Thursday, October 17, 2013

Eleitores indianos têm chance de se redimir


Pedro J. Bondaczuk


Os eleitores e políticos da Índia têm, hoje e sábado, uma nova oportunidade de se redimir diante da opinião pública internacional, depois da imagem do país, como sociedade democrática, ter ficado seriamente comprometida com a violência registrada no primeiro turno eleitoral que culminou com o assassinato do ex-primeiro-ministro Rajiv Gandhi, no dia 21 passado.

Milhões de cidadãos vão às urnas, nas duas etapas das eleições legislativas que ainda restam, para compor o novo Congresso e dele ser extraído o futuro governo. Quem obtiver esse mandato precisará se imbuir da responsabilidade de desarmar os espíritos, fazendo uma política com "p" maiúsculo, voltada para todos os indianos, sem protecionismos ou exclusivismos.

Nem seria necessário destacar o desafio que significa governar 850 milhões de seres humanos, numa sociedade com estruturas arcaicas e excludentes, que ainda separa os indivíduos por castas fechadas.

Eleições na Índia seriam notícia mesmo sem violências, pois não é todo dia que 514 milhões de eleitores são convocados a manifestar a sua opinião. Ocorre que muita gente ainda não entendeu, e esta é uma questão de cultura, que a manifestação de vontade, através do voto, deve ser absolutamente livre, sem coações nem aliciamentos ilegais. Só assim um governo que emerge das urnas é lícito e realmente representativo. É fruto da vontade da maioria.

Ao observador político, as eleições indianas desta semana despertam o interesse por uma série de razões. Uma, por exemplo, é quanto à performance eleitoral do Partido do Congresso, agora sem uma liderança forte e privado de membros da dinastia Gandhi, iniciada por Jawaharlal Nehru.

Provavelmente, em nenhuma outra ocasião a agremiação enfrentou, no correr da sua história, uma votação em que se apresentasse tão vulnerável e dividida. Outra incógnita refere-se ao desempenho dos radicais hinduístas do Bharatiya Janata, que ameaçam a convivência pacífica na Índia com seu fundamentalismo religioso.

A terceira questão é se o voto será livre, se a manifestação dos eleitores não sofrerá as costumeiras coações, ou se finda a apuração, haverá a enxurrada de sempre de denúncias de fraudes de toda a sorte.

Em vários países do Ocidente existe o expediente, nem sempre recomendável, da "boca de urna". Trata-se da tentativa dos cabos eleitorais de candidatos e partidos de fazerem o cidadão mudar de opinião --- ou de formar uma, caso esteja indeciso --- na hora precisa do voto.

Tal comportamento deforma, de certa maneira, a livre manifestação de vontade. Tanto é que a prática, embora largamente empregada, é proibida em muitos países. Na Índia, as coisas são mais dramáticas. Lá é um costume amplamente difundido o "seqüestro" de urnas. Mediante suborno de funcionários da Justiça Eleitoral ou através da violência, estas são subtraídas na véspera do pleito e cheias de votos para um determinado candidato. Depois, são repostas em seus devidos lugares.

Os indianos até deram um nome a tais fraudadores, que existem em grandes quantidades: os "gundos". Já está se tornando até uma tradição os partidos apostarem mais nesses desordeiros, que lhes dão segurança de boa votação, do que nos próprios cabos eleitorais.

Isto, e mais a violência alucinada, impedem que a Índia seja a maior democracia do mundo por suas virtudes, e não somente pelos seus 514 milhões de eleitores, ou seja, apenas numericamente.

(Artigo publicado na página 17, Internacional, do Correio Popular, em 12 de junho de 1991)

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