Prudência não faz mal a ninguém
Pedro J. Bondaczuk
O tema
atinente à duração do mandato do presidente José Sarney continua
pontilhando nas manchetes nacionais, após ter vindo à baila
extemporaneamente na Assembléia Nacional Constituinte praticamente
no dia seguinte à sua instalação, quando nem sequer seu regimento
interno (posteriormente modificado pelo chamado Centrão) estava
pronto.
Uns
entendem que o vice de Tancredo deve governar os seis anos previstos
pela Constituição que ainda está em vigor e da qual a nova, em
elaboração, será originária. Outros concordam com os cinco,
propostos pelo próprio interessado, que abriu mão de um ano a que
constitucionalmente tinha direito. E uma terceira corrente, cujo
pensamento prevaleceu na Comissão de Sistematização, pretende que
as eleições presidenciais sejam convocadas ainda neste 1988.
Qual
tese seria a mais correta? Embora haja uma grande ânsia nacional
pela escolha, através das urnas, do novo presidente, fato que não
ocorre desde outubro de 1960, falar em sucessão agora é uma
infantilidade. Pior do que isso, uma irresponsabilidade. Não por
causa de alguma eventual simpatia pelo presidente José Sarney ou que
sua gestão venha sendo brilhante. O motivo é puramente prático.
Raciocinemos.
Assim
que a nova Carta Magna for promulgada (e pelo que se comenta, isso é
mais provável que ocorra em 21 de abril próximo), toda a legislação
ordinária que entre em conflito com ela estará automaticamente
revogada. Muitas dessas leis que vão “morrer” dizem respeito ao
dia a dia de cada brasileiro. Ao meu, ao seu caro leitor e ao de
muitos milhões dee outras pessoas.
Uma
campanha presidencial vai esvaziar o Legislativo e justo no momento
em que o País vai precisar mais dele. Sabe-se lá quanta confusão
isso pode gerar! Será um caos! Processos em andamento podem ser
suspensos, negócios acabarão sendo paralisados e a gritaria dos
atingidos certamente não será menos barulhenta do que a que está
sendo feita agora pelos que exigem eleições imediatas.
Outro
aspecto a considerar refere-se ao Direito Constitucional. A nova
Constituição que está nascendo, doutrinariamente, é denominada de
“originária”. Ou seja, ela não é fruto de uma ruptura
institucional. Tanto é que a convocação da Assembléia
Constituinte que vem elaborando essa “certidão jurídica”
nacional foi feita mediante uma emenda a ela.
Por
essa razão, a redução do mandato do atual presidente, que foi
estabelecido pela Carta anterior, é um casuísmo que contraria as
normas que vigoram em todo e qualquer país. Os cinco anos de governo
para o presidente José Sarney são válidos apenas porque ele, o
titular legítimo desse período governamental, abriu mão de um.
Somente ele tem o poder de fazer isso. Uma diminuição maior só se
justificaria se fossem convocadas eleições em 1988 para todos os
cargos eletivos. Ou se o presidente renunciasse.
O
que se deve, portanto, é ter paciência e sobretudo prudência.
Afinal, não estamos jogando com o nosso passado, ao tomarmos uma
decisão precipitada no presente. Poderemos estar comprometendo o
nosso futuro. O que deve ocorrer, isto sim, é uma conscientização
do Congresso para a adequação da legislação ordinária à nova
Constituição da maneira mais rápida, eficiente e inteligente
possível.
Que
os ambiciosos refreiem seus anseios pelo poder e pensem em algo muito
maior: na tranqüilidade e na segurança de todos nós. Afinal, como
diz o velho e surrado clichê, mas sempre oportuno: “prudência e
caldo de galinha não fazem mal a ninguém”.
(Artigo
publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 15 de
janeiro de 1988).
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
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