Sacrifícios humanos
Pedro J. Bondaczuk
Em textos anteriores sobre o povo maia – ao qual se atribui suposta “profecia” que preveria o fim do mundo em 21 de dezembro de 2012 – abordei, embora de passagem, aspectos da sua cultura, em especial das suas ciência (no caso, a astronomia) e arte (principalmente pintura e escultura). Abordei sua perícia em matemática e sua notável arquitetura para a época. E citei ligeiramente suas majestosas pirâmides. Esse tipo de construção foi relativamente comum em várias partes do mundo, como no Egito e em algumas partes da Ásia. O que variava era a forma dessas obras. E, mais do que isso, a finalidade.
As pirâmides egípcias destinavam-se a acolher os restos mortais dos faraós, cujos corpos mumificados eram ali encerrados, com seus bens mais preciosos e (dizem) com seu séquito dos mais leais servidores, para empreenderem “viagem” ao outro mundo, em que seriam imortais. De uma forma ou de outra, portanto, relacionavam-se com a morte, posto que da maneira peculiar como esse povo a encarava, ou seja, como mera passagem de um estágio a outro.
Já as pirâmides maias não se destinavam a ser mausoléus de seus imperadores. Tinham a função de altares, de locais de adoração dos seus não menos bizarros deuses. Eram nelas, por exemplo, que se faziam sacrifícios cerimoniais – e, ao contrário do que se propala, raramente humanos – para aplacar a fúria de suas temperamentais divindades ou para lhes pedir benevolência e que lhes propiciassem fartas safras. Centralizavam, também, as atividades políticas do império. Os grandes eventos nacionais ocorriam ao seu redor. Era no seu topo que seus imperadores faziam exortações às massas.
Portanto, enquanto no Egito as pirâmides se associavam à idéia de morte, posto que da forma peculiar com que os egípcios a encaravam, ou seja, como passagem de um estado a outro, no Novo Mundo, para os maias, eram símbolos de vida, quer no aspecto, digamos, profano, quer no sagrado, ou espiritual, condições estas que confundiam e lhes eram interligadas. As formas de ambas eram diferentes. No Egito, tinham o formato realmente piramidal. Eram revestidas de granito rosa, que refletia a luz solar e cujo brilho podia ser visto a centenas de quilômetros de distância. Desse revestimento nada resta. Ao longo dos séculos, os belos granitos rosas foram pilhados por saqueadores, que os vendiam a peso de ouro. Hoje, esse belíssimo revestimento enfeita palácios e mansões de toda aquela região.
Já as pirâmides maias eram construídas em patamares, com escadas em vários de seus lados para se subir ao topo, encimado por plataformas quadradas ou retangulares. Lembram muito os desenhos que se fazem desse tipo de monumento supostamente construído pelos míticos atlântidas, dos quais seriam descendentes. No Egito, elas eram erigidas no deserto, sem nenhuma outra construção ao redor. Fazia-se de tudo para desestimular a ação de curiosos e de saqueadores.
Já as pirâmides maias nunca eram isoladas. Faziam parte de imensos complexos, espécies de cidades sagradas. Estavam incorporadas à vida cotidiana da população. A descoberta de um poço sagrado, junto à Grande Pirâmide de Kukulkan, em Chichen Itzá, com milhares de esqueletos humanos no interior, comprova que esse povo fazia sacrifícios humanos ao deus Chac, divindade que entendia ser a responsável pelo ciclo de chuvas. Segundo sua crença, tratava-se de entidade malévola e caprichosa, que quando ficava zangada, só se satisfazia com sangue humano.
Para um povo gregário, cuja principal atividade era a agricultura, as chuvas regulares eram cruciais. Quando faltavam, porém, nem sempre os maias recorriam ao sacrifício humano. Não, pelo menos, de imediato. Antes, tentavam vários outros expedientes para aplacar o que entendiam ser a ira de Chac. Os sacrifícios humanos eram o derradeiro recurso, quando todos os outros estavam esgotados.
Primeiro, os sacerdotes buscavam conseguir a benevolência dessa temperamental divindade colocando as melhores comidas em seus altares. Se as chuvas teimassem em não cair, matavam animais e os ofereciam ao deus. Se isso também não produzisse resultados, os fieis apelavam para os seus bens. Lançavam, por exemplo, facas ricamente trabalhadas em jade e obsidiana e outras tantas jóias nos “cenotes”, nome dado aos poços de sacrifícios.
Se chovesse, tudo bem. Os sacerdotes faziam orações e agradeciam a Chac por suas benesses. Caso a seca persistisse, porém, partiam para o recurso extremo. Examinavam grupos de moças, virgens, que eram selecionadas de acordo com suas datas de nascimento. Quando, finalmente, tudo se mostrava inútil e a seca persistia, uma dessas donzelas era escolhida para ter a suprema “honra” de salvar toda a comunidade. Essa escolha era feita consultando-se as vísceras de animais ou apelando-se aos “pressagos”, pessoas que teriam a faculdade de interpretar presságios, ou seja, de desvendar o futuro.
