Friday, April 13, 2012







Amazônia loteada


Pedro J. Bondaczuk

A Amazônia, que já nasceu cercada por lendas e mitos de todas as espécies --- o próprio rio que lhe dá denominação e, por extensão, a toda a região, tem o nome de guerreiras mitológicas --- está, na verdade, envolvida por uma aura de grande desinformação.

Muito do que se diz ou se escreve a seu respeito não passa de fantasia. Mas uma coisa é real: essa magnífica reserva biológica tem que ser preservada. Não porque seja o pulmão da Terra, como se apregoa, pois a maior parte da renovação do oxigênio na biosfera se dá através do mar. Nem que seja potencialmente um celeiro agrícola do Brasil e do mundo, já que se sabe que seu solo não prima pela fertilidade e que esta existe apenas em algumas "manchas" amazônicas.

Temos de preservar a Amazônia pelo mesmo motivo que precisamos resguardar da destruição tantas outras reservas biológicas, do Brasil ou de qualquer lugar do Planeta. Para evitar um desequilíbrio no preciso mecanismo da natureza. Porque se destruirmos nosso lar no espaço, nossa astronave, da qual somos tripulantes, estaremos, fatalmente, destinados à extinção. Não importa que estratégia adotemos para evitar a devastação crescente dos recursos naturais planetários, desde que funcione.

Uma das formas mais estranhas de preservacionismo, todavia, é a adotada por uma fundação norte-americana denominada "Rain Forest Foundation". Essa organização publicou, em 1990, na revista "Premiere" dos Estados Unidos, anúncio oferecendo lotes de terra na Amazônia, para que pudessem ser preservados de destruição.

Nacionalismo à parte, tal procedimento causa estranheza, por várias razões. A primeira é a da legitimidade. Como posso vender aquilo que não me pertence, sem com isso caracterizar o delito de estelionato? Ou será que a entidade adquiriu de alguém a região e não estamos sabendo? De quem?

A segunda questão que se impõe é a da garantia de que os objetivos propostos serão de fato respeitados. Se eu compro uma propriedade, posso fazer com ela o que quiser, desde que a ação seja legal. E nesta terra do "jeitinho", mesmo as ilegais acabam sendo praticadas, mediante dribles na lei.

A intenção da "Rain Forest Foundation" pode ser das melhores, não se discute esse aspecto. O que nos parece, contudo, é que a estratégia escolhida não é das mais felizes, por se constituir numa autêntica armadilha. Pressupõe sinceridade da parte dos adquirentes, o que é, cada vez mais, uma virtude rara no mundo contemporâneo, tão cheio de meias verdades, que são piores do que a mentira completa, por apresentarem verossimilhança.

Não sei se essa iniciativa esdrúxula e absolutamente insólita deu ou não algum resultado e, caso eventualmente tenha sido o que a organização esperava, qual ele de fato foi.. Presumo que não resultou em nada, caso contrário, provavelmente, de uma forma ou7 de outro, nós saberíamos.

Todavia, ela ilustra a caráter a forma como nós, brasileiros, somos encarados no exterior: como irresponsáveis e relapsos em relação ao nosso patrimônio (o que, a rigor, convenhamos, procede, pelo menos em relação à Amazônia), embora quem nos considera dessa forma seja mais devastador e poluidor da natureza do que nós. Afinal, onde foram parar as florestas dos Estados Unidos, quase tão vastas quanto a Amazônia, que os primeiros colonizadores do território encontraram quando ali desembarcaram? Claro que um erro não justifica outro. Mas... .

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