Paciência tem limites
Pedro J. Bondaczuk
A Birmânia vive um estado de rebelião nacional contra o governo do seu novo presidente, general Sein Lwin, eleito indiretamente pelo Parlamento há algumas semanas. O clima é de levante e até mesmo as Forças Armadas, que sustentaram o regime, um misto de socialismo com budismo, desde 1962, já se mostram desunidas.
Diplomatas em Rangum afirmam que várias unidades estão se passando para o lado do povo, que combate as tropas que investem contra ele com estilingues, paus, pedras, bombas de gasolina (os conhecidíssimos coquetéis molotov) e todos os recursos que encontra ao seu dispor. Os soldados, por seu turno, têm disparado a esmo e cometido bárbaras chacinas, de acordo com o depoimento de testemunhas idôneas.
Houve, até, um caso de invasão a um hospital para liquidar os feridos. Diante da oposição do corpo médico, a um ato tão covarde e brutal, esses indivíduos bestiais e sanguinários não titubearam. Fuzilaram os que se puseram em seu caminho.
Quando da infeliz escolha do Parlamento birmanês, comentamos, neste espaço, que o que está ocorrendo na Birmânia agora iria acontecer. Não se trata de ser profeta ou fazer prognósticos sem fundamento, mas de recorrer à lógica. E, infelizmente, nossas previsões estão se concretizando.
O novo presidente, Sein Lwin, recorde-se, ostenta o nada honorífico título de “Carniceiro de Rangum”. Como conquistou esse apelido é fácil de se deduzir. Foi de uma ferocidade a toda a prova na repressão aos distúrbios estudantis que se verificaram em março passado, quando era o chefe de polícia da capital.
O nível de tolerância de qualquer povo tem limites. Alguns são mais pacientes e toleram covardias, corrupções e tiranias por muito tempo. Outros, rebelam-se assim que são oprimidos e se mantêm em estado de rebelião permanente até que se livrem do tirano.
No caso atual, a paciência dos birmaneses mostrou ser digna do líder religioso que reverenciam, Sidarta Gauthama, o Buda. A população tolerou ficar privada do direito de escolher seus governantes por 26 anos. Fez vistas grossas aos desmandos e atos de corrupção do homem-forte do país, Ne Win, que quando viu as coisas se complicarem, apresentou uma estratégica renúncia, alegando razões de saúde. Tolerou massacres contra minorias étnicas nas montanhas do Norte, embora jamais aprovasse esse extermínio. Enfim, suportou a tudo, calada.
Mas guindar ao poder alguém que deveria estar na cadeia, foi demais para os birmaneses! Por isso, não somente este governo, como, provavelmente, o próprio regime deverão cair nas próximas horas. Não foi por acaso que os Estados Unidos fecharam a sua embaixada em Rangum.
Tudo tem limites neste mundo. E a tirania, imposta sobre a população birmanesa, fez com que esta ficasse profundamente irritada. Por isto, o povo, certamente, dará um basta aos 26 terríveis e sangrentos anos de ditadura esquerdista, piores do que o pior dos pesadelos.
(Artigo publicado na página 13, Internacional, do Correio Popular, em 11 de agosto de 1988).
Pedro J. Bondaczuk
A Birmânia vive um estado de rebelião nacional contra o governo do seu novo presidente, general Sein Lwin, eleito indiretamente pelo Parlamento há algumas semanas. O clima é de levante e até mesmo as Forças Armadas, que sustentaram o regime, um misto de socialismo com budismo, desde 1962, já se mostram desunidas.
Diplomatas em Rangum afirmam que várias unidades estão se passando para o lado do povo, que combate as tropas que investem contra ele com estilingues, paus, pedras, bombas de gasolina (os conhecidíssimos coquetéis molotov) e todos os recursos que encontra ao seu dispor. Os soldados, por seu turno, têm disparado a esmo e cometido bárbaras chacinas, de acordo com o depoimento de testemunhas idôneas.
Houve, até, um caso de invasão a um hospital para liquidar os feridos. Diante da oposição do corpo médico, a um ato tão covarde e brutal, esses indivíduos bestiais e sanguinários não titubearam. Fuzilaram os que se puseram em seu caminho.
Quando da infeliz escolha do Parlamento birmanês, comentamos, neste espaço, que o que está ocorrendo na Birmânia agora iria acontecer. Não se trata de ser profeta ou fazer prognósticos sem fundamento, mas de recorrer à lógica. E, infelizmente, nossas previsões estão se concretizando.
O novo presidente, Sein Lwin, recorde-se, ostenta o nada honorífico título de “Carniceiro de Rangum”. Como conquistou esse apelido é fácil de se deduzir. Foi de uma ferocidade a toda a prova na repressão aos distúrbios estudantis que se verificaram em março passado, quando era o chefe de polícia da capital.
O nível de tolerância de qualquer povo tem limites. Alguns são mais pacientes e toleram covardias, corrupções e tiranias por muito tempo. Outros, rebelam-se assim que são oprimidos e se mantêm em estado de rebelião permanente até que se livrem do tirano.
No caso atual, a paciência dos birmaneses mostrou ser digna do líder religioso que reverenciam, Sidarta Gauthama, o Buda. A população tolerou ficar privada do direito de escolher seus governantes por 26 anos. Fez vistas grossas aos desmandos e atos de corrupção do homem-forte do país, Ne Win, que quando viu as coisas se complicarem, apresentou uma estratégica renúncia, alegando razões de saúde. Tolerou massacres contra minorias étnicas nas montanhas do Norte, embora jamais aprovasse esse extermínio. Enfim, suportou a tudo, calada.
Mas guindar ao poder alguém que deveria estar na cadeia, foi demais para os birmaneses! Por isso, não somente este governo, como, provavelmente, o próprio regime deverão cair nas próximas horas. Não foi por acaso que os Estados Unidos fecharam a sua embaixada em Rangum.
Tudo tem limites neste mundo. E a tirania, imposta sobre a população birmanesa, fez com que esta ficasse profundamente irritada. Por isto, o povo, certamente, dará um basta aos 26 terríveis e sangrentos anos de ditadura esquerdista, piores do que o pior dos pesadelos.
(Artigo publicado na página 13, Internacional, do Correio Popular, em 11 de agosto de 1988).
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