No mesmo barco
Pedro J. Bondaczuk
A
hostilidade com que o presidente soviético, Mikhail Gorbachev, foi tratado
pelos conservadores – a maioria dos delegados presentes ao congresso regional
do Partido Comunista da Rússia – anteontem e ontem, dá a exata medida do que o
espera na importante convenção nacional da agremiação, marcada para o próximo
mês.
O
líder do Cremlin chegou a manifestar muita irritação com os delegados presentes
ao encontro, exigindo respeito não pela sua pessoa, mas pelos cargos que ocupa.
Insinuou, inclusive, que poderia deixar a secretaria-geral do PC. Mas o leitor
que admira esse estadista – e poucos não o admiram hoje fora da URSS – não
precisa ficar assustado. Sua saída desse cargo não equivalerá à perda da
Presidência, que desde março passado está fortalecida.
No
meu entender, se isto vier a se configurar, quem sairá perdendo será o partido.
Não é nada difícil Gorbachev encabeçar um movimento de criação de uma nova
organização política, sem os vícios e distorções do PC.
Prevendo
algo desse tipo, de uns tempos para cá o presidente soviético vem reforçando o
poderio do governo. Por conseqüência, enfraquece o do Partido Comunista no que
se refere à administração do país. Por exemplo, as decisões mais importantes da
sua gestão não estão mais sendo tomadas pelo Politburo, como ocorria com seus
antecessores, mas por uma comissão de 16 assessores, que Gorbachev fez questão
de escolher a dedo.
Os
reformistas sofreram um revés, ontem, ao não conseguir fechar as células
partidárias encravadas em instituições fundamentais do Estado, como a polícia
secreta (a outrora temida KGB), o Exército Vermelho e o próprio gabinete de
governo. Nem mesmo Boris Yeltsin conseguiu essa façanha na República da Rússia.
Aliás
este, que é o maior rival de Gorbachev, terá, a partir do mês que vem, que se
unir com o presidente soviético se não quiser ser levado de roldão pela irada
reação dos conservadores a todo e qualquer tipo de reforma que se pretenda
implementar na União Soviética.
Sua
situação é até mais delicada do que a do desafeto político, já que seus
arroubos reformistas têm descambado, ultimamente, para o exagero, para não
dizer, para a imprudência. O 28º Congresso Nacional do Partido Comunista, a ser
realizado em julho próximo, será, portanto, decisivo para o futuro da
superpotência do Leste.
Se
os linhas-duras, encabeçados por Yegor Ligachev, obtiverem êxito, deverão
tentar, com todas as armas, não somente bloquear a perestroika, mas até mesmo
reverter muitos dos avanços que este programa proporcionou ao país. Todavia,
esta sua ida com muita sede ao pote, numa sociedade em plena efervescência
revolucionária, pode lhe ser fatal. E talvez seja, também, para o destino da
União Soviética.
(Artigo
publicado na página 13, Internacional, do Correio Popular, em 21 de junho de 1990)
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