Thursday, May 14, 2015

Vida cercada de mistérios


 Pedro J. Bondaczuk


As circunstâncias da morte do ex-número dois do regime nazista, sucessor virtual de Adolf Hitler durante a Segunda Guerra Mundial, Rudolf Hess, ocorrida há uma semana, vêm despertando dúvidas e controvérsias, como, ademais, sempre aconteceu com tudo o que se referisse a essa figura um tanto quanto misteriosa.

Tendo nascido no Egito, esse político alemão foi criado na Alemanha, aderiu ao Partido Nazista e galgou os mais altos postos da organização, abaixo, somente, do próprio fuherer. Todavia, no segundo ano do conflito, na Europa, repentinamente, apareceu na Escócia, numa época em que a chamada “blitzkrieg” germânica estava em pleno apogeu (parecendo que iria levar de roldão a Europa inteira), com uma história, no mínimo, inverossímil.

Hess alegou que estava em território britânico com o objetivo de fazer uma tentadora proposta aos aliados: a da rendição alemã, caso a Grã-Bretanha o ajudasse a depor Adolf Hitler e se tornar o líder do país. As dúvidas a respeito dessa estranha figura não se restringem, como se vê, apenas à sua morte que, convenhamos, não deixa de apresentar aspectos muito estranhos. Diria: estranhíssimos.  

Não se entende, por exemplo, como um ancião de 93 anos poderia ter se enforcado, usando, apenas, as próprias mãos e um fio elétrico e sem a ajuda de ninguém. Isto, sem pendurar-se em nenhum travessão. Outro ponto obscuro é o fato do guarda, encarregado da sua estrita vigilância, dia e noite, em todos os momentos e circunstâncias, ter se descuidado do seu papel, o que nunca antes havia acontecido.

Mais suspeita, ainda, foi a presença de elementos estranhos à prisão de segurança máxima de Spandau, de operários, que estariam trabalhando em uma reforma. Por que reformar o presídio, se as autoridades das quatro potências aliadas na Segunda Guerra Mundial haviam decidido demoli-la, tão logo seu único prisioneiro, exatamente Rudolf Hess, morresse?

Dúvidas há, também, por exemplo, sobre a verdadeira identidade do preso. Seria, ele, o verdadeiro Rudolf Hess, ou alguém que se passava por ele? O escritor britânico, e médico até certo ponto conceituado, Hugh Thomas, vem afirmando, para quem queira ouvir, desde 1973, quando visitou esse complexo carcerário de Berlim Ocidental, que se tratava de um impostor. Não somente disse isso, em inúmeras entrevistas que deu, como até escreveu um livro a respeito. De onde lhe vinha tamanha convicção? É caso para se pensar.

Para complicar ainda mais esse estranho caso, as autoridades da cidadezinha alemã de Wunsiedel informaram que o prisioneiro de Spandau (fosse ele quem fosse) foi sepultado, secretamente, no último fim de semana, num local ignorado, sob a alegação de que isso fora feito para espantar fanáticos neonazistas (ainda há malucos que não aprenderam nada com a história, intoxicados por ideologias exóticas, que não entendem e não conseguem digerir5, mas às quais teimam em aderir).

Criou-se, por conseguinte, mais um mistério em torno de um dos períodos mais deprimentes e de triste memória para a humanidade da história contemporânea. É uma nova lenda, como a que cercou a possível (não sei se provável) fuga de Hitler para o Paraguai, as circunstâncias que permitiram que Eichmann, Stangl, Mengele e outros notórios criminosos de guerra escapassem do Tribunal de Nuremberg (e alguns, inclusive, morressem de velhice) e tantas histórias mais, que o povo conta, à boca pequena.     

(Artigo publicado na página 14, Internacional, do Correio Popular, em 25 de agosto de 1987).


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