Saturday, October 26, 2013

Como e quando opinar?

Pedro J. Bondaczuk

Os seis primeiros meses deste ano de 2013 têm se revelado tensos, incertos, inseguros, com uma série de acontecimentos que podem, ou não, ter conseqüências futuras e até determinar novos rumos para alguns povos, se não para a humanidade. Assunto para ser comentado é que não falta. O que falta, isto sim, é tempo para a sua análise, para que se possa emitir opiniões sensatas, equilibradas e, sobretudo, responsáveis, que se baseiem exclusivamente em fatos e não em meras evidências, em aparências, em boatos, em fofocas, em diz-que-diz-ques e em situações ambíguas e obscuras que nos levem a conclusões equivocadas.

A tarefa do escritor é bem diversa da do jornalista. Sua visão dos acontecimentos e as conclusões que elas suscitam tendem a durar, não raro muito além da sua morte. Caso sejam corretas, consagradas pelas conseqüências que previu, pode ser considerado, até, como “gênio” pelas gerações futuras. Notem que afirmei que “pode” e não que “vai ser”. Por que? Porque corremos o risco de sermos completamente esquecidos e da nossa obra literária se perder por completo, sepultando, de vez, nossa memória, como se nunca tivéssemos existido e jamais produzido coisa alguma, quer no terreno concreto, quer (e principalmente) no instável e inseguro terreno das idéias.

Já as opiniões do jornalista podem (ou não podem) gerar efeitos imediatos. Todavia, uma semana depois (ou, quem sabe na tarde do mesmo dia em que seu texto foi estampado no jornal ou na revista) tende a ser esquecido até pelo mais atento dos seus leitores. Ele opina no calor dos acontecimentos, pois o veículo de que se utiliza prima por novidades, e sua probabilidade de equívoco é muitíssimo maior. Isso não quer dizer que o escritor, com todo o tempo do mundo para analisar ponto por ponto dos fatos antes de opinar não esteja sujeito a erro. Sempre estará.

Dependerá, para ter possibilidades mais amplas de acerto, do volume e exatidão de informações que conseguir colher, do seu preparo intelectual, da capacidade de observação e de análise, da sinceridade de propósito, da condição de se manter o mais neutro possível (pois neutralidade absoluta é mera ficção, é conto da carochinha) e vai por aí afora. E mesmo que seja excelente em tudo isso, não está e não estará nunca a salvo de errar, embora seja provável que erre muito menos do que o jornalista, por razões lógicas e até óbvias.   

Por exemplo, no início deste 2013, quem, em sã consciência, sequer cogitava da possibilidade do papa Bento XVI renunciar ao comando da Igreja Católica e se retirar para meditar sobre os rumos do catolicismo e do mundo? Por maior que fosse a capacidade de previsão de alguém, baseado ou em seu misticismo, ou em extrapolações de fatos, ou na intuição, ou em outro fator qualquer caso este exista, em janeiro deste ano quem sequer cogitou, mesmo que remotamente, dando asas a delirante fantasia, esta possibilidade? No entanto... aconteceu. E esta renúncia pode, ou não, trazer conseqüências para essa milenar denominação religiosa. Quais? Ainda estão no terreno instável das especulações.

Desde a manhã de 11 de fevereiro de 2013, quando a decisão de Bento XVI foi confirmada e que se materializou dezessete dias depois (em 28 de fevereiro, às 20 horas) jornalistas de todas as crenças e tendências ideológicas, das mais diversas partes do mundo, opinaram, opinaram e opinaram, tentando analisar as causas dessa atitude e extrapolar no que iriam (ou irão) resultar. Já os escritores... A imensa maioria ainda analisa esse fato, que já se tornou velhíssimo para os padrões jornalísticos, para decidir se vai ou não emitir opinião a propósito e de que forma será emitida: se em alentado ensaio, se na ficção colocando-a na boca de personagens ou se... sequer mencionará o assunto em nenhum de seus textos.

Citei esse caso meio que aleatoriamente, mas não é o único acontecimento dramático de 2013 que pode, ou não, gerar conseqüências para os envolvidos e até para o mundo. Poderia citar, por exemplo, a guerra civil na Síria. Ou as eleições presidenciais na Venezuela ou no Irã. Ou os protestos na Turquia. Ou, para trazer as coisas para mais perto de nós, a onda de manifestações que varre o Brasil, a imensa maioria das quais tem redundado em conflitos, em confrontos com a polícia, em vandalismo e em saques. Que conseqüências tudo isso trará? Jornalistas, diariamente, fazem suas extrapolações, com probabilidades variáveis de acerto. Já os escritores... Os mais sensatos e preocupados com a imagem (a própria e a do País) analisam atenta e cautelosamente as informações disponíveis e esperam,o fim dos protestos, para só então tentarem entender o que ocorreu (e ainda está ocorrendo) e no que tudo isso deu ou pode dar.

Um amigo mais afoito, desses apaixonados que dizem tudo o que pensam, sem se deter na mais elementar análise antes de falar, movido, apenas, pelas chamas dos acontecimentos, fez, outro dia, uma observação que, a princípio, julguei tola (embora não lhe tivesse dito), mas sobre a qual estou refletindo (posto que ainda a considere pueril e despropositada). Disse que as pessoas erraram na interpretação da suposta profecia maia, de que o mundo iria acabar em 21 de dezembro de 2012. Para ele, o que esse povo pré-colombiano previu foi o fim de uma era e o início de outra. E que os acontecimentos destes dramáticos seis meses de 2013 seriam a prova disso.

Minha primeira reação foi a de dizer-lhe: “tolice!!!”. E de, na sequência, demonstrar-lhe a não procedência de sua infantil opinião. Reitero, não fiz nada disso. Calei-me e fiquei matutando com meus botões: “seria tolice mesmo? E se não for?”  Embora não tenha mudado em nada minha convicção a propósito, abri na mente um espaço para a saudável dúvida. O ceticismo, na medida certa, é manifestação de prudência. Afinal, como constatou o genial William Shakespeare, através de um de seu tantos personagens: “há mais mistérios entre o céu e a terra do que sonha nossa vã filosofia”. E não há?!!! 


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