Monday, December 26, 2016

Sem os pés no chão


Pedro J. Bondaczuk


O presidente norte-americano, Ronald Reagan, não está colhendo o grande sucesso que esperava, do ponto de vista político, na “11ª Reunião de Cúpula” dos países industrializados, que se realiza em Bonn, na Alemanha Ocidental. Pelo menos não o êxito tão espetacular que ele, certamente, esperava colher. E isso se verifica não somente porque o bloco ocidental não é tão compacto, como desejava que fosse, estando ligado mais por interesse pragmático, de segurança e de saúde da economia, do que por possível sentimento de gratidão europeu ou por incontida simpatia pelos Estados Unidos.

Aliás, isso é o que cimenta e mantém coesas todas as alianças através dos tempos. Ou seja, o puro interesse, quer seja ele de caráter comercial, quer militar, quer de qualquer outra espécie. E tudo restringe-se a apenas isso, e nada mais.

O primeiro revés político de Reagan veio ontem, com a desaprovação, posto que não explícita, mas bastante tácita, por parte dos seus parceiros, às sanções econômicas que ele anunciou no exato instante do seu desembarque em Bonn, contra o regime sandinista da Nicarágua. E essa repulsa não foi motivada por qualquer espécie de sentimento romântico de admiração e respeito pela luta dos seguidores dos ideais de Sandino, por parte dos líderes europeus.

É bastante provável que eles nem mesmo saibam quem foi esse legendário líder nicaragüense. A Nicarágua, ademais, sequer representa um mercado potencialmente promissor para a colocação dos produtos desse clube dos ricos, longe disso.

A maioria dos seis países, que se manifestaram contra o boicote adotado por Reagan (senão a totalidade) sequer mantém relações de comércio com essa pobre República centro-americana, de pouco menos de 2 milhões de habitantes. E se o faz, é em níveis tão irrisórios, que dificilmente podem ser quantificados.

O que, certamente, esses líderes reprovam, na atitude de Reagan, é a inoportunidade e a ineficácia de gestos grandiloqüentes desse porte, contra um país que, quando muito, pode ser perigoso apenas para si próprio. Pelas declarações dos principais políticos presentes à conferência, o que se conclui é que, na verdade, eles não entenderam bem como os sandinistas, acuados pela miséria de um lado, e pela ameaça militar norte-americana de outro, podem desestabilizar a América Central. Aliás, parece que ninguém entende isso.

A Teoria do Dominó, de Eisenhower, parece ter, mesmo, causado uma duradoura impressão na mente de mais de uma geração de políticos norte-americanos. E ela já fez alguns estragos muito grandes para ser levada a sério.


Por causa dessa paranóia anti-comunista, os EUA envolveram quase três milhões de seus mais promissores jovens no Vietnã, para evitar que todo o Sudeste Asiático caísse na órbita de Moscou. Perderam a guerra (ou pelo menos deixaram de ganhar) e o que aconteceu? Apenas o Laos e o Camboja, e assim mesmo por causa de erros palmares da Casa Branca, capitularam.

Hoje, sem os marines de Tio Sam, o Sudeste Asiático está cada vez mais distante do “perigo comunista” como jamais esteve até antes da Segunda Guerra Mundial. Os tempos, realmente, são outros e não admitem mais conceitos e soluções que, mesmo na década de 50, se revelaram caolhos e desastrados. Aí está o pecado de Ronald Reagan.

(Artigo publicado na página 10, Internacional, do Correio Popular, em 4 de maio de 1985).


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