Pedro J. Bondaczuk
O Brasil sempre foi tido e havido, e por muito tempo, como o “país do futuro”. Alguns, ainda, consideram-no como tal. Outros tantos, entusiasmados com o surto de progresso que por aqui se verifica há já mais de uma década, entendem que estas terras descobertas por Cabral já são do “presente”. Acham que o Brasil já é uma sociedade emergente, que caminha, a passos largos, para tornar-se uma das potências do século XXI. Os pessimistas (e são muitos), com base, principalmente, em nossas tantas carências, que ainda não foram supridas, entendem, todavia, que a nossa oportunidade de obter destaque (e até liderança) internacional já passou.
Discordo deles. Fico no meio termo. Não sou nem o alienado ufanista, que enxerga tudo cor de rosa, sem atentar para nossas múltiplas carências e deficiências (sobretudo estas) e nem o alienadíssimo e sempre amargo derrotista, que não reconhece sequer o óbvio e palpável: nossa inegável evolução econômica e social . Vejo com bons olhos nosso futuro. Claro, condiciono-o ao comportamento, tanto dos governos, quanto da população, no sentido de construí-lo. Sou dos que não ficam nem tanto ao céu, nem tanto à terra. Afinal, como dizem os sábios, “a virtude está no meio”.
Essa classificação de “país do futuro” popularizou-se, principalmente, a partir da primeira metade do século XX, quando o escritor Stefan Zweig – que se apaixonou pelo Brasil, aqui viveu, batalhou, amou e... morreu, cometendo suicídio – publicou seu famoso livro com esse título. Em sua obra, ridicularizada por muitos até nos tempos atuais, levou em conta não apenas nossas decantadas riquezas naturais, mas, principalmente, a cordialidade do nosso povo e nossa alegria de viver. Ademais, naquela época o Brasil caracterizava-se pela juventude, já que então a imensa maioria da população era constituída de crianças e de adolescentes. Hoje... bem, não é mais assim.
Meu tema, todavia, não é bem esse. É, pelo menos na aparência, bem mais prosaico e trivial. Mas... nem tudo o que parece de fato é. Como é de meu costume, não quero introduzir esse assunto de chofre, de repente, sem fazer um tantinho de suspense. Afinal, meu estilo é assim. Raras vezes proponho-me a fazer um ensaio, profundo, erudito, repleto de jargões, supostamente objetivo, característica dos textos da imensa maioria de sisudos intelectuais. Respeito a forma de escrever deles, mas batalho para que respeitem a minha maneira de comunicar idéias. Gosto de transformar esse exercício dialético num bate-papo, caracterizado, sobretudo, pela informalidade. Isso sem menosprezar o conteúdo.
Políticos cooptados, economistas engajados e propagandistas do período de “ufanismo” da década de 70 – que na verdade não ensejava motivos de ufanismo, por ser, como se viu na sequência, na verdade o que passou para a História como os “anos de chumbo” da ditadura militar – não cansavam de repetir, a qualquer pretexto, que éramos o “país do futuro” na trilha do pleno desenvolvimento. A premissa estaria certa, não fosse essa última parte. As múltiplas bobagens, notadamente o escandaloso endividamento externo, cometidas pelos ditadores de plantão iriam resultar não no desejável salto adiante, em termos econômicos e sociais, mas numa perversa (e de triste memória) hiperinflação.
Em 15 de novembro de 1987, a Saldiva & Associados Propaganda divulgou uma pesquisa de opinião que, na época, deu o que falar. A empresa entrevistou na ocasião duas mil pessoas, sendo 1 mil em São Paulo e outro tanto no Rio de Janeiro. Queria medir o nível de otimismo (ou de pessimismo, claro) do brasileiro, em relação ao futuro imediato. Chegou à conclusão que a maioria da população estava nostálgica em relação ao passado e descrente com o que viria à frente.
A tendência era a de supervalorizar lembranças, expurgando-as de tudo o que de negativo pudessem registrar, considerando os anos passados, sobretudo os que antecederam o golpe militar de 1964, como “bons e velhos tempos”. Não fui pesquisado a propósito na ocasião. Se o fosse, todavia, minha resposta seguiria essa mesmíssima tendência, que era a da maioria. Essa hipervalorização do passado prevaleceu em todas as faixas etárias, independente de sexo, e em todas as categorias sociais e de renda.
O pitoresco foi o fato de jovens dos treze aos dezoito anos, que sequer eram nascidos nos tempos de que diziam ter saudades – da segunda metade dos anos 50 à primeira dos 60, cunhada como a época dos “anos dourados” – se constituírem na grande maioria dos saudosistas e dos desencantados com o futuro. Isso refletia bem a crise que o País vivia em 1987, nos primeiros e difíceis anos pós-ditadura militar, que era também (ou sobretudo) de falta de confiança e de credibilidade nos políticos.
Naquela onda de nostalgia, um movimento musical que, quando surgiu, ficou restrito a alguns poucos anos (quinze, se tanto), subitamente voltou à moda. Por pouco tempo, é verdade. Mas voltou. Refiro-me à Bossa Nova, sobre a qual pretendo escrever, com mais detalhes, nos próximos dias, e quantos textos forem necessários para registrar minha visão sobre o que foi e o que significou para a nossa cultura. Quando esse movimento completou, em 2008, o “Jubileu de Ouro”, escrevi a propósito, mas apenas a título de registro. Contudo, dada sua importância, entendo ser oportuno tratar a respeito com mais vagar e detalhes.
A Bossa Nova, embora um tipo de música elitista, e por isso, antipopular, “emplacou”, principalmente no Exterior, quer nos Estados Unidos, quer em quase toda a Europa. Atingiu o público dessas regiões de tal forma que, ao lado do futebol e do café, passou a caracterizar o Brasil mundo afora. Ainda hoje, essas três coisas são uma espécie de símbolos do nosso país fora das nossas fronteiras. Além disso, constituiu-se num dos raros capítulos completos da MPB: teve começo, meio e fim razoavelmente definidos, ao contrário do que em geral ocorre com outros movimentos musicais. Daí merecer minha atenção: por “despertar saudades” até em quem não era nascido na época em que surgiu e que teve seu período áureo.
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