O homem e a bola
Pedro J. Bondaczuk
O
sucesso da seleção brasileira, na Copa do Mundo dos Estados Unidos, embora um
feito meramente esportivo, que não pode ser usado por nenhum político para
obter qualquer espécie de vantagem, encerra lições preciosas que todos podemos
e devemos aprender.
Em
primeiro lugar, significa uma ducha gelada na excitação dos eternos
derrotistas, que juram por todas as juras que o povo que habita este imenso
país de dimensões continentais é incompetente em tudo, ou quase tudo. Ao
contrário. O Brasil pode carecer, na verdade, de líderes conscientes ou bem
intencionados.
Todavia,
mesmo andando, às vezes, às cegas, em círculos, seguindo a mera intuição, o
brasileiro é versátil, é criativo, é resistente e, portanto, um vencedor.
Outra
lição a ser extraída é a de que, apesar de ser necessário que não nos alienemos
da realidade, sempre há um espaço para o sonho, para a fantasia, para a
concretização de esperanças, mesmo as que pareçam impossíveis. Isto vale tanto
para o esporte, quanto para a vida.
Poucas
pessoas punham fé na atual seleção nas Eliminatórias do ano passado. Menos
ainda quando do seu embarque para os Estados Unidos. Alguns, porém, ousaram
sonhar. E, mesmo que por alguns desses acidentes de percurso --- comuns e
normais num esporte como o futebol --- o tetra escape das mãos brasileiras, o
resultado obtido já foi muito superior àquele esperado pela maioria.
O
escritor realista italiano Verga afirmou que "copiar a realidade pode ser
uma boa coisa, mas inventar a realidade é melhor, muito melhor". E esta apenas se "inventa" com
ação, com esforço, com determinação e com fé.
A
seleção brasileira, convenhamos, apresentou uma infinidade de defeitos. Esteve
longe, muito distante, da perfeição e de jogar aquele futebol mágico, alegre,
versátil, como se fora um balé, de outras jornadas. Mas alcançou o objetivo que
seus integrantes traçaram.
O
imortal Nelson Rodrigues, numa de suas crônicas, expressou, em 1970, o que
gostaríamos de ter expressado naquela ocasião e nesta atual, ao escrever:
"Há um ser humano por trás da bola e digo mais: a bola é um reles, um
ínfimo, um ridículo detalhe. O que procuramos no futebol é o drama, é a
tragédia, é o horror, é a compaixão". E, convenhamos, não é também o que
encontramos na vida?
Se
podemos nos organizar e atingir a excelência em esportes coletivos como o
futebol, o vôlei e o basquete, o que nos impede de agir da mesma forma, com
idêntico espírito de união, para criarmos uma sociedade bem diferente da atual,
que hoje é a mais injusta do mundo em termos de concentração de renda?
(Artigo
publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 17 de julho de 1994).
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