Distorção legislativa
Pedro J. Bondaczuk
A Medida Provisória, recurso
adotado na atual Constituição para assuntos de extrema relevância
e urgência, acabou sendo descaracterizada em seu espírito e passou
a ser um instrumento de legislação ordinária. Há, atualmente, 32
delas à espera de apreciação por parte da Câmara e do Senado, que
estão, literalmente, em recesso.
A maioria de seus membros está
em plena campanha, com vistas às eleições de 3 de outubro próximo.
Pouco ou nada lhes importa que não tenham cumprido e não estejam
cumprindo o seu dever. Buscam a reeleição com extrema "candura",
quando não com "cara de pau", confiantes na falta de
memória do eleitor. Podem ter uma desagradável surpresa. Tomara que
a tenham.
Como o País não pode parar
por causa da irresponsabilidade de seus legisladores, o Poder
Executivo não tem outra alternativa senão lançar mão da edição
de sucessivas Medidas Provisórias, ciente, com certeza, de que o uso
indiscriminado desse expediente é inconstitucional. Mas o que fazer?
Deixar a Nação ser tomada por uma autêntica paralisia, em virtude
do Legislativo estar deixando de exercer suas funções? E está!
A proposta que criou a nova
moeda, o Real, por exemplo, tão importante para a vida nacional, não
chegou sequer a ser apreciada. O Brasil está sem orçamento para
1994, apesar de já estarmos em meados de setembro, portanto a três
meses do final do ano.
Isto para não ressaltar que a
Constituição de 1988 vai completar o 6º aniversário no próximo
dia 5, sem estar regulamentada por leis ordinárias, na maioria dos
seus dispositivos. Pode haver maior inércia?
É disso que o eleitor
precisará se lembrar em 3 de outubro, na hora de votar em seu
candidato a deputado ou a senador. Embora a mídia não esteja dando
a devida importância e a opinião pública não se tenha dado conta
do fato, as eleições para o Legislativo são mais importantes do
que a escolha do novo presidente ou dos governadores de Estado. O
"calcanhar de Aquiles" da nossa democracia está exatamente
no Congresso.
Mas nada será corrigido, e as
coisas continuarão tão ruins como estão, ou até piores, caso seja
mantida a atual mentalidade. Caso os votos brancos e nulos sigam
sendo tão fartos quanto foram em 1990. Não será através da
omissão que as distorções políticas poderão ser corrigidas.
É preciso estar atento a tudo
o que aconteceu nos últimos quatro anos da vida nacional. Seria
inconcebível, por exemplo, reconduzir ao Congresso os "anões
do orçamento", os que, embora culpados, deixaram de ser punidos
pelo espírito corporativista dos seus pares.
Não se concebe, igualmente,
dar a procuração do voto aos gazeteiros, que receberam sem
trabalhar, deixando de comparecer às sessões. Estes praticaram um
ato de extrema corrupção. Receberam o indevido, já que foram pagos
sem trabalhar.
As Medidas Provisórias
poderão (e deverão) se tornar raras, como prevê a Constituição,
somente quando o País puder contar com um Legislativo ativo. Quando
deputados e senadores entenderem que, ao serem eleitos, receberam uma
responsabilidade, uma tarefa, uma missão e não um prêmio. Até que
isso ocorra, não há como criticar o presidente por se valer desse
recurso para poder governar.
(Artigo publicado na página
2, Opinião, do Correio Popular, em 13 de setembro de 1994).
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