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
Pedro J. Bondaczuk
Em textos anteriores sobre o povo maia – ao qual se atribui suposta “profecia” que preveria o fim do mundo em 21 de dezembro de 2012 – abordei, embora de passagem, aspectos da sua cultura, em especial das suas ciência (no caso, a astronomia) e arte (principalmente pintura e escultura). Abordei sua perícia em matemática e sua notável arquitetura para a época. E citei ligeiramente suas majestosas pirâmides. Esse tipo de construção foi relativamente comum em várias partes do mundo, como no Egito e em algumas partes da Ásia. O que variava era a forma dessas obras. E, mais do que isso, a finalidade.
As pirâmides egípcias destinavam-se a acolher os restos mortais dos faraós, cujos corpos mumificados eram ali encerrados, com seus bens mais preciosos e (dizem) com seu séquito dos mais leais servidores, para empreenderem “viagem” ao outro mundo, em que seriam imortais. De uma forma ou de outra, portanto, relacionavam-se com a morte, posto que da maneira peculiar como esse povo a encarava, ou seja, como mera passagem de um estágio a outro.
Já as pirâmides maias não se destinavam a ser mausoléus de seus imperadores. Tinham a função de altares, de locais de adoração dos seus não menos bizarros deuses. Eram nelas, por exemplo, que se faziam sacrifícios cerimoniais – e, ao contrário do que se propala, raramente humanos – para aplacar a fúria de suas temperamentais divindades ou para lhes pedir benevolência e que lhes propiciassem fartas safras. Centralizavam, também, as atividades políticas do império. Os grandes eventos nacionais ocorriam ao seu redor. Era no seu topo que seus imperadores faziam exortações às massas.
Portanto, enquanto no Egito as pirâmides se associavam à idéia de morte, posto que da forma peculiar com que os egípcios a encaravam, ou seja, como passagem de um estado a outro, no Novo Mundo, para os maias, eram símbolos de vida, quer no aspecto, digamos, profano, quer no sagrado, ou espiritual, condições estas que confundiam e lhes eram interligadas. As formas de ambas eram diferentes. No Egito, tinham o formato realmente piramidal. Eram revestidas de granito rosa, que refletia a luz solar e cujo brilho podia ser visto a centenas de quilômetros de distância. Desse revestimento nada resta. Ao longo dos séculos, os belos granitos rosas foram pilhados por saqueadores, que os vendiam a peso de ouro. Hoje, esse belíssimo revestimento enfeita palácios e mansões de toda aquela região.
Já as pirâmides maias eram construídas em patamares, com escadas em vários de seus lados para se subir ao topo, encimado por plataformas quadradas ou retangulares. Lembram muito os desenhos que se fazem desse tipo de monumento supostamente construído pelos míticos atlântidas, dos quais seriam descendentes. No Egito, elas eram erigidas no deserto, sem nenhuma outra construção ao redor. Fazia-se de tudo para desestimular a ação de curiosos e de saqueadores.
Já as pirâmides maias nunca eram isoladas. Faziam parte de imensos complexos, espécies de cidades sagradas. Estavam incorporadas à vida cotidiana da população. A descoberta de um poço sagrado, junto à Grande Pirâmide de Kukulkan, em Chichen Itzá, com milhares de esqueletos humanos no interior, comprova que esse povo fazia sacrifícios humanos ao deus Chac, divindade que entendia ser a responsável pelo ciclo de chuvas. Segundo sua crença, tratava-se de entidade malévola e caprichosa, que quando ficava zangada, só se satisfazia com sangue humano.
Para um povo gregário, cuja principal atividade era a agricultura, as chuvas regulares eram cruciais. Quando faltavam, porém, nem sempre os maias recorriam ao sacrifício humano. Não, pelo menos, de imediato. Antes, tentavam vários outros expedientes para aplacar o que entendiam ser a ira de Chac. Os sacrifícios humanos eram o derradeiro recurso, quando todos os outros estavam esgotados.
Primeiro, os sacerdotes buscavam conseguir a benevolência dessa temperamental divindade colocando as melhores comidas em seus altares. Se as chuvas teimassem em não cair, matavam animais e os ofereciam ao deus. Se isso também não produzisse resultados, os fieis apelavam para os seus bens. Lançavam, por exemplo, facas ricamente trabalhadas em jade e obsidiana e outras tantas jóias nos “cenotes”, nome dado aos poços de sacrifícios.
Se chovesse, tudo bem. Os sacerdotes faziam orações e agradeciam a Chac por suas benesses. Caso a seca persistisse, porém, partiam para o recurso extremo. Examinavam grupos de moças, virgens, que eram selecionadas de acordo com suas datas de nascimento. Quando, finalmente, tudo se mostrava inútil e a seca persistia, uma dessas donzelas era escolhida para ter a suprema “honra” de salvar toda a comunidade. Essa escolha era feita consultando-se as vísceras de animais ou apelando-se aos “pressagos”, pessoas que teriam a faculdade de interpretar presságios, ou seja, de desvendar o futuro.
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