Conheça de perto o
Eurotúnel
Pedro
J. Bondaczuk
O Eurotúnel, ligando a
Inglaterra à França, por via ferroviária, passando sob as águas agitadas e
tempestuosas do Canal da Mancha, é, sem dúvida, um dos maiores feitos de
engenharia não apenas do século XX, mas de todos os tempos. Surpreendem tanto o
arrojo, quanto as técnicas adotadas na sua construção. Não menos surpreendente,
também, é o enorme investimento em dinheiro para que um projeto, ou, como
queiram, um sonho que durou tanto para ser concretizado (e que foi considerado
pelos céticos como irrealizável) se tornasse realidade. Contudo, para mim, a
maior surpresa não é nada disso. É o fato de uma obra desse porte não haver se
tornado, “ainda” um ícone cultural, poderosa e irresistível atração turística
que atraia milhões de curiosos. Creio que mais cedo ou mais tarde se tornará.
Confesso que, se
tivesse recursos para tal, não titubearia: não deixaria de viver a experiência
de ir da Inglaterra à França (ou vice-versa) em um trem utilizando o Eurotúnel.
Obras tidas e havidas como maravilhas do mundo moderno, como a Ponte Golden
Gate, em São Francisco, na Califórnia; a Torre Eiffel, de Paris; o Empire State
Building, de Nova York e o Cristo Redentor, do Rio de Janeiro, apenas para
citar algumas, atraem turistas de todas as partes do mundo há muito tempo. Além
do que, são eleitas como cenários preferenciais de filmes, de enredos de
romances, de contos e de novelas e de outras tantas obras de arte. São,
portanto, ícones culturais nunca esquecidos.
Qual a razão de não
ocorrer o mesmo com o Eurotúnel? Pelo que eu saiba, apenas um único e solitário
filme utilizou essa mega-obra de engenharia como cenário. E, assim mesmo, não
foi “ao vivo”. Ela não foi “locada” para as filmagens. Utilizou-se, em vez
disso, um truque de computador (com gritantes falhas), para sua produção.
Refiro-me ao filme “Missão impossível” (baseado em série homônima de televisão,
de muito sucesso), dirigido por Brian de Palma. Confesso que não percebi que o
Eurotúnel da famosa película é apenas fruto de efeito especial. Fiquei sabendo
disso na enciclopédia eletrônica Wikipédia.
Mas por que não foi
utilizada a obra verdadeira se ela está lá e é bastante acessível? Afinal, o
filme foi rodado em 1996, dois anos após a inauguração dessa miraculosa ligação
submarina da Inglaterra à França, que ocorreu, com pompa e circunstância (com
as presenças, óbvio, do presidente francês da época, François Mitterrand, e da
rainha inglesa Elizabeth II) em 4 de maio de 1994. Não faltou, pois, tempo para
isso. Foi medida de economia? Se foi, foi desastrosa!
A cena em que o “fake”
do Eurotúnel aparece é justamente no clímax de “Missão impossível”, como a
Wikipédia destaca. É a em que o protagonista do filme, vivido pelo ator Tom
Cruise, acima de um vagão de um trem de alta velocidade, é caçado por um
helicóptero. E é quando as “mancadas” acontecem. O primeiro erro é a
impossibilidade de vôo de uma aeronave, não importa qual, no interior do túnel
submarino. Mas essa falha ainda passa, pois em cinema tudo (ou quase tudo) é
possível. Mas há, de acordo com a Wikipédia, duas bobagens ainda maiores. A
primeira é a utilização do trem de alta velocidade, do TGV (Train à Grand
Vitesse, em francês). Esse não é o sistema operado no Eurotúnel. O veículo que
opera ali, levando passageiros de Folkestone, no Reino Unido, a Coquelles, em
Pas-de-Calais, perto de Calais, no Norte da França, é o Eurostar. Também é de
alta velocidade, mas não é TGV.
O segundo erro de
continuidade é o que mostra um único túnel retangular, com duas linhas de trem.
O Eurotúnel, todavia, utiliza dois!!! E ambos são fisicamente separados, sendo
um para quem se dirige à França e o outro para quem vai para a Inglaterra. Daí
ser lógico e lícito se concluir que quem fez o truque de computador jamais
esteve nessa obra espetacular. Não conhecia nada, absolutamente nada do
Eurotúnel. Custava fazer a travessia, nem que fosse por simples curiosidade? Se
o fizesse, não cometeria os erros que cometeu, mesmo recorrendo a truque de
computador. Claro que isso não invalida o filme de Brian de Palma, que rendeu,
até, excelente bilheteria. Mas ele poderia ser ainda melhor caso se atentasse
para detalhes tão simples, facilmente perceptíveis para quem já fez essa
travessia por baixo do Canal da Mancha.
O Eurotúnel tem, além
do Eurostar, para transporte de passageiros, mais dois sistemas. O primeiro é o
“Eurotunnel Shuttle”, o maior veículo de transporte de cargas do tipo roll
on/roll of do mundo. O segundo é um serviço de trens de transporte ferroviário
internacional convencional. Portanto, escritor amigo (ou mero “aspirante” a sê-lo),
se você estiver pensando em fazer, um dia, dessa obra monumental cenário para o
enredo de alguma de suas histórias que esteja projetando, ou mesmo já
escrevendo, tenha, pelo menos, a cautela de conhecê-la pessoalmente. Dê um
jeito de arranjar uma graninha e faça um “tour”, de preferência de ida e volta,
pelo Eurotúnel. Asseguro que, sob todo e qualquer aspecto, não irá se
arrepender. Fica, aí, minha sugestão.
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
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