Só nos resta ainda a
esperança
Pedro J. Bondaczuk
A
campanha política recém finda foi o supra sumo da arte (ou da artimanha?) do
discurso vazio, sem conteúdo e, é claro, sem solução para os raros problemas
levantados. Os vários candidatos tentaram passar ao público uma onipotência que
o mais ingênuo dos ingênuos sabe que eles não possuem.
Buscar
convencer, em especial, o irritado telespectador, durante o horário gratuito de
propaganda eleitoral nas televisões, da existência de um país de fantasia,
cujos males principais são a inadequação da segurança pública e a carência
habitacional. E só!
Fossem,
contudo, somente estas as nossas necessidades, e estaríamos até que muito bem.
Violência urbana, afinal, é um fenômeno que afeta o mundo todo, e não é de hoje.
Nova York, Moscou, Pequim, Paris e Londres bateram recordes sobre recordes de
criminalidade nos últimos tempos. Por outro lado, cada vez mais soviéticos,
britânicos, alemães e demais europeus encontram dificuldades para morar com
decência.
O
que nos aflige é também isso, evidentemente, mas não somente. O jornalista
Gaudêncio Torquato, num inspirado artigo que publicou no jornal "O Estado
de São Paulo", em julho passado, previu que os políticos, como sempre tem
acontecido no correr de praticamente todas as campanhas de nossa história,
voltariam a usar a miséria absoluta que ronda a 35% da população nacional como
base de sua pregação. Que usariam a mesma retórica de sempre, com sua
proverbial insensibilidade.
Só
que nem ele, e nem ninguém, poderiam prever que desta vez o discurso viria a
ser tão vazio, como foi. Seria extremamente edificante se cada candidato, de
castigo pelas bobagens que disse, dedicasse, nos próximos dias, longas horas na
análise dos vídeos da propaganda eleitoral que foi ao ar ao longo de penosos 60
dias.
Certamente,
cada um deles ficará envergonhado de trazer tanto lugar comum, tanto clichê,
tanta baboseira, que em certos momentos descambou para o ridículo, ao assustado
cidadão, caso tenha humildade para fazer essa autocrítica. A reação do eleitor
só poderia ser a que foi: omissão em massa, ditada por absoluto desencanto.
Os
que lograram ser eleitos, muitos dos quais beneficiados pela enxurrada de votos
brancos e nulos, não pensem, todavia, que poderão manter o "status
quo" impunemente. Ninguém mais está disposto a tolerar salários nababescos
de parlamentares insensíveis, enquanto a grande maioria ganha o insuficiente
até para sobreviver.
O
cidadão não aceitará calado, outra vez, as briguinhas de comadre em plenário,
embora a Constituição, cantada e decantada como panacéia para todos os males
nacionais, não foi ainda completada, faltando as indispensáveis leis
complementares que viabilizem boa parte dos seus dispositivos, mesmo já tendo
passado dois anos da sua promulgação.
Não
há quem esteja com paciência para fazer vistas grossas a negociatas, conchavos,
casuísmos e corrupções de toda a sorte, às custas da única coisa que ainda
sobrou para a maioria dos brasileiros: a sua esperança.
(Artigo
publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 9 de outubro de 1990).
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