Thursday, September 28, 2017

Nação e Estado


Pedro J. Bondaczuk


A Nação assiste, entristecida, à crise institucional que se desenrola na "ilha da fantasia" de Brasília, que não é sua, mas do Estado, que a deveria representar e organizar. A tristeza não se prende à controvérsia em si, já que estas são fatos normais num sistema que se pretende democrático.

O que entristece é o motivo do jogo de braço entre o Executivo, o Legislativo e o Judiciário: salários. Bem, diria o leitor, a questão salarial não é relevante? É, e muito! Mas o que esses ilustres senhores estão tratando não é da "nossa" remuneração, mas da "deles".

A Nação, todavia, bem ou mal, continua acreditando --- embora já não muito --- em saudáveis e urgentes mudanças. Trabalha, produz, gera impostos, sofre, ri, diverte-se, enfim, vive. À revelia de um Estado hiperdimensionado e ineficiente. Manifestação de pujança e de amor ao Brasil foi dada, por exemplo, no Estádio do Arruda, no Recife, antes do jogo entre a seleção brasileira e a da Argentina, quando cerca de 90 mil torcedores cantaram o Hino Nacional.

De forma desafinada, é verdade. Tropeçando na letra, como foi fácil de notar. Mas foi um ato simples, que demonstrou que a população, apesar do desgoverno e dos descalabros, a despeito dos oportunismos e das omissões, mesmo sofrida, desencantada e decepcionada, embora aparentemente pessimista e excessivamente crítica, no íntimo, confia em seu país.

A crise do Brasil real é originária do seu antípoda, o da Fantasia. É provocada pelos que perderam de vista o sentido da função pública, do dever, do compromisso assumido nos palanques. É gerada por homens que não possuem visão histórica, que são imediatistas, de olho em interesses pessoais, sem atentar que eles seriam melhor defendidos quando integrados aos de todos os brasileiros.

De que me vale ser rico num país pobre? O Brasil real não é o deles. É o de Herbert de Souza, o Betinho. É o dos milhares de médicos, professores, engenheiros, técnicos e operários braçais que, mesmo mal remunerados, desassistidos e anônimos, movimentam a Nação.

Por que a população ainda insistem em confiar? Porque sabe que as pessoas passam, mas os ideais permanecem. Essa geração de homens públicos insensatos, embora não se dê conta disso e se julgue invulnerável, inatingível, inalcançável, vai passar. Mas o Brasil real, sofrido, judiado e com milhões de excluídos, este irá permanecer.

(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 26 de março de 1994).



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