Sunday, May 24, 2015

Mero show na mídia



Pedro J. Bondaczuk


A conferência de cúpula das sete nações mais industrializadas do mundo capitalista, que se realiza em Veneza, a exemplo da maioria de encontros semelhantes do passado, não gerou nada de dramático (e nem de importante) para o noticiário.

No plano econômico, tanto a queda do dólar e o déficit norte-americano, quanto o protecionismo japonês e lentidão de crescimento da economia da Alemanha Ocidental, não sofrerão nenhuma mudança radical.

Esses assuntos foram mencionados, os países referidos expuseram as providências que já tomaram e se decidiu aguardar o próximo ano para se saber se as medidas vão ou não surtir efeitos. Espera-se qualquer coisa diferente para hoje, quando a dívida externa do Terceiro Mundo deverá estar sob exame.

Mas que ninguém espere coisas espetaculosas também sobre esse tema. Afinal, este tipo de encontro, a rigor, nunca decidiu coisa alguma. Isto não ocorreu nem quando todos os seus participantes estavam no auge do prestígio. Por essa razão, o presidente francês, François Mitterrand, deseja que essa prática termine e que se descubra uma outra forma de consulta de alto nível, que não sejam essas dispendiosas reuniões, que somente servem para o deleite dos fotógrafos e dos cinegrafistas dos órgãos de comunicação.

Nos debates políticos, um único fato nos chamou a atenção. É que, provavelmente pela primeira vez, desde 1974, o comunicado final do encontro não foi uma brilhante peça retórica da guerra fria, como sempre se verificava, com ataques verbais intensos à União Soviética (que bem merecia isso, convenhamos).

Nesta oportunidade, pelo contrário, os líderes reconheceram que há uma mudança interna e externa na postura de Moscou. E, embora com muitas reservas (compreensíveis diante das tantas decepções já proporcionadas pelo Cremlin), eles manifestaram suas esperanças de um relacionamento mais maduro e construtivo entre o Leste e o Oeste, o que viria  trazer um parceiro a mais na busca de soluções para os magníficos desafios e problemas que a humanidade tem à sua frente.

O outro incidente de nota ocorreu a 547 quilômetros do mosteiro beneditino do século XVII, onde a reunião está sendo realizada (já bem esvaziada, com o regresso de Thatcher à Grã-Bretanha, para defender seu terceiro mandato, virtualmente garantido, e com sobras, a julgar pela última prévia, divulgada ontem). Teve como palco a capital italiana, mais especificamente o conhecido “triângulo da morte”, a zona central de Roma, que concentra embaixadas e escritórios de empresas aéreas, onde desde 1979 já aconteceram pelo menos oito atentados.

Foi ali que o terrorismo internacional desafiou os sete líderes (três dos quais bastante desgastados), atacando as embaixadas dos Estados Unidos e da Grã-Bretanha, burlando todo o magnífico esquema de segurança montado pelas autoridades da Itália.

O terror, embora não tenha feito vítimas nessa oportunidade, tornou a mostrar a sua hedionda face. Deu o seu recado, duro, cruel, preciso e perigoso. O de que os países mais visados por suas bombas jamais podem baixar sua guarda, ou se descuidar um único instante.

O leitor já imaginou se fossem verdadeiros os boatos da existência de um carro-bomba na Praça de São Pedro?! Ou se extremistas houvessem atacado os líderes das potências econômicas ocidentais em Veneza? Teríamos outro espetacular
”imbróglio” internacional, ao invés das sorridentes poses para fotografias e das amabilidades trocadas pelos membros desse seleto clube dos ricos.

Já que os dirigentes mundiais estão tendo um relativo sucesso no campo do desarmamento nuclear, que tal se atacassem, seriamente, a questão do terrorismo? Mas que procurassem as raízes do mal e não seus efeitos, como fizeram até aqui, especialmente nas três últimas décadas, quando os atos dessa espécie se intensificaram a ponto de transformar este tipo de protesto político, mediante o uso da irracional violência, no grande flagelo do século?

(Artigo publicado na página 10, Internacional, do Correio Popular, em 10 de junho de 1987).


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