Fruto do acaso e de
teimosia
Pedro
J. Bondaczuk
O rock and roll já
existia bem antes de 21 de março de 1955 – data adotada pelos historiadores
como a do “nascimento” desse ritmo consagrado e de tanto sucesso, por causa da
estréia do filme “Blackboard Jungle”, em que a composição “Rock Around the
Clock”, de Bill Halley, aparecia como trilha sonora – embora não fosse
conhecido por essa designação. Um ou outro músico (ou apresentador de rádio)
usava, informalmente, esse nome ao se referir a esse tipo de música, que
lembrava o som de pedras rolando ladeira abaixo, mas não havia consenso. O rock
não era identificado, ainda, nem mesmo como novo ritmo. Uns tratavam-no como
variação do “country”, outros, como um tipo de blues e outros, ainda, como
tantas vertentes musicais, algumas que nem tinham e nunca tiveram nada a ver
com ele.
É curioso como “Rock
Around the Clock” acabou se tornando trilha sonora de “Blackboard Jungle”. Foi
puramente por acaso. Sua inclusão não estava, originalmente, nos planos dos
responsáveis por essa produção cinematográfica. Quem fez essa revelação foi o
único ator latino-americano desse filme, o dominicano Rafael Campos, em
entrevista telefônica que concedeu à agência de notícias UPI, do quarto do
hospital Woodland Hills, na Califórnia, onde se recuperava de uma cirurgia para
a remoção de um câncer no estômago. Ele foi entrevistado, na oportunidade, em
1985, quando a estréia de “Blackboard Jungle” completava trinta anos.
“Nós, quando filmamos,
em 1954, não conhecíamos o disco de Bill Halley. Foi depois que acabamos de
filmar que ocorreu ao diretor incluir o ‘Rock Around the Clock’ na trilha”,
revelou Campos. E explicou como isso aconteceu: “Mr. Brooks dirigia, um dia,
seu carro, quando ouviu no rádio essa composição. Ficou entusiasmado. Telefonou
de imediato para a emissora para informar-se do que se tratava, sobre quem era
o compositor, quais eram os cantores que o acompanhavam e coisas assim. Depois,
adquiriu os direitos da composição e incluiu-a no filme. Deu no que deu”. Mas
quem foi esse William John Clifton Halley, ou somente Bill Halley como ficou
conhecido, de quem tanto falo e que subitamente foi alçado à fama e entrou para
a história da música popular mundial? Bem, foi um músico (tocavas guitarra e
baixo), cantor e compositor, nascido na cidade de Highland Park, Estado de
Michigan, em 6 de julho de 1925, mas criado na Pensilvânia.
Criou seu primeiro
grupo profissional em 1946. Era uma banda especializada em “country” (a “moda
caipira” norte-americana, pode-se assim dizer), chamada Down Homers. Essa não
fez muito sucesso e logo foi dissolvida. Bill Halley decidiu, então, seguir
carreira solo. Gravou diversos discos “country” sem que nenhum chamasse em
especial a atenção do meio musical. Enquanto isso, ganhava a vida como músico itinerante,
atuando em shows, boates e em rodeios país afora. Em 1951, formou nova banda,
“The Saddlemen” e o grupo decidiu criar repertório diferente do que tinha até
então, com novos ritmos, mais exóticos, mais frenéticos, mais agitados. Gravou,
então, versões de “Rocket 88” e “Rock this joint” de Jackie Brenston e Delta
Cats.
A decisão foi das mais
acertadas. A gravação vendeu relativamente bem, dando impulso à carreira de
Halley e de sua nova banda. Seu primeiro grande sucesso, porém, foi a
composição “Crazy man crazy”, gravada em 1952, o primeiro rock (alguns já
chamavam o ritmo dessa forma) a entrar na parada de sucessos em âmbito
nacional. Nesse mesmo ano, a banda “The Saddlemen” trocou de nome, adotando o
atual, “The Comets”. Não estranhem. É atual mesmo. Apesar da morte de Bill
Halley, em 9 de fevereiro de 1981, aos 55 anos, em Harlington, no Texas, o
grupo existe até hoje e continua se apresentando ao redor do mundo. Seus
integrantes estão na faixa etária dos 72 aos 85 anos, mas os “The Comets” parecem
incansáveis, apresentando-se com o mesmo entusiasmo e vigor da juventude, em
shows e mais shows, nas sucessivas turnês que realizam.
“Rock Around the
Clock”, considerada a “certidão de nascimento” do rock, foi composta em 1953. O
curioso é que a gravadora, inicialmente, recusou-se a gravá-la, sob pretexto de
que não era “comercial”. Seu compositor, todavia, insistiu, insistiu e insistiu
até que teve êxito. A composição foi gravada, mas apenas em 12 de abril de
1954. A princípio, não emplacou, dando razão à gravadora que não via nenhum
futuro nela. Halley, contudo, não desistiu. E nem precisava dessa canção – ele
já fazia estrondoso sucesso com outra composição sua, “Shake, Rattle and Roll”.
Promoveu-a, todavia, junto aos programadores das emissoras de rádio, incluiu-a
em todos os shows que fazia e... finalmente, deu no que deu. “Rock Around the
Clock” tornou-se o hit dos hits dos roqueiros, integrou a trilha sonora do
filme “Blackboard Jungle” e lançou, de vez, para a posteridade, o novo e
exótico ritmo. Seu teimoso compositor é reverenciado graças, sobretudo, a essa
composição, até hoje, por bilhões (e não é exagero meu, é por bilhões mesmo) de
fãs nos Estados Unidos, Europa, Américas, Ásia e ao redor do Planeta. Além
disso, integra o “Hall da Fama do Rock and Roll” desde 1987, seis anos após sua
morte. Valeu ou não valeu a pena tanta insistência (ou teimosia)?
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
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