Sunday, July 08, 2012

Mês de eventos marcantes


Pedro J. Bondaczuk


O mês de julho, entre os outros onze do ano, tem prevalência e significado especial (especialíssimo) para Campinas. Esta cidade que amo tanto e que um dia me acolheu, com carinho, generosidade e respeito, me cativando para sempre, tem alguns dos seus marcos históricos mais relevantes celebrados neste período. Poderia estendê-lo um pouco mais, para incluir a primeira quinzena de agosto e essa extensão não seria nenhum exagero. Mas a essência da alma campineira é simbolizada por eventos ocorridos em meses de julho, de anos diferentes.

Peço escusas aos leitores se estou sendo confuso nestas considerações. Ocorre que escrever sobre Campinas me emociona e a emoção, se incontrolável, ou não controlada, impede, via de regra, que racionalizemos idéias. Ademais, quem me conhece sabe que moderação não é propriamente meu ponto forte. Aliás, muito pelo contrário! Sou exagerado por temperamento e gosto e meu exagero extrapola , se exacerba e se torna muito maior (transforma-se, se assim posso me expressar, no “exagero do próprio exagero”) quando se trata de amor: por uma causa, por uma pessoa, por um princípio ou por uma cidade (que é o caso).

E por que julho é tão importante para Campinas? Declarei a principal razão no início dessas reflexões, mas tal declaração carece de mais explicações. Pois vamos a elas. Em primeiro lugar, o mês marca o aniversário de fundação da cidade, que se celebra no dia 14 (a mesma data da célebre Tomada da Bastilha, na França, que seria o estopim da Revolução Francesa).

Só isso?! Não! Marca, também, datas de nascimento de dois dos filhos mais ilustres da cidade, o maestro e compositor Antonio Carlos Gomes (no dia 11) e o Príncipe dos Poetas Brasileiros, Guilherme de Andrade de Almeida (dia 24). Aliás, para o escritor, julho é mais representativo ainda. Afinal, foi também em um dia desse mês (o dia 11) que “partiu” (tornou-se “encantado” no dizer de Guimarães Rosa, que entendia que um poeta nunca morre), em 1969, aos 79 anos de idade, após cumprir com galhardia, competência e brilho sua missão na terra. Por isso, é reverenciado por seus conterrâneos, que lhe dedicam toda uma semana, anos após anos, nesse período. Honra ao mérito.

E por que citei a primeira quinzena de agosto como importante para a comunidade campineira (o é para pelo menos metade dos seus 1,2 milhão de habitantes)? Porque, nesse mês, mais especificamente no dia 11 do primeiro ano do século XX, ou seja, 1900, foi fundada a Associação Atlética Ponte Preta que, por conseqüência, é o clube de futebol mais antigo do Brasil (e essa antiguidade tem que ser interpretada no sentido de tradição e nunca de algo arcaico) de atividade ininterrupta. Houve entidades futebolísticas fundadas antes, mas estas fecharam suas portas e recomeçaram (ou foram “refundadas”) anos depois, embora com o mesmo nome, mas sem suas características originais. Considero-as, pois, “outros” clubes, posto que homônimos aos que encerraram as atividades. Com a Ponte Preta, todavia, nada disso aconteceu.

Voltando a julho, e à fundação da cidade, devo esclarecer que a data atualmente celebrada como a do “nascimento de Campinas”, o dia 14, nem sempre foi consensual. Houve muita, muitíssima controvérsia a esse respeito, que, a bem da verdade, ainda persiste, em determinados círculos culturais, posto que bastante atenuada. Li, há já bom tempo, magnífico ensaio tratando dessa polêmica que agitou as opiniões (e paixões) dos campineiros em boa parte do século XX. O título desse detalhado texto é: “‘Fundações’ de Campinas: fábricas de representações”. Foi escrito por Américo Baptista Vilella, ilustre historiador do Museu da Cidade de Campinas e coordenador do Ensino Médio da tradicional E. T. E Bento Quirino.

O autor inicia o memorável ensaio que citei dessa forma: “Refletir sobre a data oficial da fundação da cidade de Campinas é pensar como a cidade se percebe ao longo do tempo, cidade esta que por duas vezes comemorou seu bicentenário. Uma em 1939, durante a Ditadura do Estado Novo e a outra, em 1974, durante a Ditadura Militar e que por ocasião da oficialização da fundação, em 1971 através da Lei 3984, buscava em sua origem uma identidade que lhe permitisse vangloriar-se de um passado que a teria tornado a ‘grande urbe’ do interior de São Paulo”. Como se vê, trata-se de brilhante introdução, na qual o historiador baliza, com clareza, sua tese.

Uma das correntes defendia que a data da fundação da cidade deveria ser a de chegada do seu fundador à região, o ilustre bandeirante Francisco Barreto Leme, ou seja, em 1739. Dessa forma, neste ano não estaríamos comemorando seus 238 anos de criação, mas, de fato, 273. Faz sentido. E por que se oficializou o dia 14 de julho de 1774 como data de fundação de Campinas? Porque nela foi rezada a primeira missa, numa capela improvisada, tosca, coberta de sapê. A questão se complicou quando foi apresentada nova data e novo fundador. Essa corrente defendia que os aniversários deveriam ser comemorados nos dias 15 de novembro. A argumentação era que, nesse dia e mês, de 1732, o governador da Capitania de São Paulo, Luís Antonio de Sousa Botelho Mourão, conhecido como Morgado de Mateus (que de acordo com esse grupo seria o verdadeiro fundador de Campinas) formalizou o decreto de concessão de sesmaria da área a Antonio da Cunha Abreu. Aí já entendo que seja “forçação de barra”. Mas...

A Câmara Municipal, porém, decidiu acabar com a controvérsia e, após acaloradas (e, reitero, apaixonadas) discussões, determinou que a data oficial, reconhecida pelo Poder Público, de fundação de Campinas, era 14 de julho de 1774. Assim decidiu e assim ficou. O curioso é que nesse dia o expediente por aqui é normal. Ou seja, não é feriado. Estranhíssimo, não é verdade, principalmente após tanta polêmica e tantas controvérsias. Vá entender esses políticos!!!

Datas, ora datas.. O que são datas, se não meras datas?, diria o Conselheiro Acácio, personagem de Eça de Queiroz do romance “O primo Basílio”. Sabem o que eu faria, se estivesse ao meu alcance? Comemoraria o aniversário de Campinas nessas três ocasiões do ano (e com feriados, claro) agradando, dessa maneira, a gregos e troianos. Afinal, a cidade é tão grande, tão pujante e tão importante, nos contextos regional, nacional e até internacional, que bem que merece contar com três (ou mais) comemorações anuais de aniversário.

Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk

No comments: