Friday, May 04, 2012

Desarmamento restringe-se apenas a palavras

Pedro J. Bondaczuk

O presidente norte-americano George Bush propôs, em dias recentes, um amplo plano de desarmamento no Oriente Médio, como um passo decisivo para evitar novas guerras, como a do Golfo Pérsico, nessa explosiva região. Todavia, quase que simultaneamente à sua proposta, o secretário de Defesa dos Estados Unidos, Dick Cheney, visitava Jerusalém e assegurava às autoridades de Israel o fornecimento de baterias antimísseis Patriot e pelo menos dez caças F-15.



Na mesma ocasião, a França tornava público um projeto desarmamentista mais amplo, envolvendo, inclusive, armas nucleares, e se propunha até a aderir ao Tratado de Não-Proliferação, assinado em 1968 na localidade mexicana de Tlateloco, todavia constantemente violado por seus signatários.



A China, de imediato, deu um recado de que pretendia participar da conferência de Paris, marcada para o próximo mês, destinada a discutir os aspectos práticos do plano francês. Contudo, por baixo do pano, fornece mísseis M-11 para o Paquistão e está na iminência de vender os M-9, capazes de alvejar o território israelense, à Síria, que logo após o fim da guerra do Golfo, teria adquirido um lote de Scuds-C, uma versão melhorada do tipo "B", utilizada amplamente por Saddam Hussein para alvejar o Estado judeu e a Arábia Saudita, da Coréia do Norte.



Tais propostas mirabolantes, portanto, tentam o analista a desabafar parodiando o imortal Shakespeare: "Palavras, palavras, palavras..." Ou a se valer de um poeta nacional, Dante Milano, para classificar o teor do que vem sendo dito, mas não praticado, pelos estadistas contemporâneos: "Áridas palavras,/refratárias, secas/arestas de fragas/secretando uma água/morosa, suada,/que não mata a sede./São pedras na boca./Rolam balbuciantes/buscando um sentido".



Quando os presidentes Mikhail Gorbachev e Ronald Reagan assinaram, em 7 de dezembro de 1987, em Washington, o acordo de eliminação de mísseis nucleares estratégicos, a humanidade respirou aliviada, como se a possibilidade da catástrofe atômica houvesse sido afastada de vez.



Todavia, a mídia esqueceu-se de mencionar --- e os políticos suspiraram de satisfação --- que as armas destruídas tinham pouca significação numérica --- representavam menos de 3% dos arsenais dos dois países --- e prática, já que eram modelos ultrapassados, capazes até de negar fogo se precisassem ser utilizadas. Sua eliminação foi somente questão de economia.



Entre o que os estadistas dizem e o que fazem vai uma distância enorme. Por exemplo, nunca se falou tanto em paz no Oriente Médio, porém em raríssimas ocasiões foram plantadas tantas sementes de discórdia que conduzem à guerra na região.



Em nenhuma ocasião, desde 1948, quando foi criado o Estado de Israel, se propôs, com tamanha ênfase, o desarmamento dessa explosiva área, todavia, na prática, o que está ocorrendo é a aquisição desesperada dos modelos mais sofisticados de mísseis, antimísseis, tanques, caças e toda a parafernália inventada pelo homem moderno para aumentar a capacidade de destruir e de matar dessa fera que odeia sua própria espécie, por árabes e israelenses.



O que vem prevalecendo, na atualidade, é o interesse egoísta de grupos , organizações e países, em detrimento dos povos. Armas não são vendidas com finalidades nobres, como manifestação de mera "amizade", pois a máxima de Lorde Palmerston, que diz que "nações não têm amigos, têm interesses", continua valendo mais do que nunca para nossos dias.



(Artigo publicado na página 15, Internacional, do Correio Popular, em 14 de junho de 1991).

Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk

No comments: