação e de
análise, da sinceridade de propósito, da condição de se manter o mais neutro
possível (pois neutralidade absoluta é mera ficção, é conto da carochinha) e
vai por aí afora. E mesmo que seja excelente em tudo isso, não está e não estará
nunca a salvo de errar, embora seja provável que erre muito menos do que o
jornalista, por razões lógicas e até óbvias.
Por exemplo, no início
deste 2013, quem, em sã consciência, sequer cogitava da possibilidade do papa
Bento XVI renunciar ao comando da Igreja Católica e se retirar para meditar
sobre os rumos do catolicismo e do mundo? Por maior que fosse a capacidade de
previsão de alguém, baseado ou em seu misticismo, ou em extrapolações de fatos,
ou na intuição, ou em outro fator qualquer caso este exista, em janeiro deste
ano quem sequer cogitou, mesmo que remotamente, dando asas a delirante
fantasia, esta possibilidade? No entanto... aconteceu. E esta renúncia pode, ou
não, trazer conseqüências para essa milenar denominação religiosa. Quais? Ainda
estão no terreno instável das especulações.
Desde a manhã de 11 de
fevereiro de 2013, quando a decisão de Bento XVI foi confirmada e que se
materializou dezessete dias depois (em 28 de fevereiro, às 20 horas)
jornalistas de todas as crenças e tendências ideológicas, das mais diversas
partes do mundo, opinaram, opinaram e opinaram, tentando analisar as causas
dessa atitude e extrapolar no que iriam (ou irão) resultar. Já os escritores...
A imensa maioria ainda analisa esse fato, que já se tornou velhíssimo para os
padrões jornalísticos, para decidir se vai ou não emitir opinião a propósito e
de que forma será emitida: se em alentado ensaio, se na ficção colocando-a na
boca de personagens ou se... sequer mencionará o assunto em nenhum de seus
textos.
Citei esse caso meio
que aleatoriamente, mas não é o único acontecimento dramático de 2013 que pode,
ou não, gerar conseqüências para os envolvidos e até para o mundo. Poderia
citar, por exemplo, a guerra civil na Síria. Ou as eleições presidenciais na
Venezuela ou no Irã. Ou os protestos na Turquia. Ou, para trazer as coisas para
mais perto de nós, a onda de manifestações que varre o Brasil, a imensa maioria
das quais tem redundado em conflitos, em confrontos com a polícia, em
vandalismo e em saques. Que conseqüências tudo isso trará? Jornalistas,
diariamente, fazem suas extrapolações, com probabilidades variáveis de acerto.
Já os escritores... Os mais sensatos e preocupados com a imagem (a própria e a
do País) analisam atenta e cautelosamente as informações disponíveis e
esperam,o fim dos protestos, para só então tentarem entender o que ocorreu (e
ainda está ocorrendo) e no que tudo isso deu ou pode dar.
Um amigo mais afoito,
desses apaixonados que dizem tudo o que pensam, sem se deter na mais elementar
análise antes de falar, movido, apenas, pelas chamas dos acontecimentos, fez,
outro dia, uma observação que, a princípio, julguei tola (embora não lhe
tivesse dito), mas sobre a qual estou refletindo (posto que ainda a considere
pueril e despropositada). Disse que as pessoas erraram na interpretação da
suposta profecia maia, de que o mundo iria acabar em 21 de dezembro de 2012.
Para ele, o que esse povo pré-colombiano previu foi o fim de uma era e o início
de outra. E que os acontecimentos destes dramáticos seis meses de 2013 seriam a
prova disso.
Minha primeira reação
foi a de dizer-lhe: “tolice!!!”. E de, na sequência, demonstrar-lhe a não
procedência de sua infantil opinião. Reitero, não fiz nada disso. Calei-me e
fiquei matutando com meus botões: “seria tolice mesmo? E se não for?” Embora não tenha mudado em nada minha
convicção a propósito, abri na mente um espaço para a saudável dúvida. O
ceticismo, na medida certa, é manifestação de prudência. Afinal, como constatou
o genial William Shakespeare, através de um de seu tantos personagens: “há mais
mistérios entre o céu e a terra do que sonha nossa vã filosofia”. E não
há?!!!
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