Pedro J. Bondaczuk
A América Central retorna às manchetes e, como sempre tem acontecido em mais de um século, a razão é a explosão da violência na região. Desta feita, trata-se de ofensiva guerrilheira contra a capital salvadorenha, na irresoluta guerra civil de 10 anos nesse país, que deixou cerca de 75 mil mortos e reduziu a frangalhos a já antes miserável economia de El Salvador.
O aspecto pitoresco neste episódio, contudo, foi o uso feito dele pela Nicarágua, na Assembléia Geral anual da Organização dos Estados Americanos, que se realiza em Washington. Os nicaragüenses foram para esse encontro na qualidade de réus.
Sua delegação estava certa de que o país seria o pivô das recriminações de seus pares das três Américas, em virtude da suspensão, em dias recentes, por parte do presidente Daniel Ortega, da trégua unilateral de 19 meses que vigorava com os “contras”.
Mas no domingo deflagrou-se a ofensiva da Frente Farabundo Marti de Libertação Nacional em El Salvador. É evidente que a FLMN, cujos líderes sempre mostraram muito realismo, não desejaram com o ataque tomar o poder pelas armas. Os rebeldes não passam de cerca de sete mil combatentes regulares ou mais ou menos o mesmo tanto de irregulares.
Claro que eles não teriam, portanto, a mínima chance de vitória sobre os 45 mil soldados das Forças Armadas salvadorenhas, treinadas e super-armadas pelos Estados Unidos. A intenção, por isso, não seria a “arrancada final” para o poder, como alguns esquerdistas mais afoitos afirmaram. E nem se prendeu a um “ato de desespero”, conforme fontes do governo de Alfredo Cristiani interpretaram.
Os guerrilheiros pretenderam, acima de tudo, dar uma demonstração de força. Quiseram mostrar que ainda estão presentes na vida nacional, à revelia dos desejos da população, com vistas a uma melhor posição em futuras negociações de paz. Se fossem negociar agora, não teriam “cacife” para conseguir nada. E os 10 anos de luta que empreenderam teriam sido totalmente vãos.
Como, aliás, ocorreu em recentes conversações, mais uma vez fracassadas, repetindo o que havia ocorrido em tantas outras ocasiões. Todavia, mais do que à FLMN, a ofensiva acabou beneficiando aos sandinistas. Afinal, ela serviu de “gancho” para que na reunião da OEA eles pudessem fazer do ataque sua melhor arma de defesa.
Ao invés de ficarem acuados, diante das perorações ácidas da maioria dos delegados, podem agora barganhar uma trégua por outra e ainda colher saldos propagandísticos. Coisas da política dessa eternamente atormentada América Central...
(Artigo publicado na página 14, Internacional, do Correio Popular, em 15 de novembro de 1989).
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