Tuesday, September 12, 2017

Crime premeditado cujas causas permanecem nebulosas

Pedro J. Bondaczuk

O brutal e despropositado assassinato do primeiro-ministro da Suécia, Olof Palme, ocorrido sexta-feira passada, durante a madrugada, em uma rua de Estocolmo. Deixou (como seria de se esperar) a todos chocados. E não apenas a opinião pública sueca, país onde a sua perspicácia política e sua convicção ideológica eram legendárias. Todos os que conheciam e admiravam essa personalidade lamentaram o fato. Todo assassinato, é verdade e é óbvio, choca aos que tomam conhecimento desse crime. Mas este específico tem ingrediente especial que amplia a revolta contra o autor desse ato de extrema violência, por vitimar um homem cuja atuação pública se caracterizou pela defesa dos oprimidos, dos discriminados e dos explorados, da Suécia e de fora dela. Olof Palme pautou sua brilhante carreira política em três princípios básicos: Pregou, por exemplo, incansavelmente, o fim da imoral exploração dos países pobres, feita pelos ricos. Combateu, com bastante vigor, os vários tipos de discriminação, notadamente a racial. E lutou, finalmente, pela utopia de um mundo desarmado, não somente no que se refere a armas (convencionais e nucleares), mas, sobretudo, pelo desarmamento do espírito dos povos.

Como se vê, o primeiro-ministro assassinato era um pacifista convicto e coerente. Diferente desses que fazem enorme barulho, quando se trata de apontar erros alheios (mas que por baixo do pano praticam o que publicamente condenam). Suas ações eram coerentes com o que pregava. Em suma, era um ser humano raro, desses que não abundam por aí. Tolerante, sem ser omisso, aferrado a princípios humanistas, sem descambar para o fanatismo, e pragmático, sem se valer da força e da riqueza de seu país para impor suas ideias, Olof Palme fará muita falta.

Foram essas raras qualidades citadas que o tornaram querido e respeitado pela população sueca, que comandou por onze anos, à frente de cinco gabinetes, embora em períodos alternados. Foram elas, também, que fizeram com que gozasse do prestígio e da admiração internacionais, mesmo dos adversários que o combatiam ferrenhamente. É tudo isso o que irá fazer com que o primeiro-ministro sueco continue lembrado sempre que as questões do desarmamento e do respeito aos direitos humanos forem levantadas.

Apesar de vários grupos terroristas europeus reivindicarem a autoria dessa despropositada barbaridade (como se ela fosse um galardão a se ostentar), esse nebuloso e lamentável caso ainda permanece nebuloso. O que se sabe (ou, pelo menos, o que se deduz) é que o criminoso conhecia muito bem os hábitos de Olof Palme. Sabia, por exemplo, que detestava andar pelas ruas da cidade em que nasceu protegido por guarda-costas. Preferia caminhar sempre sozinho. Deve, por conseguinte, ter ficado à espreita por vários dias, como se fora venenosa cascavel à espera de dar o boter fatal.

No momento que julgou oportuno, o assassino executou seu nefato ato com uma frieza e precisão raras. Demonstrou um “profissionalismo” característico dos mais letais matadores de aluguel. O assassinato, por suas características, só pode ter sido perpetrado por encomenda e dificilmente foi encomendado por algum sueco. Quem deve estar por trás desse crime talvez seja algum dos tantos paranoicos de que o mundo está repleto.

Olof Palme foi abatido de uma forma, e em um momento em que não podia se defender. Foi uma ação fulminante, como se atacado por algum animal predador ou como a descarga elétrica letal de um raio. O assassino foi súbito, frio, implacável, sem dar a menor chance de reação à vítima. Chega-se a essa conclusão pela análise dos projéteis (foram dois) disparados contra Palme. Foram projéteis raros, de calibre 38, de um tipo especial, uma espécie de “dum dum”, que se fragmentam ao atingirem o alvo, dilacerando artérias, veias, nervos, músculos e até ossos.

O difícil de se entender é o motivo de tamanha ira do matador e de quem possivelmente encomendou o crime contra um homem que sempre pregou a paz. Deve ser porque no dicionário dessas feras humanas tal conceito soa como se fora um palavrão. Como esperar alguma coisa de bom em um mundo em que homens do tipo de Olof Palme são ceifados do convívio humano por pessoas intoxicadas pela violência?!

(Artigo publicado na editoria Internacional do Correio Popular, em 4 de março de 1986).



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