Tuesday, September 26, 2017

Municípios são centros vitais do País


Pedro J. Bondaczuk


A vida de uma nação transcorre, basicamente, em âmbito municipal. É nos municípios que as pessoas moram. É aí que nascem, se educam, trabalham, se casam, se reproduzem, disputam posições, se realizam enquanto seres sociais e morrem.

Estados e países nada mais são do que organismos compostos por essas células básicas, fundamentais, onde ocorrem seus processos vitais. As crianças abandonadas, por exemplo, não perambulam nos campos ou em hipotéticos espaços vazios, mas em ruas de concentrações urbanas. Os idosos são desamparados ou não em suas próprias comunidades, por sua própria gente.

Problemas como falta de moradias, habitações insalubres, ausência de saneamento básico, educação, saúde, segurança pública, etc., são gerados em seu âmbito e as soluções devem partir dali. A primeira manifestação de vida civilizada do homem, quando este deixou de ser nômade e descobriu como cultivar a terra para dela extrair seu alimento, foi a constituição de cidades, aglutinando vários clãs, de tamanhos, composições e aptidões diferentes, agindo em comum. É claro que esses grupos tiveram que aprender a difícil arte da convivência, cedendo parcelas de seus direitos em favor da coletividade.

A palavra "política" nada mais é do que o relacionamento entre as pessoas nas "pólis". Todos exercitamos essa atividade, diariamente, desde que deixamos nossas casas para trabalhar até o regresso ao lar. Cidadania, por sua vez, é um conjunto de direitos e deveres que vincula os indivíduos dentro de suas respectivas comunidades. Ou seja, das "cidades".

A Constituição de 1988, como as demais que o País já teve, parte do geral --- o Estado --- para o particular --- o município --- quando a proposição deveria ser inversa. Todavia, apresenta inegáveis avanços em relação ao municipalismo.

Ainda assim, há distorções que não podem deixar de ser citadas. Qualquer estratégia de amparo social, para ser viável, deve ser planejada e executada no âmbito municipal. A Carta Magna em vigor previu transferências de recursos para municípios, mas não transferiu as respectivas responsabilidades financiadas por essas verbas. Ou pelo menos não definiu competências em áreas sensíveis, como segurança pública, saúde, educação, etc.

As três instâncias --- federal, estadual e municipal --- atuam nesses setores, mas não de forma complementar, como seria desejável. Agem de maneira concorrente, quando não antagônica.

Recursos escassos findam por ser malbaratados em projetos muitas vezes redundantes, quando não desnecessários. Carece-se de racionalidade. Falta uma demarcação rigorosa de competências. Peca-se pela ausência, na definição de prioridades, da principal parte interessada: os cidadãos.

Estranhamente, isso acontece também nos municípios, onde os contribuintes, os que sustentam e viabilizam a máquina administrativa, nunca são ouvidos quanto à elaboração dos orçamentos, dos programas de governo, das metas estabelecidas por suas comunidades.

Reclama-se a todo instante da verba para educação, por exemplo, culpando essa falta de dinheiro pelas distorções no ensino público. A Constituição de 1988, no entanto, determinou que 25% da arrecadação de cada Estado e de cada município e 18% da receita federal sejam aplicadas obrigatoriamente nesse setor.

A quem compete, porém, aplicar esses recursos? Às três instâncias, concomitantemente. Caso a educação fosse de competência exclusiva dos municípios, essa verba cobriria, com sobras, as necessidades. Seria dispensável, por exemplo, a existência das enormes estruturas burocráticas do Ministério e das Secretarias Estaduais da Educação, com milhares de funcionários consumindo, em salários, a quase totalidade dos recursos.

O mesmo raciocínio vale para outras áreas. O estado da saúde pública no País, atualmente, é de calamidade. O caos social está instalado, redundando na marginalização de milhões de brasileiros. A criminalidade avança. Tudo isso poderia ser evitado com a redução do tamanho do Estado e a conseqüente priorização do município.

(Artigo publicado na página 9, do suplemento especial "Revisão Constitucional", do Correio Popular, em 23 de março de 1994).


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