Perestroika visa a mudar
socialismo
Pedro J. Bondaczuk
O
presidente soviético Mikhail Gorbachev, ao lançar a idéia da
"perestroika", em momento algum pretendeu substituir o socialismo
pelo capitalismo. Pelo contrário, procurou incorporar elementos capitalistas
positivos --- como o mercado livre, o respeito absoluto pelo consumidor, o
enfoque não somente para a quantidade mas também para a qualidade dos produtos
oferecidos --- ao sistema vigente em seu país.
Propôs,
na verdade, uma nova revolução. Se com barricadas e armas na mão ou não
dependeria do tipo de reação que sabia que iria enfrentar por parte dos
"czares" comunistas, encastelados no poder, sufocando o potencial
criativo de toda a nação. Há muito equívoco em torno das idéias do líder do
Cremlin, já a partir da própria definição da palavra que passou a simbolizar as
reformas que sugeriu.
No
apêndice do livro "Mikhail Gorbachev, a Proposta", volume II, da
Editora Expressão e Cultura, há a seguinte observação: "Perestroika -
Reconstrução do sistema de relações sociais e econômicas vigentes na URSS, a
partir de um modelo sócio-econômico de inspiração socialista
preexistente".
Não
é, portanto, como muitos apregoam, um retorno ao capitalismo. No Brasil, e na
imprensa ocidental, a palavra "perestroika" vem sendo traduzida como
"restruturação". Aliás, pelo menos nesse ponto, a tradução do
significado foi das mais felizes.
O
que o presidente soviético pretende é, ousadamente, reestruturar. Não somente a
máquina do Estado, sua composição e funcionamento, mas a própria maneira dela
ser montada, seus objetivos e seu relacionamento com a sociedade. Tem por
objetivo estabelecer os limites entre o individual e o coletivo, o que jamais
aconteceu na União Soviética, em tempo algum.
Como
se observa, trata-se de uma tarefa gigantesca, muito grande para um só homem e
uma única geração. Para realizá-la, Gorbachev convocou, virtualmente, toda a
população. Porém o povo estava e está mais do que nunca totalmente descrente no
sistema e estava caindo numa perigosa apatia. Gorbachev partiu do princípio
óbvio de que todo o problema, para ser resolvido, precisa antes ser
identificado. E tal diagnóstico tem de ser, necessariamente, o mais exato
possível, caso contrário não se conseguirá curar a moléstia social.
Todavia,
o presidente soviético jamais poderia confiar nos relatórios elaborados pelos
burocratas do Partido Comunista, autênticas peças de ficção, tão inverossímeis
e grandiloqüentes eram. Ele próprio constatou, no livro
"Perestroika": "A
propaganda do sucesso (do sistema comunista), real ou imaginário, estava
ganhando terreno. Os elogios e o servilismo foram encorajados; as necessidades
e opiniões dos trabalhadores comuns, geralmente ignoradas. Nas ciências
sociais, a teoria escolástica foi estimulada e desenvolvida; o pensamento
criativo, expulso, declarando-se juízos voluntaristas e supérfluos como
verdades incontestáveis. As discussões científicas e teóricas, indispensáveis
ao desenvolvimento do pensamento e ao esforço criativo, foram emasculadas.
Tendências negativas semelhantes também influenciaram a cultura, as artes e o
jornalismo, bem como os métodos de ensino e a medicina, onde a mediocridade, o
formalismo e o panegirico retumbante vieram à tona".
Em
suma, os soviéticos agiam como avestruzes, enterrando a cabeça na areia de uma
intoxicação ideológica induzida e expunham o corpo à destruição.
(Artigo
publicado na página 14, Internacional, do Correio Popular, em 22 de março de
1991).
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