Monday, September 25, 2017

Um século de contínuas lutas

Pedro J. Bondaczuk

As Filipinas completam, em 12 de junho, 40 anos de vida independente, dos quais mais de vinte sob um único governo, o de Ferdinand Marcos. Antes dele, quatro outros políticos presidiram o país: Manuel Roxas (1946 a 1949), Elpídio Quirino (1949 a 1953), Ramón Magsaysay (1953 a 1961) e Diosdado Macapagal (1961 a 1965). Foi competindo com este último , em eleições limpas e livres, que o atual presidente venceu e assumiu o cargo que nunca mais quis largar.

Esse país insular, um arquipélago composto por 7.100 ilhas, das quais a maioria com tamanho inferior a 100 quilômetros quadrados, desde fins do século passado vem sendo palco de intensas lutas. Raros foram os períodos de paz do seu povo, que é uma mistura de malaio com chinês, indiano, asiáticos do sul e espanhol. Em seus 300.000 quilômetros quadrados de território vivem mais de 50 grupos étnicos diferentes, que falam mais de 70 dialetos e que perfazem uma população de 54 milhões de habitantes. As Filipinas (que devem o seu nome ao rei Filipe IV da Espanha) já foi domínio de três países diferentes. Até 1898 esteve sob a tutela espanhola, quando passou a pertencer aos Estados Unidos como consequência da vitória norte-americana na guerra hispano-americana. Na Segunda Guerra Mundial, parte do seu território foi ocupada pelos japoneses.

Os filipinos, que começaram a sua luta pela independência em 1896, não tiveram, desde então, prolongados períodos de paz. Vários foram os levantes contra o domínio norte-americano. Momentos de heroísmo foram protagonizados para expulsar os japoneses do seu território. E depois de 1946, já independentes, os combates assumiram um aspecto ainda mais sombrio: passaram a ser protagonizados entre os próprios irmãos.

Na verdade as Filipinas foram abalroadas pelo avanço comunista no sudeste asiático a partir da segunda metade da década de 1950. Os primeiros anos de independência até que transcorreram relativamente bem. De 1946 até 1955, até a metade do mandato do presidente Ramón Magsaysay, havia convivência harmônica entre os poderes Executivo e Legislativo, que tinha liderança comunista, originada numa força guerrilheira que havia se destacado na luta contra os japoneses durante a Segunda Guerra (os Huks). No entanto, metade da Coreia caiu, nessa época, em mãos comunistas. Para complicar, os vietmins derrotaram os franceses e estabeleceram um estado marxista no Norte do Vietnã. E guerrilhas comunistas atuavam intensamente no Camboja, no Laos, na Tailândia, na Birmânia e na Malásia. “O próximo país” - raciocinavam, então, os norte-americanos, protetores e financiadores das Filipinas - “será o arquipélago”. E essa ex-colônia dos Estados Unidos tinha import?ância estratégica ímpar para Washington. Até hoje, os norte-americanos dispõem de duas bases militares importantes em solo filipino: uma naval (a de Subic Bay) e outra aérea.

Os Huks passaram a ser encarados como perigosos desde então e foram banidos da política. E estes não tiveram dúvidas: pegaram em armas. Em 1969, já no governo de Marcos, essa guerrilha foi liquidada, com a morte, em janeiro desse ano, de seu líder, Efren Lopez. Isso só fez crescer, tanto entre os filipinos, quanto aos norte-americanos, o prestígio desse então jovem e promissor político, ou seja, o atual presidente. Se ele se4 contentasse com apenas um mandato presidencial, ou quando muito com dois, estaria tudo bem, Passaria para a História como heroi nacional. Mas não, um prazo desses não foi visto como suficiente por Ferdinand Marcos. E já está provado que um poder absoluto e por tempo ilimitado tende a corromper seu detentor e fazer com que ele perca até mesmo contato com a realidade. E o que está acontecendo com o atual presidente filipino.

Seria irônico se agora ele terminasse vencido por uma simples dona de casa, que nunca escondeu de ninguém que não entendia nadas de política e muito menos de administração pública. O motivo quie levou Marcos a fechar o regime, sobretudo a partir de 1972, quando decretou a lei marcial, subsiste e até se agravou. Mas agora não mais por causa de eventual interferência externa, porém em virtude de seus muitos erros. A guerrilha esquerdista hoje está mais forte do que nunca. Os Huks do passado foram substituídos por outro grupo, o Novo Exército Popular, tão ou mais aguerrido do que a facção comunista antecessora. Sem Marcos, pode até ser que as Filipinas conheçam o caos, conforme o presidente adverte. Mas, com ele, as coisas podem ser até piores. Esta, portanto, será uma escolha crucial para o eleitorado filipino, já acostumado a ser manobrado pelo atual mandatário, que age como vitalício. As perspectivas, portamnto, não são das melhores.


(Artigo publicado na editoria Internacional do Correio Popular, em 7 de fevereiro de 1986).

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