Hiperinflação vence o teimoso Alfonsin
Pedro J. Bondaczuk
O presidente argentino, Raul
Alfonsin, que superou três tentativas de golpe de Estado, sem que para isso
precisasse lançar mão de expedientes violentos e nem perseguir os que o
tentaram depor; que esteve às voltas com ataques terroristas; que teve a
coragem de levar às barras dos tribunais aqueles que cometeram um dos maiores
genocídios que já se registraram na América do Sul, que foram os
“desaparecimentos” de cerca de 9 mil pessoas durante o regime militar; depois
de lutar contra crises políticas de toda a espécie e vencer, uma a uma, com
sabedoria e ponderação, finalmente teve que se dar por vencido. Na
segunda-feira passada, visivelmente abatido, anunciou ao país que iria
renunciar ao seu cargo no dia 30 próximo.
O motivo? A maior crise econômica
já vivida por seu país, outrora um celeiro alimentar do mundo, às voltas agora
com um perverso e incontrolável processo inflacionário. Mas seria mesmo algo
fora de controle essa espiral das taxas de inflação, conforme se apregoa,
amiúde, no Terceiro Mundo?
Esse fenômeno seria, por acaso,
como uma força doida e ingovernável, que os governos lutariam tenazmente para
conter, em geral sem muito sucesso? Esta, pelo menos, é a imagem que
governantes populistas tentam passar do problema.
Na verdade, porém, suas raízes
são perfeitamente detectáveis e o mal tem solução. É verdade que esta costuma
ser dolorosa. Em geral, são os remédios amargos aqueles que curam as doenças
mais perniciosas e não os saborosos. O segredo todo reside numa palavrinha:
austeridade.
A inflação, na verdade, poderia
ser definida como sendo “desperdício”. Sempre que alguém gasta muito mais do
que ganha, para honrar seus compromissos, precisará se endividar
crescentemente. O mesmo vale para os governos. Estes têm, no entanto, um
recurso que não está ao alcance do cidadão comum. Dispõem da prerrogativa de
emitir papel-moeda, posto que sem o correspondente lastro na produção. Ou seja,
“infla” o dinheiro, enche-o de vento, daí o termo “inflação”.
Ela, portanto, vem a ser uma
espécie de imposto que o Estado cobra de toda a população, sem a necessidade de
qualquer lei específica para tal tributação extra. Tudo o mais que se diga a
esse respeito não passa de retórica de políticos populistas.
Tabelamentos, congelamentos e
outras providências do gênero apenas prolongam a doença. O remédio é a
austeridade. A mesma que nenhum governo latino-americano, à exceção da Bolívia,
vem adotando. Daí todos eles estarem terminando melancolicamente, um a um, suas
gestões, como acontece com Raul Alfonsin.
(Artigo
publicado na página 14, Internacional, do Correio Popular, em 15 de junho de
1989).
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
No comments:
Post a Comment