É preciso credibilidade
Pedro J. Bondaczuk
O
País convive, desde agora, com uma nova "realidade" --- desculpem o
trocadilho involuntário --- com a introdução da Unidade Real de Valor, a tão
comentada e pouco entendida URV, que despertou uma verdadeira (e justificada)
histeria nacional.
Quem
vai perder? Quem vai ganhar? Como fica a poupança? Como ficam os aluguéis?
Essas são algumas das perguntas que circulam de boca em boca e são repetidas
milhões de vezes por todo o País. O ministro da Fazenda, Fernando Henrique
Cardoso, realiza autêntica maratona de entrevistas, tentando tranqüilizar as
pessoas. E fica a impressão de que já vimos "filme" parecido com
esse.
Tomara
que desta feita haja um "happy end", um final feliz, já que o atual
plano de ajuste se mostra pelo menos não tão dramático quanto seus antecessores
Cruzados I e II, Bresser, Verão e Collor I e II, para citar os que vêm de
imediato à memória. Quando da edição dos citados pacotes anteriores, as
expectativas também eram de que dessem certo, embora o otimismo decrescesse
progressivamente, de um para o outro.
Sem
atentar para os aspectos técnicos, já que toda a teoria na prática é outra, o
atual programa de estabilização depende, para funcionar (e esse muito mais do
que os anteriores), de um capital que os últimos governos nunca tiveram:
credibilidade.
Seria
indispensável que, vencida a etapa da resistência natural (toda novidade, seja
em que sentido for, enfrenta a barreira do ceticismo), a população
"acreditasse" na viabilidade e na eficácia das medidas adotadas. Essa
adesão, contudo, parece tão árdua quanto os mitológicos "doze trabalhos de
Hércules".
Depois
de tudo o que aconteceu nos últimos 50 anos de história alguém pode culpar o
brasileiro por não acreditar em nada e ninguém? Aliás, a descrença é uma
característica dos nossos tempos, e não somente no Brasil. Qual governo goza,
nos dias que correm, de absoluta credibilidade? O de Bill Clinton, nos Estados
Unidos? O de John Major, na Grã-Bretanha? O da dupla François
Mitterrand-Édouard Balladur, na França? O de Bóris Yeltsin, na Rússia? O de
Helmut Kohl, na Alemanha? O de Morihiro Hosokawa, no Japão?
Quem
acompanha a política internacional sabe que todos esses governos atravessam um
período de desprestígio tão grande, que qualquer medida que adotem, política,
econômica ou militar, é recebida não apenas com resistências, mas com um
sorriso irônico e zombeteiro, como se as pessoas dissessem: "Pronto, lá
vem um novo truque dos políticos!"
A
URV, antes de se transformar em moeda forte, como Fernando Henrique pretende,
deve passar por uma série de testes. O dos sindicalistas, por exemplo. O da
Previdência Social e, mais do que essa, dos aposentados que, pelo andar da
carruagem, mais uma vez ficarão no prejuízo. O do funcionalismo público. E
principalmente, o de um Congresso obscuro e medíocre, sem muita vontade de
trabalhar --- basta ver o número de "gazeteiros" que possui --- ao
qual caberá a tarefa de aprovar a medida provisória que cria a URV.
Terá
Fernando Henrique, candidato potencial à sucessão de Itamar Franco,
"cacife" político ainda maior do que o demonstrado para a aprovação
do Fundo Social de Emergência?
(Artigo
publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 1 de março de 1994).
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